Os probióticos vêm ganhando notoriedade devido aos seus efeitos benéficos. No entanto, ainda existem muitas dúvidas em relação aos tipos de bactérias, ações fisiológicas e aplicações clínicas. Em entrevista exclusiva ao Nutritotal, a nutricionista Danielle Fontes de Almeida, especialista em Terapia Nutricional e Nutrição Clínica pelo GANEP e aluna do programa de Mestrado em Ciências pelo Departamento de Oncologia da Faculdade de Medicina da USP esclarece os mitos e verdades sobre os probióticos.
01. As bactérias que trazem benefícios à saúde foram recentemente descobertas, sendo sua utilização recente.
Mito. Cerca de um século atrás, o microbiologista russo, Elie Metchnikoff sugeriu que os camponeses Búlgaros tivessem uma vida saudável mais longa pelo consumo de produtos do leite fermentado. Ele acreditava que o consumo de bacilos fermentadores (Lactobacillus) influenciava positivamente a microbiota do intestino, diminuindo a “putrefação” (decomposição da matéria orgânica causada por microrganismos) e a atividade de bactérias patogênicas. Metchnikoff demonstrou que bactérias não são necessariamente prejudiciais ao homem, podendo ter um papel importante no bem estar dos indivíduos. Ele foi o primeiro a recomendar a ingestão de microorganismos vivos benéficos como as bactérias láticas.
02. “Probióticos” podem também ser chamados de “Prebióticos”.
Mito. Em 1908 Füller definia probióticos como “um microrganismo vivo suplementado na dieta o qual beneficia o animal hospedeiro por melhorar o balanço microbiano intestinal”. Em 2002, esse conceito foi reafirmado em uma reunião de especialistas promovida pela Organização de Alimentos e Agricultura das Nações Unidas (FAO) e pela Organização Mundial da Saúde (OMS): organismos vivos que, quando ingeridos em concentrações adequadas, afetam beneficamente a saúde do hospedeiro.
Os prebióticos são ingredientes alimentares resistentes ao processo de digestão, que afeta beneficamente o hospedeiro pelo estímulo seletivo do crescimento e/ou atividades de um número limitado de bactérias que têm potencialidade de melhorar a saúde do hospedeiro. Alguns exemplos de Prebióticos podem ser as fibras insolúveis como a inulina, goma guar e frutooligossacarídeos (FOS).
03. Todas as bactérias que não causam doenças ao ser humano podem ser “Probióticos”.
Mito. Segundo a OMS em 2002, para ser considerado um probiótico, o microrganismo vivo deve apresentar as seguintes características: ser comprovadamente seguro, deve sobreviver no alimento durante todo o prazo de validade e estar na concentração adequada para exercer benefício à saúde, deve sobreviver à ação dos ácidos gástricos e sais biliares, chegar viável e ativo ao seu sítio de atuação no organismo e exercer benefício clinicamente comprovado.
04. As bactérias de nosso intestino (microbiota) têm importante função na saúde do indivíduo.
Verdade. Diversas funções positivas têm sido atribuídas à microbiota intestinal. Uma delas é a ação antibacteriana, onde as bactérias benéficas competem por sítios de adesão e/ou nutrientes com bactérias maléficas. Além disso, as bactérias benéficas são capazes de produzir bacteriocinas que inibem a multiplicação e adesão de patógenos.
Outra função de destaque é a ação metabólica e nutricional, que basicamente interfere na nutrição do colonócito. Os ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), produzidos pelas bactérias benéficas, é uma importante fonte de energia para os colonócitos, proporcionado um efeito trófico no epitélio intestinal, além de diminuir o pH da mucosa intestinal, que dificulta a colonização de bactérias patogênicas. Além disso, algumas bactérias benéficas podem ajudar na síntese de vitaminas K e do complexo B.
Atualmente, pesquisadores e estudiosos do assunto retratam a ação imunomoduladora promovida pelas bactérias probióticas. Essas bactérias atuam no desenvolvimento de uma tolerância imunológica estimulando o sistema imune na redução do número de alergias e processos inflamatórios.
05. Uma vez estabelecida a microbiota, ela permanece inalterada ao longo da vida.
Mito. O processo de colonização do trato gastrointestinal começa ao nascimento e, no decorrer da vida, a microbiota pode ser modificada por diversos fatores.
O recém nascido por parto normal apresenta a colonização inicial do trato gastrointestinal por bactérias da microbiota vaginal e intestinal da mãe. Por sua vez, crianças que nascem por cesárea terão suas mucosas colonizadas por bactérias do ambiente hospitalar.
Após o parto, o tipo de alimentação, como o aleitamento natural ou artificial, é importante na definição da microbiota intestinal do lactente.
O aleitamento natural proporciona microbiota intestinal constituída predominantemente (>80%) por bifidobactérias e lactobacilos (1). Nos lactentes que recebem aleitamento artificial, essas bactérias correspondem a 40 a 60% da microbiota, estando o restante representado por bactérias dos gêneros Clostridium, Sthaphylococcus e Bacteróides (2).
Após o desmame, a criança aumenta sua exposição a outros tipos de microorganismos resultando na colonização completa adulta por volta dos 18 a 24 meses de idade. Nesta fase existem centenas de espécies de microorganismos habitando a pele, vias aéreas superiores e trato digestório.
Aos dois anos de idade a crianças apresenta uma microbiota similar à de um adulto. Porém, fatores como: alimentação desequilibrada ou contaminada, idade, estresse e fadiga, medicamentos (principalmente antibióticos), infecções bacterianas, fumo e álcool podem modificar a composição da microbiota.
06. O consumo de probiótico não é recomendado por órgãos internacionais, sendo seu consumo de indicação restrita.
Mito. Em maio de 2008 a Organização Mundial de Gastroenterologia publicou as diretrizes sobre a utilização de Probióticos e Prebióticos. A organização define e recomenda a utilização de probióticos, apesar dos benefícios não serem totalmente elucidados. Alguns benefícios estão descritos nestas diretrizes, como: câncer de cólon; tratamento e prevenção de diarreia aguda e diarreia associada à antibioticoterapia; alergias; doenças intestinais (pouchite, colite ulcerativa, doença de Crohn, síndrome do intestino irritável, má absorção de lactose); prevenção de infecções sistêmicas, dentre outras.
07. Todos os iogurtes podem ser considerados probióticos, pois, contém bactérias oriundas da fermentação.
Mito. Iogurte é um produto elaborado com culturas de bactérias lácticas: Lactobacillus bulgaricus e Streptococcus thermophilus. Estas bactérias não sobrevivem às condições do trato gastrintestinal em concentrações compatíveis para exercerem efeitos probióticos in vivo. Assim, nem todos os iogurtes podem ser considerados probióticos. No entanto, o comum no mercado atual é incorporar ao produto lácteo bactérias benéficas, consideradas probióticos.
08. Probióticos de gêneros diferentes, por exemplo, Lactobacillus e Bifidobacterium, têm funções diferentes no organismo.
Verdade. Cada gênero de bactéria tem uma função específica no organismo. Podemos observar alguns exemplos na tabela a seguir:
09. Probióticos da mesma espécie exercem os mesmos benefícios.
Mito. Da mesma maneira que os gêneros diferentes exercem efeitos diferentes, o mesmo ocorre com bactérias da mesma espécie, porém, de cepas diferentes. O efeito de uma bactéria é específico para cada cepa (linhagem estabelecida a partir de uma subespécie), não podendo ser extrapolado, inclusive para outras cepas da mesma espécie. Na tabela abaixo, podemos observar o mesmo gênero e espécie da bactéria Lactobacillus casei, porém com cepas diferentes exercendo assim, efeitos diferentes.
10. Os probióticos agem no intestino, portanto, os benefícios observados estão relacionados apenas a este órgão.
Mito. Existem algumas espécies que exercem um papel local atuando na redução do tempo de trânsito intestinal, por exemplo. Mas existem espécies de bactérias que estimulam células imunocompetentes do nosso tecido linfóide associado ao intestino, conhecido como GALT (tecido linfóide associado ao intestino), gerando uma resposta imune sistêmica de defesa do organismo.