Estudo publicado na revista The Lancet coloca em questão a controvérsia da complementariedade da nutrição enteral com nutrição parenteral. Os pesquisadores concluíram que a complementação energética com a terapia nutricional parenteral (TNP) dentro de quatro dias após a admissão na unidade de terapia intensiva (UTI) pode reduzir infecções hospitalares.
O objetivo do estudo foi testar a hipótese de que o início precoce de nutrição parenteral, após o terceiro dia de internação em UTI, pode melhorar o resultado clínico de pacientes graves, quando a nutrição enteral é insuficiente para fornecer 100% das necessidades energéticas.
Os pesquisadores realizaram um estudo clínico prospectivo e randomizado em dois centros na Suíça. Foram incluídos pacientes no terceiro dia de internação na UTI que receberam menos de 60% das necessidades energéticas por terapia de nutrição enteral. As necessidades energéticas foram medidas por meio de calorimetria indireta ou, quando esta não era possível, foram estimadas em 25 e 30 kcal por kg de peso corporal ideal por dia para mulheres e homens, respectivamente.
Os pacientes foram aleatoriamente distribuídos em dois grupos: grupo nutrição parenteral complementar à nutrição enteral (n=153) e grupo nutrição enteral isolada (n=152). A média de fornecimento energético entre os dias 4 e 8 foi de 28 kcal/kg por dia para o grupo nutrição parenteral complementar (103% [±18%] das necessidades energéticas), em comparação com 20 kcal/kg por dia para o grupo nutrição enteral isolada (77% [±27%] das necessidades energéticas). Entre os dias 9 e 28 de internação na UTI, 27% dos pacientes do grupo nutrição parenteral complementar apresentaram algum tipo de infecção hospitalar, em comparação com 38% dos pacientes do grupo nutrição enteral isolada (p=0,03). Além disso, o grupo nutrição parenteral complementar apresentou menor média de infecções hospitalares por paciente (p=0,02).
Estes resultados contrastam com o estudo EPaNIC (do inglês, Early Parenteral Nutrition Completing Enteral Nutrition in Adult Critically Ill Patients), que demonstrou resultados clínicos insatisfatórios com o uso da nutrição parenteral complementar precoce. No entanto, os dois estudos têm várias diferenças. Segundo os autores: “Nosso estudo avaliou pacientes gravemente doentes com indicações para a terapia de nutrição artificial, enquanto o estudo EPaNIC estudou principalmente pacientes submetidos à cirurgia cardíaca, que raramente precisam de terapia nutricional artificial, especialmente nutrição parenteral.
Além de outras diferenças, o nosso grupo que recebeu nutrição parenteral complementar apresentou déficit energético cumulativo crescente. Portanto, nossa população foi composta exclusivamente de pacientes com indicação real para terapia nutricional, com um déficit médio de energia acumulada de quase -4000 kcal no quarto dia de internação na UTI. Estes pacientes apresentaram verdadeiro risco de desnutrição, diferentemente dos pacientes avaliados no EPaNIC”.
Os autores suíços concluem que “nosso estudo é o primeiro do tipo randomizado e controlado a demonstrar que atingir as necessidades energéticas em 100% com a nutrição parenteral complementar em pacientes graves está associado com redução de infecções hospitalares e diminuição do uso de antibióticos, tornando-se uma estratégia eficaz para beneficiar pacientes críticos”.
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