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Dieta enteral artesanal ou industrializada: qual é a melhor?

dieta enteral artesanal ou industrializada
dieta enteral artesanal ou industrializada

Fonte: Shutterstock

Entendendo a dieta enteral

A inviabilidade da alimentação por via oral pode decorrer de diversas condições que prejudicam a capacidade de deglutição, tais como AVC, demência, câncer de cabeça e pescoço, entre outros. Nestes casos, aumenta-se o risco de desnutrição, morbidade e mortalidade.

O fornecimento de dietas enterais é uma forma útil de conter tais complicações, melhorando a situação dos pacientes tratados em hospitais, instalações de longa permanência ou que recebam cuidados em casa.

De modo geral, estas dietas podem ser classificadas em artesanais ou industrializadas. Vamos entender melhor essa diferença?

 

Dieta Enteral Artesanal

Trata-se de uma comida caseira à consistência suave, apta para ser administrada através da sonda enteral. Composta por alimentos comuns, tais como leite, ovos, carnes, frutas e vegetais, que devem ser cozidos e transformados em um purê a partir do peneiramento, ou utilizando um liquidificador.

Além disso, podem ser associadas a módulos nutricionais (sendo então denominadas “dietas enterais mistas”).

 

Vantagens da dieta artesanal

  1. Acessibilidade financeira

Em comparação às formulações industrializadas exclusivas, apresentam menores gastos, demonstrando também redução de custos médios anuais de hospitalização.

  1. Valores psicossociais

Por serem preparadas com alimentos convencionais, a dieta enteral artesanal possibilita uma sensação de normalidade e prazer nas refeições, além da maior proximidade com os membros da família e cuidadores.

  1. Alimentos naturais

Por ser preparada com alimentos do dia-a-dia, proporciona a seleção de ingredientes in natura, além de promover uma maior flexibilidade na dieta, fugindo da monotonia.

 

Desvantagens da dieta artesanal

  1. Valor nutricional incerto

Por ser obtido a partir de tabelas de composição nutricional, o cálculo das dietas artesanais pode não oferecer valores tão seguros quanto aqueles obtidos em laboratórios.

  1. Menor teor de macro e micronutrientes

Fatores como tempo de cozimento, moagem, peneiramento, sazonalidade, origem geográfica e armazenamento levam a perda de nutrientes. Diferenças significativas ocorrem em relação aos teores de carboidratos, cálcio, fósforo, magnésio, zinco, ferro e vitamina C.

  1. Ingestão energética inadequada

Como estão mais suscetíveis à distribuição percentual inadequada de macronutrientes, o valor energético também pode ser afetado. As implicações do fornecimento insuficiente de nutrientes podem incluir resultados clínicos adversos, como a perda acelerada de massa corporal magra.

  1. Instabilidade físico-química e risco de obstrução

A dieta enteral artesanal apresenta maior osmolalidade e viscosidade, condição que pode aumentar o risco de entupimento da sonda enteral, além de facilitar o crescimento microbiano e o risco de infecções, piorando o estado do paciente.

  1. Diarreia e constipação

Uma hipótese recente sugere que a diarreia pode ser induzida pela presença de FodMaps, carboidratos de cadeia curta mal absorvidos presentes em alimentos como leite, frutas e legumes, muito utilizados na constituição de uma dieta enteral artesanal. Tais ingredientes podem promover uma efeito osmótico que aumenta o conteúdo de líquido no lúmen, provocando efeitos laxativos.

 

Dieta enteral industrializada

Compostas por fórmulas quimicamente definidas, que podem ser prontas ou semiprontas, em pó ou líquidas. Seu uso tem aumentado em países desenvolvidos, principalmente devido aos avanços da tecnologia e ao envelhecimento da população.

 

Vantagens da dieta industrializada

  1. Praticidade e conveniência 

Por estarem semiprontas ou prontas para o consumo, promovem a praticidade e um menor tempo gasto em seu preparo.

  1. Dados de composição nutricional mais precisos

As fórmulas são quimicamente constituídas, portanto, sua composição nutricional é conhecida com mais clareza.

  1. Nutricionalmente balanceadas

São capazes de oferecer um conteúdo de macro e micronutrientes necessários para a prevenção e/ou gestão da deficiência nutricional e a manutenção do metabolismo normal.

Um estudo europeu, ao examinar o conteúdo de micronutrientes de 62 fórmulas de nutrição enteral fabricadas por 5 empresas diferentes, constatou-se que as necessidades diárias da maioria dos micronutrientes foram contempladas, com exceção para a vitamina K e para o flúor.

  1. Manutenção das características físicas e químicas

Ao contrário da dieta artesanal, as propriedades físico-químicas da dieta industrializada são mais estáveis, diminuindo os riscos atrelados à isso.

 

Desvantagens da dieta idustrializada

  1. Custo

Principalmente quando administrada por longos períodos, a dieta enteral industrializada pode não ser uma opção viável devido ao seu valor financeiro, principalmente em regiões mais pobres.

  1. Perda de integração familiar

O uso de fórmulas quimicamente definidas não contribui para a sensação de normalidade e afeto trazidas no preparo de comidas caseiras.

 

Qual delas se sobressai?

De modo geral, a dieta enteral industrializada possui uma maior notoriedade, podendo ser considerada mais adequada nutricionalmente, com menor risco de obstrução, mais prática e segura.

Apesar de mais barata, a provável inadequação de energia e de alguns nutrientes da dieta enteral artesanal reduz a eficácia da terapia nutricional, o que pode aumentar o risco de desnutrição, morbidade, mortalidade e tempo de internação. Sua viscosidade pode ainda dificultar a fluidez através das sondas, e até provocar entupimento e infecções. No contexto do atendimento ambulatorial, isso pode aumentar o risco de readmissão hospitalar e custos de cuidados domiciliares.

 

Então, a dieta enteral artesanal é ruim?

As informações até aqui apresentadas não indicam que a dieta artesanal seja descartável. Pelo contrário, ela também tem a sua importância.

As formulações comerciais podem estar indisponíveis devido ao custo elevado; assim, as fórmulas enterais caseiras desempenham um papel importante na recuperação de pacientes que dependem de seu uso para manutenção ou recuperação de seu estado nutricional, principalmente à domicílio.

De fato, em um inquérito epidemiológico brasileiro, verificou-se uma maior frequência no uso de dietas enterais artesanais mistas (55%), o que sugere uma preocupação em manter um fornecimento controlado de nutrientes, ao mesmo tempo em que se economiza. Enquanto isso, a dieta industrializada foi mais frequente no setor privado de saúde.

Por fim, é importante salientar que as necessidades nutricionais dos pacientes são variadas, bem como a complexidade de suas condições. Por isso, a escolha entre as dietas enterais deve ser feita por profissionais de saúde juntamente ao paciente, indicando aquela que mais faça sentido para cada um dos contextos.

 

Referências:

AANHOLT, Denise Philomene Joseph van et al. Inquérito Brasileiro Sobre Terapia de Nutrição Domiciliar: panorama atualRevista de Divulgação Científica Sena Aires, v. 10, n. 1, p. 127-138, 2021.

OJO, Omorogieva et al. An evaluation of the nutritional value and physical properties of blenderised enteral nutrition formula: A systematic review and meta-analysisNutrients, v. 12, n. 6, p. 1840, 2020.

MEZZOMO, Thais Regina et al. Content of poorly absorbed short‐chain carbohydrates (FODMAP) in enteral homemade dietsNutrition in Clinical Practice, v. 34, n. 2, p. 264-271, 2019.

FRANCA, Sarah Candido et al. Homemade diet versus diet industrialized for patients using alternative feeding tube at home – An integrative review. Nutrición Hospitalaria, v. 34, n. 6, p. 1281-1287, 2017.

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