Entre os 20 aminoácidos disponíveis, a glutamina se destaca por ser o mais abundante e versátil do corpo, capaz de participar de diferentes vias metabólicas, com destaque para metabolismo de outros aminoácidos e função imunológica.1,2
Nutricionalmente classificada como aminoácido não essencial, a glutamina pode ser sintetizada por pulmões, fígado, cérebro, músculos esqueléticos e tecido adiposo. No entanto, em condições catabólicas, como sepse, recuperação de queimaduras ou cirurgia e desnutrição, bem como em exercícios físicos de alta intensidade, a síntese endógena é incapaz de suprir a demanda orgânica e a glutamina passa, então, a ser um aminoácido condicionalmente essencial, devendo ser obtida através da dieta. 1,3,4
A glutamina desempenha inúmeras funções no corpo, mas destaca-se a relação entre glutamina, sistema imunológico e células musculares.4
Embora a glicose seja o principal combustível para um grande número de células no corpo, células do sistema imunológico, bem como os enterócitos, utilizam glutamina como substrato em taxas semelhantes ou superiores à glicose.1,3 Nos glóbulos brancos, por exemplo, a glutamina está envolvida na proliferação de linfócitos, serve como substrato energético a neutrófilos e é capaz de modular a ativação de macrófagos. ¹
No intestino, além de prover energia, a glutamina contribui para a manutenção da integridade da barreira intestinal, permitindo a absorção adequada de nutrientes, e reduz produção de citocinas pró-inflamatórias pela mucosa intestinal, papel dá a glutamina grande destaque no tratamento das doenças inflamatórias intestinais.1,5
Os músculos esqueléticos, por sua vez, desempenham um papel fundamental no metabolismo da glutamina: cerca de 80% de toda a glutamina corporal está presente nessas células. Nas células musculares acontece estoque, síntese e liberação de glutamina para circulação sanguínea e outros tecidos.³ A síntese de glutamina ocorre no estado pós-absortivo, a partir da captação do glutamato da corrente sanguínea ou pela utilização de substrato do catabolismo muscular, que também libera glutamato. Esta síntese é maior que a de qualquer outro aminoácido pelo músculo esquelético. 1,3
Em condições de deficiência ou aumento de demanda, há menor contribuição dos músculos para manter a concentração de glutamina no plasma e, consequentemente, prejuízo na função das células imunológicas, com aumento da imunossupressão, agravamento de doenças e infecções, aumento do risco de desfechos clínicos ruins e mortalidade, justificando a necessidade de suplementação em algumas situações.²
Corroborando outros estudos que também investigaram os efeitos da suplementação oral de glutamina em pacientes oncológicos, Chang e colaboradores observaram que em pacientes com câncer avançado de pulmão submetidos a radioterapia a suplementação de glutamina foi capaz de prevenir lesões induzidas por radiação e perda de peso corporal, melhorando, assim, a qualidade de vida dos pacientes.6-8
Em atletas, altas cargas de treinamento aumentam a propensão a doenças infecciosas, sugerindo que o treinamento pode suprimir a função imunológica. A suplementação de glutamina para atletas com alta carga de treinamento aumentou significativamente a concentração de linfócitos após o treinamento comparado ao placebo, sugerindo que a suplementação de glutamina é capaz de reduzir os efeitos imunossupressores do treinamento de carga pesada.9
Em estudos com animais, Santos e colaboradores identificaram que a exposição a exercícios extenuantes por 6 semanas levou ao aumento no consumo de glutamina e na função dos macrófagos pós-exercício, sugerindo ser benéfica a suplementação de glutamina nessas situações.10
A glutamina possui, também, relevante papel na mediação da ativação de vias metabólicas de síntese proteica. Na privação prolongada de aminoácidos, como em casos de inanição, pesquisadores observaram perda inicial da sinalização de mTOR, um regulador de massa e tamanho de tecido muscular, o que comprometeria a síntese muscular. Observaram, também, que a glutamina seria capaz de reativar essa via, por meio de sua conversão em glutamato e restauração do pool de aminoácidos não essenciais.11 É sabido que a leucina é o aminoácido mais importante na indução do anabolismo proteico via mTOR, porém, neste caso, o uso da leucina teria seu efeito comprometido, já que na deficiência de glutamina não conseguiria ativar a via mTOR.¹
Observa-se, também, sua participação na modulação das respostas de proteção e resistência às lesões musculares, devido aos seus efeitos antioxidantes e citoprotetores, particularmente importantes em situações de catabolismo proteico.4 Nessa linha, a suplementação aguda de glutamina associada a prática de exercícios resistidos resultou em maior força durante a execução dos exercícios e menor dor pós exercício.12
Vale destacar que a suplementação de glutamina na forma livre (L-glutamina) promove, por exemplo, maior síntese muscular do que quando consumida como parte da dieta, através de alimentos proteicos.13
Assim, destaca-se que apesar das fortes evidências sobre o uso da glutamina associado ao fortalecimento da resposta imunológica, há uma importante relação entre massa muscular e glutamina, sendo que sua suplementação pode conferir benefícios relacionados a aumento de força e recuperação pós-treino.
Referências
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Nutricionista pelo Centro Universitário São Camilo. Mestranda pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – FMUSP. Especialização em Obesidade, Emagrecimento e Saúde pela Unifesp. Tutora de cursos EAD do Ganep Educação. Coordenadora do Nutritotal.