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Consenso internacional sobre nutrição e terapia com GLP-1

nutrição e terapia com GLP-1

Fonte: Canva

Nos últimos anos, os agonistas do receptor do peptídeo semelhante ao glucagon-1 (GLP-1) revolucionaram o tratamento da obesidade. Medicamentos como semaglutida, liraglutida e tirzepatida têm se mostrado eficazes em reduzir o peso corporal entre 5% e 18% em ensaios clínicos, além de melhorar fatores cardiometabólicos. 

Entretanto, o uso desses fármacos não está isento de desafios: efeitos gastrointestinais, perda de massa muscular e óssea, deficiências nutricionais, baixa adesão no longo prazo e altos custos.

Fonte: Canva

Diante disso, um grupo internacional elaborou um posicionamento destacando prioridades nutricionais e de estilo de vida para otimizar resultados e facilitar a integração entre nutrição e terapia com GLP-1.

Avaliação inicial e abordagem centrada no paciente

Antes da prescrição médica de GLP-1, recomenda-se uma avaliação nutricional abrangente, incluindo histórico alimentar, padrões dietéticos, presença de deficiências prévias e fatores de risco como sarcopenia ou osteopenia. 

O uso do modelo 5As (avaliar, aconselhar, acordar, assistir e organizar) é útil para orientar a interação paciente-profissional a fim de criar a base para a adesão a longo prazo à mudança de comportamento. 

Além do peso, é essencial considerar a composição corporal, força muscular, preferências culturais e barreiras sociais que possam impactar o acesso à alimentação saudável. 

O acompanhamento por nutricionistas e programas estruturados de estilo de vida são apontados como pilares dessa abordagem.

Nutrição e terapia com GLP-1: prevenção e manejo de efeitos gastrointestinais

Náuseas, vômitos, diarreia e constipação estão entre os efeitos adversos mais frequentes dos GLP-1. Eles são mais propensos a ocorrer durante o início do tratamento com GLP-1 ou aumento da dose.

Estratégias nutricionais simples podem minimizar esses sintomas: 

Para constipação, recomenda-se aumentar gradualmente o consumo de fibras alimentares e líquidos, além de incluir alimentos com menor viscosidade, menos calorias, menor índice glicêmico e maior teor de água. Frutas secas, como ameixa seca, também ajudam. Se as estratégias alimentares forem insuficientes, outras terapias incluem suplementação de fibras e citrato de magnésio.

Já em casos de diarreia, evitar refeições grandes ou ricas em gordura pode ser útil. Se ocorrer diarreia significativa, cápsulas ou pós de fibras dão volume às fezes

O acompanhamento nutricional é fundamental para ajustar a dieta conforme a tolerância do paciente.

Garantia da ingestão de nutrientes essenciais

Com a redução do apetite e da ingestão calórica total (16%–39% menor em média), cresce o risco de deficiências de micronutrientes como vitamina D, cálcio e vitamina B12.

Para mitigar esse risco, a diretriz recomenda uma dieta densa em nutrientes. A tabela abaixo indica os fatores alimentares a priorizar ou minimizar.

Fatores a incentivar Fatores a minimizar/evitar
Grupos alimentares
Frutas (ex.: frutas vermelhas, maçãs, frutas cítricas, banana, uvas, abacate) Carboidratos refinados (grãos processados, farinhas, açúcares adicionados)
Vegetais (ex.: brócolis, folhas verdes, tomates, cenouras, ervilhas, abóbora) Bebidas adoçadas com açúcar
Grãos integrais (ex.: aveia, quinoa, arroz integral, pães e cereais integrais) Carnes processadas e vermelhas
Laticínios (ex.: iogurte, leite, queijo) A maioria dos fast foods
Proteínas magras (ex.: aves, peixe/frutos do mar) e ovos Doces e lanches açucarados/salgadinhos
Nozes e sementes (ex.: amêndoas, amendoim, chia, gergelim, linhaça, sementes de cânhamo)
Gorduras vegetais/óleos (ex.: azeite de oliva, canola, óleo de abacate)
Chá de gengibre ou hortelã-pimenta
Hábitos alimentares
Refeições regulares, em horários consistentes Alimentação emocional, automática ou noturna
Flexibilidade nas escolhas alimentares Longos períodos sem se alimentar (ficar com muita fome)
Preferir porções controladas Consumo de refeições muito grandes
Garantir ingestão adequada de líquidos
Consumo mínimo de álcool

Em alguns casos, pode ser necessária suplementação específica. Multivitamínicos podem ser indicados, mas em doses adaptadas às necessidades de cada pessoa. O monitoramento laboratorial deve guiar a conduta.

Preservação da massa muscular e óssea

Outro ponto de atenção é a perda de massa magra durante o emagrecimento. Esse impacto pode ser atenuado por:

Alguns indivíduos podem atingir as metas proteicas suplementando com shakes, barras e outros produtos fortificados com proteína.

Vale lembrar que o aumento da ingestão de proteínas por si só é inadequado para auxiliar na preservação da massa muscular. Proteína acima das necessidades musculares para reparo ou crescimento pode ser convertida em gordura pelo fígado e aumentar a adiposidade visceral.

Quanto ao tecido ósseo, reduções rápidas e significativas de peso também podem levar à perda de densidade mineral. A manutenção de ingestão adequada de cálcio, vitamina D e proteínas, associada ao exercício físico, é essencial para reduzir esse risco.

Mudanças no apetite e preferências alimentares

O uso de GLP-1 altera o comportamento alimentar, reduzindo a “food noise” (ruminação constante sobre comida), a alimentação emocional, os episódios de compulsão e a atração por alimentos ultraprocessados

Muitos pacientes relatam menor desejo por doces, gorduras e fast food, e maior desejo por alimentos minimamente processados ​​e ricos em nutrientes (como frutas e vegetais).

Embora esses efeitos possam favorecer boas escolhas, o lado negativo é que alguns pacientes podem desenvolver aversões alimentares, e o hábito de passar várias horas sem comer. Isso pode gerar  ingestão inadequada de nutrientes, assim como “preferências rebote” por açúcares e carboidratos refinados.

Nesses casos, o aconselhamento nutricional é crucial para manter uma ingestão balanceada. O encaminhamento para terapia comportamental pode ser necessário.

O papel do acompanhamento nutricional contínuo

A diretriz reforça que os benefícios dos GLP-1 dependem fortemente de um suporte nutricional estruturado. Interrupções no tratamento levam a reganho de peso. Desse modo, estratégias como visitas em grupo, teleatendimento, programas digitais e outras intervenções podem ampliar adesão e impacto clínico.

Assim, longe de substituir a nutrição, os GLP-1 devem ser vistos como ferramentas adicionais. O tratamento ideal integra medicamentos, dieta de alta qualidade, atividade física regular e suporte psicossocial.

Para ler a diretriz completa, clique aqui.

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Referências:

Nutritional priorities to support GLP-1 therapy for obesity: a joint Advisory from the American College of Lifestyle Medicine, the American Society for Nutrition, the Obesity Medicine Association, and The Obesity Society. Mozaffarian, Dariush et al. The American Journal of Clinical Nutrition, Volume 122, Issue 1, 344 – 367.

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