Cerca de um terço da população adulta mundial possui hipertensão arterial, popularmente conhecida como “pressão alta”. Embora a terapia farmacológica seja primordial no tratamento da hipertensão arterial, diversas modificações de estilo de vida podem contribuir para a melhora deste quadro.
A seguir, você conhecerá um pouco mais sobre hipertensão arterial, e as principais estratégias não-medicamentosas para o seu controle, com base em estudos científicos e diretrizes médicas.
Qual é a definição de hipertensão?
A hipertensão arterial (HA) é uma doença crônica não transmissível, caracterizada por pressão arterial sistólica (PAS) maior ou igual a 140 mmHg, e/ou PA diastólica (PAD) maior ou igual a 90 mmHg.
Para ser hipertenso, o indivíduo deve apresentar elevação da pressão arterial em pelo menos duas ocasiões diferentes, na ausência de medicação anti-hipertensiva.
Ademais, a hipertensão é classificada de acordo com o seu grau de elevação da pressão arterial, como mostra o quadro abaixo.
Classificação | PAS (mmHg) | PAD (mmHg) |
Pré-hipertensão | 130 a 139 | 85 a 89 |
HA estágio 1 | 140 a 159 | 90 a 99 |
HA estágio 2 | 160 a 179 | 100 a 109 |
HA estágio 3 | ≥ 180 | ≥ 110 |
Alguns fatores de risco podem aumentar as chances de hipertensão arterial e suas complicações (AVC, infarto, etc). São eles:
- Genética
- Envelhecimento
- Sobrepeso e obesidade
- Consumo de álcool e sódio em excesso
- Sedentarismo
- Tabagismo
- Apneia Obstrutiva do Sono (AOS)
O papel da nutrição no tratamento da hipertensão arterial
Todos os pacientes hipertensos devem adotar hábitos de vida saudáveis, principalmente em relação à alimentação. A seguir, conheça as recomendações nutricionais que auxiliam o controle da hipertensão arterial.
Manter um peso saudável
O sobrepeso e obesidade, principalmente acompanhados de obesidade abdominal, são fatores que aumentam o risco da hipertensão arterial. Estima-se que, para cada cinco unidades acima de um IMC>25 kg/m², o risco de morte cardiovascular aumenta em 49%.
Mesmo sem alcançar o peso corporal eutrófico, a perda de peso já traz benefícios na pressão arterial, tanto em indivíduos normotensos quanto em hipertensos. Uma metanálise com 25 estudos concluiu que, para cada 1 kg perdido, a pressão arterial diminui cerca de 1 mmHg.
Para apoiar o emagrecimento, a alimentação saudável e a atividade física devem unir forças para promover um déficit calórico diário. Além disso, estratégias comportamentais como treinamentos de conscientização do apetite e identificação dos sinais de saciedade, podem ajudar.
Reduzir a ingestão de sódio
O sódio possui um efeito hipertensor, ao reter água nos vasos sanguíneos e elevar a pressão das paredes arteriais. A recomendação é limitar a ingestão de sódio para até 2 g/dia, equivalente a 5 g de sal de cozinha.
Para isso, orienta-se:
- Evitar alimentos industrializados ricos em sódio (carnes processadas, alimentos enlatados, temperos e molhos prontos, fast-foods, e ultraprocessados em geral);
- Utilizar temperos naturais para cozinhar as refeições, como ervas frescas, especiarias e legumes aromáticos (cebola, alho, gengibre, etc);
- Optar por sal light, que possui um menor teor de sódio (191 mg de sódio em 1 g, em comparação à 400 mg do sal comum).
É importante ressaltar que outros tipos de sal (sal rosa, sal negro, sal marinho, etc) podem possuir quantidades semelhantes de sódio quando comparados ao sal refinado. Por isso, a recomendação é sempre o consumo moderado, seja qual for o tipo de sal.
Aumentar a ingestão de potássio
O consumo de potássio é muito importante para o controle da pressão arterial, ao passo que ele aumenta a excreção de sódio na urina, diminui a secreção de substâncias vasoconstritoras e aumenta a secreção de agentes vasodilatadores.
Em uma revisão científica envolvendo 917 participantes, a suplementação de potássio (entre 75 a 125 mmol por dia) diminuiu a pressão sistólica em cerca de 6,8 mmHg, e a pressão diastólica em 4,6 mmHg.
Entretanto, o potássio está amplamente presente nas frutas e vegetais, especialmente crus. Exemplos de alimentos ricos em potássio incluem banana, goiaba, mamão, uva, laranja, damasco, uva-passa, tomate, abacate, folhas verdes, feijão e ervilha.
Dieta DASH
A adoção de um padrão alimentar saudável é crucial no manejo da hipertensão. A literatura científica recomenda a dieta DASH (“Dietary Approaches to Stop Hypertension”), que tem como características:
- Alto consumo de frutas, hortaliças, laticínios com baixo teor de gorduras e cereais integrais
- Consumo moderado de oleaginosas
- Redução no consumo de gorduras, doces e bebidas com açúcar e carnes vermelhas
Sugere-se que o efeito hipotensor desta dieta esteja relacionado ao alto teor de potássio, cálcio, magnésio e fibras, com quantidades reduzidas de colesterol e gorduras totais e saturadas.
No Estudo ENCORE, a adoção da dieta DASH induziu reduções significativas na pressão arterial (PAS: -11,2 mmHg; PAD: -7,5 mmHg), em comparação à dieta habitual.
Outros padrões alimentares, como dieta mediterrânea e vegetariana, também foram apontados como prováveis redutores da hipertensão arterial. Entretanto, a dieta DASH possui os efeitos mais comprovados nessa população.
Reduzir bebidas alcóolicas
Há uma relação direta entre o consumo de bebidas alcoólicas e o aumento da pressão arterial, sendo que o consumo abusivo está associado a maior prevalência de hipertensão.
Sendo assim, para aqueles que ingerem álcool, a diretriz brasileira de hipertensão arterial orienta limitar o consumo a 30 g de álcool/dia. Em termos práticos, isso equivale a:
- Uma garrafa de cerveja (5% de álcool, 600 mL); ou
- Duas taças de vinho (12% de álcool, 250 mL); ou
- Uma dose de destilados (42% de álcool, 60 mL)
Outras instituições internacionais fazem recomendações ainda mais rígidas, indicando o consumo máximo de 20 g/d de álcool para homens, e 10 g/d para mulheres.
Vale ressaltar que mesmo a baixa ingestão de álcool está associada a uma maior prevalência de doenças cardiovasculares e mortalidade. Em outras palavras, não há limite seguro para o consumo de álcool. Por isso, indivíduos que não bebem não devem começar a beber.
Demais recomendações nutricionais
Além das orientações acima, outras estratégias nutricionais que podem auxiliar o tratamento da hipertensão arterial incluem:
- Limitar consumo de carne vermelha
- Reduzir consumo de açúcar e bebidas adoçadas
- Optar por laticínios com baixo teor de gordura, ao invés de laticínios integrais
- Aumentar ingestão de fibras (cerca de 30 g/d)
- Consumir alimentos ricos em polifenois (gengibre, cacau, beterraba, etc)
- Manter níveis adequados de micronutrientes, como vitamina C e D
- Consumir chá preto e/ou chá verde
Tratamento da hipertensão arterial: orientações de estilo de vida
Além da alimentação, diversos outros parâmetros de estilo de vida também precisam de cuidados quando o assunto é hipertensão arterial. Confira-os abaixo.
Para auxiliar em sua prática clínica, baixe o infográfico gratuito e resumido: Tratamento não medicamentoso da hipertensão arterial.
Prática de atividade física
A prática regular de atividade física diminui a incidência de hipertensão arterial e o risco de mortalidade por doenças cardiovasculares. Contudo, em pacientes hipertensos, a atividade deve ser precedida de uma avaliação médica especializada.
Em uma meta-análise com 391 ensaios clínicos, observou-se que o exercício físico foi tão eficaz quanto os medicamentos hipertensivos na redução da pressão arterial sistólica.
Sendo assim, para os pacientes hipertensos, as recomendações de exercícios físico são:
1) Reduzir o período de inatividade, movimentando-se sempre que possível. Levantar-se por 5 minutos a cada 30 minutos sentado.
2) A cada semana, realizar 150 a 350 minutos de treinamento aeróbico moderado, como andar, correr, dançar, nadar, andar de bicicleta, etc (3 a 5 vezes por semana, 30 a 60 minutos por sessão).
3) Como complemento aos exercícios aeróbios, pode-se realizar exercícios de resistência (fortalecimento muscular) de 2 a 3 vezes por semana, em dias não consecutivos.
4) Aumentar a atividade física incidental (realizada no lar ou trabalho, como varrer o chão).
Sono adequado
Diversas condições do mundo moderno podem prejudicar o sono: trabalho por turnos, alta exposição às telas, luzes artificiais… Como consequência, muitos adultos acabam tendo horários de sono irregulares, má qualidade e privação do sono, resultando em maior risco de hipertensão arterial.
Em uma meta-análise com mais de 1 milhão de indivíduos, descobriu-se que tanto a duração curta (≤5 h) ou longa (≥9 h) do sono podem aumentar os níveis da PA.
Além de perturbar o ciclo circadiano, o sono inadequado também aumenta os fatores de risco à hipertensão. Por exemplo, a privação de sono está positivamente associada a níveis desregulados de leptina, aumento da fome e incidência da obesidade.
Nesse cenários, abordagens para melhorar a qualidade do sono incluem:
- Dormir 7 a 9 horas por dia;
- Ter horários regulares para dormir, acordar, comer e se exercitar;
- Restringir os cochilos diurnos à 30 minutos, no máximo;
- Dormir em um ambiente totalmente escuro;
- Evitar a ingestão de alimentos, cafeína, álcool e cigarros perto da hora de dormir;
- Evitar a exposição às telas de 1 a 2 horas antes de dormir.
Cessação do tabagismo
Estima-se que o tabagismo eleve a pressão arterial em cerca de 5 a 10 mmHg. Embora não haja estudos conclusivos sobre os benefícios da cessação, parar de fumar deve ser uma prioridade para pacientes hipertensos, devido ao risco cardiovascular e de neoplasias.
O risco deste hábito não se restringe aos cigarros: charutos, cachimbos, narguilé e cigarros eletrônicos. Todos os tipos devem ser excluídos.
Além do apoio psicológico, a prescrição de medicamentos são eficazes para ajudar os fumantes a parar de fumar. Estes incluem as gomas, pastilhas e adesivos de nicotina.
Controle do estresse
Situações de estresse ocasionam uma maior liberação adrenérgica, o que pode elevar os níveis pressóricos e até dificultar o efeito de medicações hipotensoras.
Por outro lado, técnicas de manejo de estresse vêm sendo estudadas para redução da PA. Terapia comportamental, meditação, yoga, musicoterapia, atenção plena, acupuntura, e exercícios de respiração profunda são alguns dos principais exemplos.
Uma meta-análise relatou que 45 minutos de ioga por dia, durante 12 semanas, foi capaz de reduzir a PAS em 6,5 mmHg, e a PAD em 2,8 mmHg.
Para o controle do estresse em hipertensos, a International Society of Hypertension indica:
- Técnicas de redução do estresse por pelo menos 3 horas/semana;
- Ioga, meditação ou tai chi por pelo menos 45 minutos/semana;
- Ouvir música pelo menos 3 vezes na semana ou todos os dias (exp: música clássica).
No geral, a melhor intervenção para reduzir o estresse será aquela da preferência de cada indivíduo e que se encaixe em sua rotina, para ser sustentável ao longo do tempo.
Conclusão
A hipertensão é uma das principais causas mundiais de morte prematura. Embora o tratamento farmacológico seja fundamental, estratégias não medicamentosas também são essenciais no manejo adequado da doença. Portanto, essas ferramentas devem ser combinadas e incentivadas pelos profissionais da saúde.
Ter um padrão alimentar saudável, praticar atividades físicas, dormir bem e controlar o estresse são alguns exemplos de mudanças simples e acessíveis a serem incentivadas por profissionais de saúde que tratam a hipertensão. Com uma abordagem integrada, essa enfermidade há de ser combatida.
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Referências:
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Diretriz brasileira de hipertensão arterial (material resumido). Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo.
Valenzuela, P.L., Carrera-Bastos, P., Gálvez, B.G. et al. Lifestyle interventions for the prevention and treatment of hypertension. Nat Rev Cardiol 18, 251–275 (2021). https://doi.org/10.1038/s41569-020-00437-9