Nos dias de hoje, as doenças cardiovasculares (DCV) são a maior causa de morbimortalidade ao redor do mundo. Embora seu tratamento seja bem estudado, com estratégias farmacológicas e de estilo de vida estabelecidas, a melhor opção continua sendo a prevenção.
Neste artigo, reunimos as principais estratégias dietéticas para conduzir a prevenção de doenças cardiovasculares na prática clínica. Confira!
Fatores de risco para doenças cardiovasculares
Embora todos os pacientes se beneficiem com orientações de prevenção às DCVs, certos grupos populacionais se encontram em maior risco de desenvolver essas enfermidades. Sendo assim, as recomendações devem ser ainda mais incisivas para estes indivíduos.
Dentre os principais fatores de risco para doenças cardiovasculares, estão:
- Histórico familiar de DCV prematura
- Tabagismo
- Dislipidemias
- Diabetes mellitus
- Obesidade e adiposidade elevada
- Doença renal crônica
- Síndrome metabólica
- Condições específicas para mulheres (por exemplo, pré-eclâmpsia, menopausa prematura)
- Condições inflamatórias crônicas (especialmente artrite reumatóide, lúpus, psoríase avançada, HIV)
- Etnia (por exemplo, ascendência do sul da Ásia)
- Sedentarismo
- Dieta pouco saudável
Atualmente, existem diversas formas de calcular o risco cardiovascular de um indivíduo, prevendo a possibilidade de eventos cardiovasculares nos anos futuros. Um exemplo é a calculadora de risco cardiovascular da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS/OMS).
Apesar de alguns fatores de risco serem fixos, como o histórico familiar ou a etnia, boa parte deles constituem fatores de risco modificáveis. Em outras palavras, podem ser revertido com a aplicação das 6 estratégias detalhadas a seguir.
Padrão alimentar saudável: dieta DASH ou mediterrânea
Em primeiro lugar, seguir um padrão dietético saudável e equilibrado é a principal recomendação alimentar para a prevenção de doenças cardiovasculares. Nesse sentido, uma ampla gama de evidências científicas apontam a dieta DASH e dieta mediterrânea como ótimas opções para a saúde do coração.
A dieta mediterrânea inclui altas ingestões de frutas, vegetais, leguminosas, produtos integrais, peixes e azeite, consumo moderado de álcool, e baixa ingestão de carne vermelha, laticínios e ácidos graxos saturados.
Em estudo, seguir uma dieta mediterrânea enriquecida com nozes ao longo de 5 anos reduziu o risco de doenças cardiovasculares aterosclerótica em 28%.
Já a dieta DASH é um plano alimentar voltado para a redução da pressão arterial, uma das principais causas de desenvolvimento das DCV. Nessa dieta, enfatiza-se o consumo de alimentos ricos em nutrientes essenciais, como frutas, vegetais, grãos integrais, proteínas magras e laticínios com baixo teor de gordura. Além disso, limita-se as gorduras trans e saturadas, e os açúcares adicionados.
Em revisão publicada pela American Heart Association, a dieta DASH foi a intervenção dietética mais efetiva em relação ao tratamento usual em adultos com pré-hipertensão e hipertensão arterial.
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Para indivíduos propensos e/ou abertos a mudanças mais intensas, uma dieta vegetariana bem estruturada também traz impactos positivos para a prevenção das DCVs. Em uma análise do estudo PREDIMED, quanto mais próxima a dieta do indivíduo estivesse de ser vegetariana, menor seria o risco de morte cardiovascular.
Embora estes padrões alimentares sejam amplamente estudados, podem ser de difícil aplicação para quem não está habituado. Pensando nisso, o Ministério da Saúde propôs a Alimentação Cardioprotetora Brasileira (Dica Br), com base em alimentos tipicamente brasileiros e com recomendações visuais. Clique aqui para saber mais.
Perda de peso
Segundo as diretrizes da European Society of Cardiology (ESC), pacientes com sobrepeso ou obesidade devem reduzir o peso, de forma a diminuir o risco cardiovascular causado pelo excesso de gordura.
Mesmo perdas moderadas, de 5 a 10% em relação ao peso inicial, já são capazes de impactar positivamente os fatores de risco cardiovasculares. Para isso, o déficit calórico deve ser o foco das intervenções nutricionais visando prevenir as DCVs.
Inicialmente, a redução calórica mínima de 300 kcal/dia pode ser interessante para habituar o paciente e traduzir-se em uma perda de peso moderada. Em seguida, em indivíduos com o peso estabilizado, a redução calórica de 500 kcal/dia ajudará a dar continuidade ao programa de emagrecimento.
Na prática clínica, o IMC e a circunferência de cintura são parâmetros facilmente mensuráveis para traduzir a evolução do paciente quanto à perda de peso. Particularmente, a circunferência de cintura indica a distribuição de gordura abdominal, fortemente ligada ao risco de doenças cardiovasculares.
Reduzir gorduras saturadas e trans
O excesso de gorduras saturadas e trans aumentam o risco cardiovascular de diversas maneiras, seja elevando o nível de colesterol LDL (o colesterol “ruim”), diminuindo o colesterol HDL (“bom”), ou contribuindo para estados inflamatórios e oxidativos.
Em média, um aumento de 2% na ingestão energética de ácidos graxos trans está associado a um risco 23% maior de doença coronariana. Dados agrupados das pesquisas Nurses Health Study e do Health Professionals Follow-up Study mostram que a substituição de 2% da energia da gordura saturada por gordura trans foi associada a um aumento de 16% na mortalidade cardiovascular.
Dessa maneira, o consumo de gorduras saturadas na dieta não deve ultrapassar 10% das calorias diárias totais. Já as gorduras trans devem ser excluídas da dieta, ou reduzidas a um nível abaixo de 1% do VET.
Assim, uma boa recomendação para prevenção de doenças cardiovasculares é limitar o consumo de carnes, laticínios integrais, óleos de coco e palma, fast-foods, alimentos ultraprocessados, dentre outros alimentos ricos nestes nutrientes.
Em contrapartida, alimentos ricos em ácidos graxos ômega-3 devem ser priorizados. Estudos indicam que comer peixe pelo menos 1 vez por semana está associado a um risco 16% menor de doença arterial coronariana. Quando este consumo aumenta para 2-4 vezes/semana, há um risco 6% menor de AVC.
Menos sódio, mais potássio
Na ciência, a relação entre o consumo de sódio e a prevenção de doenças cardiovasculares já está bem documentada. A ingestão elevada de sódio atua na retenção de água, aumentando o volume de sangue circulante elevando a pressão nas paredes dos vasos sanguíneos.
Sendo assim, orienta-se que a ingestão de sódio não ultrapasse 2.000 mg/dia, ou 5 g/dia de sal. Uma ingestão abaixo de 3/dia de sal pode trazer benefícios adicionais.
A redução do consumo de sódio pode se dar de várias maneiras. Na prática clínica, oriente seu paciente a:
- Habituar o paladar para alimentos menos salgados, de forma gradual
- Substituir o sal comum por outros com menor teor de sódio, como sal light ou sal rosa, atento para não aumentar a quantidade de sal utilizada;
- Utilizar temperos e ervas naturais para dar sabor às preparações;
- Limitar o consumo de alimentos industrializados ricos em sódio.
Contrário ao sódio, o consumo de potássio está ligado a menores níveis de pressão arterial e menor risco de AVC. Este nutriente promove a excreção de sódio pelos rins e ajuda a relaxar as paredes dos vasos sanguíneos.
A recomendação para o potássio é um consumo de 3500 a 4700 mg diários, que pode ser obtido através de frutas, vegetais e leguminosas. De fato, a cada porção adicional de fruta (77 g) e vegetais (80 g), há um risco 4% menor de mortalidade cardiovascular. A ingestão de 5 porções diárias reduz o risco de AVC em 26%.
Para pacientes que não atingem as recomendações, considerar a suplementação de potássio pode ser uma boa opção.
Incluir mais fibras solúveis
As fibras desempenham um papel crucial na prevenção de doenças cardiovasculares. Em especial, as fibras solúveis promovem produção de ácidos biliares a partir do colesterol, diminuindo seus níveis circulantes.
Nesse sentido, diversas pesquisas demonstram a capacidade das fibras solúveis em diminuir o colesterol total e o LDL, fatores de risco para as doenças do coração. Cada aumento de 7 g/dia na ingestão total de fibra está associado a um risco 9% menor de DAC. Já o aumento de 10 g/dia foi relacionado a um risco 16% menor de AVC.
A recomendação para ingestão de fibras no adulto é de, no mínimo, 25 g/dia. Além de frutas, vegetais e leguminosas, a fibra solúvel pode ser encontrada em alimentos como aveia, cevada, psyllium e farelo de trigo.
Restringir o consumo de álcool
As bebidas alcoólicas levam à um aumento da pressão arterial, enfraquecimento do músculo cardíaco, desenvolvimento de arritmias, aumento dos triglicérides, dentre outras consequências que prejudicam a saúde cardiovascular.
Desse modo, o consumo de álcool está linearmente associado a um maior risco de todos os subtipos de AVC, doença coronariana, insuficiência cardíaca e diversas outras doenças cardiovasculares.
Estima-se que o limite superior seguro seja de 100 g de álcool puro por semana, que se traduz em 2 doses diária para homens e 1 dose diária para mulheres (1 dose variando de 8 a 14 g de álcool).
Entretanto, essa recomendação serve para pacientes que já fazem uso de bebidas alcóolicas, como uma forma de reduzir os danos. Indivíduos que não bebem não devem ser incentivados a iniciar este hábito.
Estudos de randomização mendeliana não apoiam os supostos efeitos protetores de quantidades moderadas contra doenças cardíacas, sugerindo que qualquer quantidade de álcool aumenta uniformemente a pressão arterial e o IMC.
Outras recomendações
Com as orientações descritas anteriormente, é esperado que o risco cardiovascular diminuam significativamente. Entretanto, a orientação clínica não deve se limitar a elas. Outras abordagens interessantes para garantir uma boa saúde do coração incluem:
- 75 a 150 minutos de atividade física intensa ou 150 a 300 minutos de atividade física moderada por semana;
- Cessação do tabagismo;
- Tratamento de condições de saúde associadas a doenças cardiovasculares, como a diabetes mellitus;
- Limitar a carne vermelha a 350-500 g/semana;
- Reduzir os açúcares livres à menos de 5% das calorias diárias;
- 7 a 9 horas de sono por dia;
- Consumo diário de 30 g de nozes mistas;
- Limitar a cafeína à 200 mg/dia;
- Suplementação com 2g/dia de fitoesteróis.
Se você gostou desse conteúdo, leia também:
- Diretriz NICE: avaliação e redução de risco da doença cardiovascular
- Fitoesteróis e saúde cardiovascular: quais são as evidências?
- SBC 2021 – Posicionamento sobre o Consumo de Gorduras e Saúde Cardiovascular
Referências:
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