Em idosos com doença renal crônica (DRC), a prescrição de proteínas não é consensual. Enquanto algumas diretrizes defendem a sua restrição (a fim de retardar a progressão da doença), outras não suportam essa decisão, devido ao risco da desnutrição energético protéica no envelhecimento.
Para resolver este dilema, duas sociedades de nutrição (ESPEN e ERN-ERA) elaboraram uma nova diretriz com orientações para a ingestão proteica em idosos com DRC. Vamos conhecer essas recomendações?
Por que restringir proteínas para doente renal crônico?
Em primeiro lugar, precisamos entender os motivos para a restrição proteica ser recomendada em pacientes com doença renal crônica.
Dietas com baixo teor de proteínas são a base do manejo nutricional da DRC em todas as idades, juntamente com o controle de sódio, potássio e fosfato. A principal justificativa para isso é evitar a hiperfiltração glomerular e o aumento da carga de trabalho dos rins.
Quando essa recomendação não é seguida, a hiperfiltração dos néfrons pode levar à glomeruloesclerose e à fibrose tubulointersticial, principais contribuintes para a progressão da doença renal crônica.
Sendo assim, restringir proteínas é importante para:
- Retardar o declínio da função renal;
- Atenuar os distúrbios metabólicos;
- Diminuir a necessidade de terapia renal substitutiva;
- Melhorar o bem-estar.
Quais os riscos da restrição de proteínas em idosos?
Atualmente, a recomendação proteica para idosos é de 1 a 1.2 g/kg/dia. Entretanto, vários estudos sugerem uma ingestão de 1.2 a 1.5 g/kg/dia na presença de doenças agudas, fragilidade ou desnutrição.
Por isso, em situações comuns, não é indicada que a proteína seja restringida no envelhecimento. Os riscos dessa abordagem incluem a redução da massa e da função muscular, consequente sarcopenia e aumento das demais comorbidades e morbimortalidade.
No entanto, para pacientes com DRC, muitos estudos asseguram a segurança de dietas com baixo teor de proteínas, pelo menos a curto prazo. Claramente, uma equipe experiente deve estar envolvida para monitorar, aconselhar e encorajar a adesão do paciente, com uma abordagem nutricional altamente personalizada.
Ainda que as evidências sejam tranquilizadores, a mudança de hábitos alimentares na velhice pode acarretar um alto impacto psicológico.
Restrição de proteínas: quando adotar?
Considerando o risco-benefício apresentado anteriormente, os especialistas definiram as situações em que a restrição proteica pode ou não ser vantajosa para idosos com doença renal crônica. Confira-as na tabela abaixo.
Tipos de dieta com restrição de proteínas
Nas dietas com restrição proteica, a ingestão deste nutriente pode variar entre 0.3 a 0.8 g/kg/dia, a depender das necessidades e preferências individuais. A restrição pode ser moderada ou severa, sendo que:
- Restrição moderada: 0.6 a 0.8 g/kg/dia;
- Restrição severa: 0.3 a 0.4 g/kg/dia.
No quadro abaixo, estão algumas das dietas restritivas em proteína sugeridas pelos especialistas da ESPEN e ERN-ERA.
Para tomar a decisão sobre qual dieta adotar, os autores sugerem a decisão compartilhada entre a equipe multiprofissional e o paciente (além do quadro clínico).
Além disso, refeições “livres” de 1 a 2 vezes por semana podem favorecer a adesão, prevenir déficits nutricionais, evitar a monotonia e permitir a participação em eventos sociais.
Outras recomendações para idosos com DRC
Apesar da restrição proteica, os especialistas orientam que a ingestão energética seja mantida numa faixa de segurança, no mínimo 20 a 25 kcal/dia, podendo chegar a até 35 kcal/dia.
Quando a ingestão energética é insuficiente e as metas nutricionais não estão sendo alcançadas, os suplementos nutricionais orais (SNO) podem ser considerados. Neste sentido, os suplementos ricos em calorias e baixos em proteína devem ser priorizados.
Por fim, a terapia nutricional enteral ou parenteral só deve ser considerada quando a ingestão oral falhar em atingir as metas nutricionais.
Conclusão
Diante dos conflitos anteriores entre as diretrizes de nefrologia e geriatria, o atual documento trouxe esclarecimentos sobre a ingestão proteica em idosos com doença renal crônica.
Para aqueles com doença progressiva e estado nutricional mais estável, essa estratégia é muito bem-vinda. Por outro lado, quando a DRC é estável e de progressão lenta, mas há comprometimento nutricional/funcional, a ingestão proteica deve permanecer normal.
De todo modo, o cuidado personalizado e centrado no paciente é crucial para a tomada das decisões nutricionais, a fim de minimizar os sintomas e melhorar a qualidade de vida.
Para ler a diretriz completa, clique aqui.
Leia também:
- Diretriz ESPEN – Nutrição e hidratação do idoso
- Relação entre hipofunção oral, ingestão de proteínas e prevenção de sarcopenia em idosos
Referência:
Piccoli GB, Cederholm T, Avesani CM, Bakker SJL, Bellizzi V, Cuerda C, Cupisti A, Sabatino A, Schneider S, Torreggiani M, Fouque D, Carrero JJ, Barazzoni R. Nutritional status and the risk of malnutrition in older adults with chronic kidney disease – implications for low protein intake and nutritional care: A critical review endorsed by ERN-ERA and ESPEN. Clin Nutr. 2023 Feb 2;42(4):443-457.