Na maioria dos casos, a gravidez e o parto ocorrem sem intercorrências, com desfechos bem-sucedidos. Contudo, esse período pode ser dificultado para algumas mulheres que apresentam doenças prévias, ou até mesmo patologias específicas do período gestacional, tal como a hipertensão.
As Síndromes Hipertensivas da Gravidez (SHG) estão entre as principais causas de morbimortalidade materna em diversos países, sendo a principal causa de morte materna por causas diretas no Brasil e a terceira mundialmente.
Isso ocorre, pois as SHG podem ocasionar diversas complicações clínicas e obstétricas, destacando-se: comprometimento da função renal, encefalopatia hipertensiva, falência cardíaca, deslocamento prematuro de placenta, hemorragia retiniana, coagulopatias, restrição de crescimento intrauterino, sofrimento fetal, baixo peso, prematuridade e morte fetal.
No Brasil, a prevalência de mulheres em idade reprodutiva com SHG é bastante significativa, atingindo uma média de 9.7% em mulheres de 18 a 24 anos, 15.4% na faixa de 25 a 34 anos, e 21% naqueles com 35 a 44 anos.
Hipertensão gestacional: definição e classificação
Segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia, a hipertensão na gestação é definida como a presença de PAS ≥ 140 mmHg e/ou PAD ≥ 90 mmHg. Já a hipertensão grave ocorre quando PAS ≥ 160 mmhg e PAD ≥ 110 mmHg, e está associada ao aumento do risco de AVC.
A classificação dos estados hipertensivos na gestação estão descritos abaixo, com base no “American College of Obstetricians and Gynecologists” (ACOG), e apoiada pela Sociedade Brasileira de Cardiologia e pelo Ministério da Saúde.
1. Pré-eclâmpsia ou eclâmpsia
A pré-eclâmpsia (PE) é definida pela presença de HA após a 20ª semana, associada a proteinúria significativa (> 0,3 g/24 h).
Na ausência de proteinúria, o diagnóstico pode ser baseado na presença de cefaleia, turvação visual, dor abdominal, plaquetopenia (< 100.000/mm³), elevação de transaminases hepáticas (> 40 UI/L), lesão renal aguda (creatinina ≥ 1 mg/dl), edema pulmonar, distúrbios visuais ou cerebrais, e escotomas.
Já a eclâmpsia é definida como a presença de convulsões ou coma em uma gestante com PE. As convulsões podem ocorrer antes, durante e após o início do trabalho de parto. Assim, a eclâmpsia é um estado mais grave e avançado da pré-eclâmpsia.
2. Hipertensão Crônica
A hipertensão crônica se dá quando a gestante já possuía hipertensão pré-existente (PA ≥ 140 x 90 mmHg) em um período precedente à gestação, ou ainda se essa hipertensão é diagnosticada antes da 20ª semana.
3. Hipertensão crônica com pré-eclâmpsia sobreposta
Caso a gestante possua hipertensão crônica e pré-eclâmpsia simultaneamente, é neste estado de classificação que ela se encontra.
4. Hipertensão gestacional
É uma hipertensão “nova” que surge após a 20ª semana de gestação, sem anormalidades bioquímicas ou hematológicas. O diagnóstico é feito quando a pressão arterial aumenta >140/90 mm Hg pela primeira vez, mas a proteinúria não é identificada. Cerca de ¼ das mulheres com hipertensão gestacional evolui para pré-eclâmpsia e apresenta desfechos desfavoráveis. Em geral, se resolve dentro das 6 semanas pós-parto.
Fatores de risco para hipertensão na gravidez
Estudos apontam que a maioria dos casos de hipertensão gestacional ocorre nos extremos do ciclo reprodutivo da mulher, ou seja, abaixo de 18 anos e acima de 40 anos. Em relação à raça, as mulheres negras são as mais atingidas.
Além disso, mulheres sem parceiros e com baixa escolaridade também estão mais propensas a desenvolverem hipertensão gestacional. Algumas das possíveis explicações são: a dificuldade na troca de informações entre a gestante e o profissional de saúde, a baixa aceitação de condutas de controle de agravos e ações preventivas, estresse, condições nutricionais deficientes, e a desigualdade na assistência pré-natal.
Em relação às condições de saúde, a obesidade, a Hipertensão Arterial Sistêmica prévia, a Diabetes Mellitus e a doença renal são alguns dos fatores de risco causadores da hipertensão gestacional.
Recomendações para hipertensão gestacional
A identificação de fatores de risco para as SHG durante o pré-natal é primordial, de modo diagnosticar precocemente os sinais e sintomas e direcionar as abordagens para o tratamento, controle e prevenção do agravamento da doença, visando a redução da mortalidade materna e perinatal. A frequência de visitas deve ser aumentada em mulheres com suspeita da enfermidade.
Para o manejo da hipertensão gestacional, a Sociedade Brasileira de Cardiologia faz as seguintes recomendações:
- Controle rigoroso da pressão arterial materna;
- Monitorização do crescimento fetal;
- Avaliação repetida na presunção de ocorrência da pré-eclâmpsia e outras complicações;
- Exercícios físicos pelo menos 3 dias por semana, em uma média de 50 min por sessão, incluindo atividades aeróbicas, de força e flexibilidade;
- Dieta saudável, rica em nutrientes, proteínas, fibras e cereais. O auxílio de nutricionista é fundamental;
- Suplementação de cálcio de 1,5 a 2 g diários;
- Ganho de peso adequado, de acordo com o IMC antes da gestação: 11.2 a 15.9 kg para eutróficas, 6.8 a 11.2 kg para mulheres com sobrepeso, e 6.8 kg para mulheres obesas;
- Tratamento farmacológico com agentes de primeira linha.
Para a prevenção de pré-eclâmpsia, recomenda-se:
- Reposição de cálcio (1,5 a 2 g/dia) em pacientes com ingestão abaixo de 600 mg/dia;
- Uso de ácido acetilsalicílico em gestantes de risco moderado a alto deve ser iniciado entre a 12ª e a 16ª semana de gestação.
A hipertensão costuma melhorar nos primeiros cinco a sete dias após o parto. Contudo, após esse período podem ocorrer complicações, inclusive pré-eclâmpsia/eclâmpsia. Assim, devem ser priorizadas as medicações anti-hipertensivas liberadas para o aleitamento.
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Referências
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