A Terapia Nutricional (TN) faz parte dos cuidados essenciais nos pacientes críticos. Recentemente, a Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral (BRASPEN) revisou sua diretriz sobre terapia nutricional no paciente grave.
A partir de uma extensa revisão da literatura científica, os especialistas BRASPEN elaboraram 56 questões de relevância clínica sobre a temática. Assim, o objetivo é orientar profissionais de saúde na tomada de decisões.
Confira a seguir as principais recomendações presentes nesta diretriz.
Paciente grave: triagem e avaliação nutricional
Primeiramente, os profissionais recomendam a realização da triagem nutricional em até 48 horas após a admissão hospitalar (de preferência nas primeiras 24 horas), a fim de identificar desnutrição e dar início à terapia nutricional precoce e individualizada.
As ferramentas recomendadas para triagem nutricional são a Nutrition Risk in Critically Ill (NUTRIC) ou a NRS-2002.
Posteriormente, a avaliação nutricional deve ser realizada durante as primeiras 48h de admissão na UTI, devendo ser repetida a cada 7 a 10 dias. Neste sentido, os métodos recomendados são os Critérios GLIM, método AND-ASPEN ou Avaliação Subjetiva Global (ASG).
Necessidades nutricionais do paciente grave
A calorimetria indireta (CI) é a via indicada para estimar o gasto energético de repouso (GER), a fim planejar a oferta energética em pacientes críticos. Deste modo, deve-se ofertar 50 a 70% do GER na fase inicial, e progredir para 100% do GER após o 4º dia.
Caso a calorimetria indireta não esteja disponível, recomenda-se a oferta energética inicial de 15 a 20 kcal/kg. Esse valor deve progredir para 25 a 30 kcal/kg entre o 4º e o 7º dia, nos pacientes que já se encontram na fase pós aguda/recuperação.
Em relação às proteínas, os profissionais esclarecem que ainda é incerto qual é a oferta ótima. Porém, à luz das atuais evidências, o paciente grave deve receber 1.2 g/kg/dia na fase inicial da doença. Após o 4º dia na UTI, recomenda-se um aporte entre 1.3 a 2 g/kg/dia.
Terapia Nutricional Enteral (TNE) no paciente grave
A diretriz sugere a terapia nutricional enteral como via preferencial em pacientes críticos, em contrapartida à nutrição parenteral.
O início precoce (24 a 48 horas) da TNE está indicado, apresentando diversos benefícios, por exemplo: minimização do catabolismo, manutenção da função de barreira, atenuação do estresse oxidativo e das respostas inflamatórias.
Em relação ao posicionamento da TNE, a administração em posição gástrica é a abordagem padrão, seja orogástrica ou nasogástrica. Entretanto, o posicionamento pós pilórico (principalmente jejunal) deve ser considerado nos seguintes casos:
- Alto risco de aspiração;
- Intolerância à dieta não resolvida com procinéticos;
- Via gástrica contraindicada.
Sobre a fórmula enteral, a BRASPEN não recomenda a suplementação rotineira de glutamina, nem formulações imunomoduladores em pacientes graves.
Terapia Nutricional Parenteral (TNP) no paciente grave
A Nutrição Parenteral Suplementar (NPS) pode ser utilizada após 7 a 10 dias, nos pacientes que não tenham condições de atingir acima de 60% das metas calórico proteicas.
Em casos de impossibilidade de uso do TGI, somado ao alto risco de desnutrição (ou desnutrição já instalada), a nutrição parenteral é então indicada.
Em relação à nutrição parenteral pronta para uso ou manipulada, ambas as estratégias são vistas como alternativas viáveis. Isso irá depender do contexto individual de cada paciente.
Em seguida, os especialistas não recomendam emulsões lipídicas baseadas exclusivamente em óleo de soja. Além disso, o uso de glutamina está contraindicado em casos de:
- Fase aguda da doença grave;
- Disfunção orgânica múltipla;
- Disfunção renal;
- Disfunção hepática;
- Instabilidade hemodinâmica;
- Doses acima de 0.5 g/kg/d.
Paciente obeso grave
A terapia nutricional para o paciente obeso grave possui algumas especificidades.
Por exemplo, na avaliação nutricional, além dos parâmetros habituais, marcadores de síndrome metabólica precisam ser aferidos. São eles: glicemia, triglicerídeos, colesterol total e frações, circunferência abdominal, e presença de hipertensão arterial.
Nestes pacientes, a terapia nutricional hipocalórica e hiperproteica parece ser a estratégia mais adequada, com objetivo de preservar massa magra. A meta calórica não deve ultrapassar 60 a 70% do alvo, medido por calorimetria indireta. Contudo, caso a CI não esteja disponível, indica-se:
- IMC entre 30 a 50 kg/m²: 11 a 14 kcal/kg/dia do peso real;
- IMC > 50 kg/m²: 22 a 25 kcal/kg/dia do peso ideal.
A oferta protéica nestes indivíduos também irá depender do IMC, sendo:
- IMC entre 30 a 50 kg/m²: 2 g/kg/dia do peso ideal;
- IMC > 40 kg/m²: até 2.5 g/kg/dia do peso ideal.
Outras recomendações
Outras recomendações presentes na diretrizes dizem respeito a pacientes graves em condições específicas, como disfunção pulmonar, disfunção renal, pancreatite, cirúrgicos, de trauma ou queimados.
Ademais, os especialistas BRASPEN reiteram que, apesar das recomendações serem baseadas em evidências, as decisões clínicas e circunstâncias individuais de cada paciente são soberanas para a tomada de decisões.
Clique aqui para ler a diretriz completa.
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Referência
Castro MG et al. Diretriz BRASPEN de Terapia Nutricional no Paciente Grave. Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral. BRASPEN Journal, 2023.