A hidratação correta ocupa um lugar central em diversas diretrizes dietéticas. De fato, a água é crucial para inúmeras funções corporais, incluindo digestão, circulação de nutrientes e metabolismo.
Dentre os principais componentes reguladores da homeostase de fluidos e eletrólitos, estão a sede e a liberação de vasopressina arginina (AVP).
Embora a maioria das pessoas não enfrente desidratação severa, muitas experimentam desidratação leve com frequência. Essas pessoas raramente estão cientes da desidratação leve, pois a sede, o único sintoma facilmente reconhecido, não é percebida até que 1–2% do peso corporal seja perdido.
Por razões desconhecidas, alguns indivíduos consomem pouca água a cada dia, e possuem um sinal de sede mais fraco em comparação àqueles que consomem mais. Uma revisão científica teve como objetivo revisar as características deste grupo de pessoas, além de descrever como o baixo nível de hidratação corporal pode aumentar o risco de doenças.
Confira a seguir.
Diferenças no consumo de água: bebedores de baixo vs alto volume
As pesquisas indicam dois perfis bem delimitados de indivíduos quanto ao consumo de água: os “bebedores habituais de baixo volume” (LOW) e os “bebedores habituais de alto volume” (HIGH). Geralmente, a diferença entre estes grupos no consumo total de água diário é de 1,2 litros.
Uma explicação simples para esse fenômeno envolve a sensação de sede e a motivação para beber. Estudos relatam uma sensação de sede no grupo LOW cerca de 66 a 77% do correspondente aos indivíduos do grupo HIGH.
Estudos observacionais e intervenções controladas mostraram que indivíduos que consomem menos água (LOW) apresentam urina mais concentrada e em menor volume, embora seus níveis sanguíneos (por exemplo, osmolalidade plasmática, sódio plasmático) permaneçam normais.
Além disso, pessoas do grupo LOW geralmente possuem maiores concentrações de arginina vasopressina plasmática (AVP) e cortisol. Como veremos adiante, essas condições podem contribuir para o aumento do risco de doenças.
Baixa hidratação contribui para o risco de doenças
É amplamente conhecido que a baixa hidratação contribui para as doenças renais, como cálculos renais e infecções do trato urinário. Quando a ingestão de água é insuficiente, o corpo não consegue eliminar adequadamente as toxinas, o que pode levar à formação de pedras nos rins e a complicações sérias.
Entretanto, os distúrbios renais não são a única consequência deste cenário.
A elevação da concentração plasmática de AVP participa da resposta do corpo ao estresse, estimulando a liberação do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH). O ACTH, por sua vez, estimula o córtex adrenal a produzir cortisol, um hormônio glicocorticoide amplamente reconhecido como um biomarcador de estresse plasmático.
O cortisol pode influenciar diretamente a água corporal e a concentração extracelular aumentando o volume urinário, a excreção de sódio urinário e a excreção de potássio; esses efeitos podem resultar em um balanço hídrico corporal negativo.
O aumento do cortisol está associado a várias condições de saúde, como a síndrome de Cushing, resistência à insulina, doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2, síndrome metabólica e subtipos de depressão.
Com relação à doença cardiovascular, evidências sugerem que o AVP tem efeitos pró-aterogênicos (por exemplo, encoraja a agregação plaquetária e a formação de placas de gordura nas artérias).
Em relação ao diabetes tipo 2, o AVP pode estimular diretamente o metabolismo, incluindo a produção de glicose hepática ou a liberação de insulina pelo pâncreas, e pode afetar negativamente as respostas do corpo à insulina.
O envelhecimento prematuro também pode ser acelerado pela exposição crônica ao cortisol, devido à degeneração de neurônios do hipocampo.
Recomendações nutricionais para indivíduos “LOW”
Para diminuir a concentração de AVP e cortisol, algumas estratégias para aumentar a ingestão de água em pessoas que têm dificuldade em se hidratar adequadamente incluem:
Selecionar alimentos sólidos com alto teor de água
Selecionar sopas, frutas, vegetais e outros alimentos ricos em água pode aumentar o consumo de água em mais de 1 litro por dia. Essa abordagem também incentiva uma mudança na ingestão de nutrientes em direção a uma dieta saudável à base de plantas que reduz o risco de doenças cardiovasculares.
Ações para aumentar a ingestão de água
Para indivíduos LOW, recomenda-se uma ingestão total diária de água de no mínimo 1,8 L. Para isso, algumas estratégias podem ser incluídas:
- Estar sempre com garrafas de água disponíveis. Reabastecer a garrafa assim que seu conteúdo acabar.
- Desenvolver o hábito de beber um copo de água quando acordar, antes de cada refeição, depois de visitar o banheiro ou quando estiver esperando por alguém ou por um evento.
- Baixar um aplicativo de acompanhamento de água online ou manter um diário/lista de verificação em papel para registrar o número de copos consumidos.
- Definir uma meta pessoal de ingestão de água para cada período do dia.
Autoavaliação do estado de hidratação
Idealmente, o estado de hidratação deve ser autoavaliado com base na cor da urina, mas outros sinais devem ser observados: boca seca, fadiga, dor de cabeça, tontura, fraqueza e diminuição da elasticidade da pele.
A cor da urina pode variar de claro e pálido (hidratado) a âmbar e escuro (desidratado). Para pacientes em LOW, recomenda-se que a urina seja clara ou pálida.
O que podemos concluir?
Como visto, a hidratação adequada é vital para a saúde e o bem-estar. Indivíduos que não ingerem água suficiente estão em risco não apenas de distúrbios renais, mas também de uma série de condições de saúde associadas ao estresse e ao aumento da vasopressina e cortisol.
Para melhorar a hidratação, é fundamental adotar estratégias que incentivem o aumento da ingestão de líquidos e o consumo de alimentos ricos em água. Promover a conscientização sobre a importância da hidratação é essencial para reduzir os riscos de doenças e melhorar a qualidade de vida.
Se você gostou deste conteúdo, leia também:
- Tabela de recomendações de água e eletrólitos
- Diretriz ESPEN sobre nutrição e hidratação em demências
- Diretriz ESPEN – Nutrição e hidratação do idoso
Referência:
Armstrong LE, Muñoz CX, Armstrong EM. Distinguishing Low and High Water Consumers-A Paradigm of Disease Risk. Nutrients. 2020 Mar 23;12(3):858. doi: 10.3390/nu12030858. PMID: 32210168; PMCID: PMC7146321.
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