Qual a relação entre estresse, cortisol e obesidade?

Postado em 1 de agosto de 2022 | Autor: Redação Nutritotal

A obesidade é uma epidemia global. Muitos fatores estão envolvidos no seu desenvolvimento, e a elevação do cortisol causado pelo estresse pode ser um deles. Neste artigo, você vai entender minuciosamente como se dá a relação entre o estresse crônico, o hormônio cortisol, e o ganho de peso acarretando na obesidade.

Qual a relação entre estresse cortisol e obesidade

Foto: Shutterstock.com

Cortisol, o hormônio do estresse

O “estresse” é definido como qualquer estímulo endógeno ou exógeno que ameaça a homeostase interna do organismo humano. Sabemos que o estilo de vida ocidental em que muitas pessoas estão inseridas é reconhecido por aumentar a exposição ao estresse crônico. Essa exposição é ainda potencializada por fatores como alimentação inadequada (rica em açúcares e gorduras), ingestão de álcool e privação de sono.

E como o corpo humano reage biologicamente a todo esse estresse? A resposta é simples: basicamente, através do estímulo ao eixo hipotálamo-hipófise (HPA), que estimula o hormônio adrenocorticotrófico (ACTH), levando à secreção de cortisol no córtex das glândulas adrenais.

Esse aumento do cortisol, o glicocorticóide conhecido como “hormônio do estresse”, deve diminuir após o enfrentamento bem-sucedido de um evento estressante. No entanto, estudos sugerem que indivíduos com obesidade podem responder de forma diferente.

Entenda como isso funciona.

Estresse: causa ou consequência da obesidade?

As alterações nos níveis basais de cortisol da população com excesso de peso nos leva a questionar: o estresse crônico é a causa ou a consequência da obesidade? À luz da literatura científica atual, as duas respostas podem estar corretas; confira a seguir.

O estresse leva à obesidade

Em primeiro lugar, altos níveis de estresse no dia-a-dia podem causar elevações na produção de cortisol. Este hormônio, por sua vez, leva ao aumento do consumo de alimentos com alta densidade energética, ricos em açúcar e gordura, regido por adaptações neuroendócrinas e que favorecem o ganho de peso.

De fato, em um estudo com 72 participantes (36 com obesidade e 36 no grupo controle), pessoas obesas com maior resposta biológica ao estresse (ou seja, que apresentaram aumento no cortisol) tinham ingestão alimentar significativamente maior após situações de estresse. Porém, isso não acontecia com os participantes de peso normal.

O motivo para o estresse levar a estas alterações no consumo pode ser a alteração de sinais do eixo HPA para o cérebro, resultando em falhas nos processos regulatórios do balanço energético e do comportamento alimentar.

Além disso, existe uma complexa interação em que os glicocorticóides, como o cortisol, afetam o peso corporal. O cortisol possui função de regulação endócrina (como controle da sensibilidade à insulina), metabólica e de diferenciação de adipócitos, contribuindo para o processo de adipogênese e aumento da gordura visceral. Ainda, pesquisas atuais indicam possíveis interações entre o cortisol e os hormônios reguladores do apetite (NPY, leptina e grelina).

A obesidade também leva ao estresse

Enquanto o estresse promove a obesidade, o caminho inverso também é verdadeiro. O aumento de peso e, sobretudo, de gordura visceral, aumenta a síntese e liberação de citocinas inflamatórias, como TNF-α e IL-6, aumentando a inflamação crônica e o estresse oxidativo que, por sua vez, estimulam o eixo HPA e favorecem o aumento da secreção de cortisol.

Além disso, o estresse provocado pelo estigma social do excesso de peso, a longo prazo, também estaria relacionado ao desequilíbrio do eixo HPA, e ao aumento dos níveis de cortisol. Deste modo, cria-se um looping, em que a obesidade leva ao estresse, e este estresse leva a mais obesidade, como exposto anteriormente.

Alguns estudos defendem que os indivíduos obesos que mais sofrem com o aumento do cortisol são aqueles com maior viés de peso internalizado, ou seja, mais afetados psicologicamente pela discriminação e preconceito. No entanto, uma outra pesquisa concluiu o contrário, sendo que participantes com alto estigma apresentavam baixos níveis do hormônio.

Uma possível explicação seria que a ativação frequente do eixo HPA acabaria acarretando em uma resposta biológica prejudicada, traduzindo-se em desfechos de saúde que afetam o funcionamento cardiovascular, metabólico, imunológico, bem como o funcionamento do sistema nervoso central.

Outros desfechos do estresse atrelado à obesidade

Além da influência sobre a ingestão de alimentos, o aumento crônico da secreção de cortisol aumenta o risco de resistência à insulina, síndrome metabólica e doença cardiovascular.

Evidências sugerem que o cortisol está envolvido com o metabolismo do zinco, sendo que o seu aumento reduziria os níveis plasmáticos deste micronutriente importante para secreção de insulina. Além disso, a inibição de uma enzima responsável pela ativação do cortisol (11b-dehydrogenase) estaria relacionada a melhora da sensibilidade à insulina. O cortisol também afeta a glicemia, por inibir a translocação do GLUT-4 para a membrana plasmática.

O tratamento da obesidade deve ser multifatorial

Como visto, a variação de peso está altamente sujeita a fatores ambientais estressores, tal como o estigma em relação à obesidade e o preconceito diário vivido por essa população. Sendo assim, estratégias de intervenção devem ser amplas, levando em conta não somente a melhora da dieta e a diminuição do peso, como também a redução do consumo de álcool, a melhora da qualidade do sono, o controle da inflamação, combinados ao tratamento psicológico e o combate social à gordofobia.

Em relação ao cortisol, a literatura sugere que o uso de medicamentos que controlam seus níveis plasmáticos também seria um caminho adequado para reduzir seus riscos cardiometabólicos e evitar outros desfechos de saúde, além do ganho de peso ainda mais expressivo nos pacientes obesos que apresentam altos níveis deste hormônio.

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Referências

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