A desnutrição é uma preocupação comum em pacientes idosos. Para preveni-la ou tratá-la, a maioria das diretrizes estabelece o consumo de proteínas como uma prioridade. Mas qual proteína, vegetal ou animal?
Embora as proteínas animais tenham um maior efeito anabólico que a vegetal, seu consumo excessivo pode aumentar o risco de doenças cardiovasculares e outras morbidades.
Sendo assim, um recente estudo científico buscou esclarecer o papel das fontes proteicas na desnutrição, a fim de definir qual delas geraria os melhores impactos no estado nutricional de idosos. Confira os detalhes a seguir.
Aplicação dos critérios GLIM
A pesquisa em questão reuniu dados de 2.965 participantes entre 62 a 92 anos, utilizando dados das coortes espanholas Seniors-ENRICA 1 e Seniors-ENRICA 2.
A investigação do consumo proteico foi pautada em um histórico alimentar validado, em que os pacientes relataram até 860 alimentos e receitas habitualmente consumidos durante o ano anterior. Além disso, aplicou-se mais 7 recordatórios de 24 horas ao longo de um ano.
De acordo com a origem, os alimentos foram classificados em:
- Proteínas de origem vegetal: cereais, legumes, nozes e outros
- Proteínas de origem animal: laticínios, carnes, ovos, peixes e outros
Em seguida, a avaliação da desnutrição orientou-se com base nos critérios fenotípicos GLIM, no início do estudo e após 2,6 anos.
As probabilidades de melhorias no estado nutricional foram avaliadas com modelos de regressão logística, extensivamente ajustados para fatores de confusão. Nesse sentido, os autores classificaram os participantes nos seguintes grupos:
- Melhoria do estado nutricional: desnutrição moderada 🡪 sem desnutrição; ou desnutrição grave 🡪 desnutrição moderada/nenhuma desnutrição;
- Sem alteração/agravamento do estado nutricional: ausência de desnutrição 🡪 desnutrição moderada/grave; ou desnutrição moderada 🡪 desnutrição grave.
Proteína vegetal trouxe melhora do estado nutricional
Após uma análise minuciosa dos dados obtidos, os pesquisadores fizeram uma descoberta surpreendente: uma maior ingestão proteica, seja de proteína vegetal ou animal, se associou a melhorias do estado nutricional em idosos. Entretanto, as proteínas vegetais parecem ser as maiores responsáveis por este feito.
Embora apenas 34% das proteínas serem provenientes de fontes vegetais, estas apresentaram a maior associação com a melhora no estado nutricional. Mais especificamente, as razões de probabilidade totalmente ajustadas por 0,25 g/kg/dia foram de 1,77 para proteínas vegetais, e 1,15 para proteínas animais.
Ao se tratar dos tipos de alimentos, os ovos apresentaram a maior razão de probabilidade, com 2,85. Em seguida, estavam os cereais (2,07), as leguminosas (1,75), os laticínios (1,28), a carne (1,08), o peixe (1,08), e, por fim, as nozes (0,94).
Além disso, os autores descobriram que a substituição de 0,25 g/kg/dia de proteína animal total, carne ou peixe por proteína vegetal se associou a melhorias no estado nutricional. Entretanto, essa relação não foi verdadeira para as proteínas do ovo ou leite.
Uma possível explicação para a “superioridade” das proteínas vegetais na pesquisa em questão envolve a saúde oral. Entre idosos, a perda dentária e as reduções na capacidade mastigatória e na massa muscular mastigatória podem prejudicar a degradação das proteínas de fontes alimentares mais rígidas, como as carnes (e também as nozes).
Qual é a diferença entre proteína animal e proteína vegetal?
É amplamente propagado que as proteínas animais possuem uma maior qualidade do que as proteínas vegetais, por conta do maior teor de aminoácidos essenciais e digestibilidade. Além disso, as proteínas vegetais contam com antinutrientes que interferem na sua utilização.
No entanto, existe uma preocupação crescente sobre as metodologias utilizadas para calcular o valor biológico das proteínas, pois sugere-se que os dados possam ser tendenciosos para as proteínas animais.
Em primeiro lugar, quando o consumo proteico está acima das recomendações, a oferta de aminoácidos essenciais pode ser facilmente suprida pelo reino vegetal, garantido pela combinação de alimentos com diferentes aminoácidos limitantes.
Em relação à digestibilidade, dados científicos recentes mostraram uma diferença pequena entre a proteína animal ou vegetal. Por exemplo, as farinhas de ervilha, trigo e tremoço tinham 89-92% de digestibilidade, em comparação a 90-95% para ovos, carne e proteínas do leite.
Ademais, os cálculos de valor biológico frequentemente se baseiam em alimentos crus. Enquanto isso, a maioria das proteínas vegetais são submetidas ao aquecimento e/ou processamento, que removem os antinutrientes e facilitam a digestibilidade.
Por fim, vale ressaltar que os próprios antinutrientes das proteínas vegetais podem beneficiar fatores de risco de condições de saúde preditivas da desnutrição, como doenças cardiovasculares, câncer e infecções microbianas.
Tomadas em conjunto, essas informações podem explicar a associação entre o consumo de proteínas vegetais e a melhora no estado nutricional em idosos, apesar do imaginário de que as proteínas vegetais são de baixa qualidade.
Conclusão
Em resumo, o consumo de proteínas animais e vegetais, principalmente vegetais, se associou à uma melhoria no estado nutricional de idosos. Sendo assim, a pesquisa demonstra o potencial da proteína vegetal no tratamento da desnutrição.
Segundo os autores, favorecer as proteínas vegetais poderia beneficiar não só o estado nutricional, como também a microbiota intestinal, biomarcadores inflamatórios e o risco de mortalidade por todas as causas. Além disso, tal estratégia torna as dietas mais acessíveis e ambientalmente sustentáveis.
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Referência:
Carballo-Casla, A., Sotos-Prieto, M., García-Esquinas, E., Struijk, E. A., Caballero, F. F., Calderón-Larrañaga, A., … & Ortolá, R. (2023). Animal and vegetable protein intake and malnutrition in older adults: a multicohort study. The Journal of nutrition, health and aging, 100002.
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