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Como deve ser a alimentação para quem tem autismo?

alimentação para quem tem autismo

Fonte: Canva.com

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) caracteriza-se pelo comprometimento das habilidades sociais e comportamentais, além de sintomas gastrointestinais, intolerâncias alimentares e deficiências nutricionais. Sabendo destas questões, como deve ser a alimentação para quem tem autismo? 

alimentação para quem tem autismo

Fonte: Canva.com

Diversas estratégias de intervenção nutricional para TEA já foram propostas pela ciência. Neste artigo, iremos conhecer as principais delas, bem como as melhorias nos sintomas de autismo que elas são capazes de promover.

Alimentação natural para quem tem autismo

O consumo de alimentos naturais vem sendo relatado como eficaz na prevenção e manejo do autismo.

As atuais abordagens dietéticas recomendam evitar ou eliminar os agentes possivelmente causadores de TEA, tais como aditivos alimentares (conservantes, corantes, adoçantes artificiais), pesticidas, organismos geneticamente modificados, e alto consumo de açúcar e alimentos refinados.

Estes devem ser substituídos, na medida do possível, por uma dieta orgânica, sem aditivos químicos, e com alto consumo de alimentos frescos e in natura (vegetais, frutas, nozes, sementes, proteínas animais, etc).

Para seguir esse padrão alimentar, recomenda-se a adoção dos 10 passos para uma alimentação adequada e saudável, apresentados pelo Guia Alimentar da População Brasileira.

Entretanto, é válido destacar que pacientes com autismo frequentemente apresentam seletividade alimentar, com preferência por alimentos ultraprocessados e bebidas açucaradas. Por isso, recomenda-se mudanças graduais, e aplicação de estratégias de educação alimentar e nutricional para o portador de TEA e sua família.

Consumo de prebióticos e probióticos

Uma quantidade crescente de evidências propõem que a microbiota intestinal influencia o desenvolvimento e o funcionamento normal do sistema nervoso, através do eixo intestino-cérebro. A disbiose, comum no paciente com autismo, pode facilitar o aparecimento de sintomas gastrointestinais e comportamentais. 

Desse modo, várias pesquisas apontam o consumo de prebióticos e probióticos como uma estratégia poderosa para o manejo do TEA. Particularmente, os probióticos podem ajudar a:

  • Restaurar o equilíbrio microbiano;
  • Tratar a inflamação intestinal;
  • Estimular a imunidade da mucosa, 
  • Atenuar os sintomas gastrointestinais, como constipação, diarreia e dor abdominal;
  • Melhorar o comportamento social.

Além da suplementação, o consumo de probióticos também pode advir da alimentação.

No entanto, segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), evidências mais sólidas ainda são necessárias para compreender o papel dos probióticos na disbiose intestinal de indivíduos com autismo.

Atenção aos micronutrientes

Sugere-se que a deficiência simultânea de várias vitaminas podem ser uma das causas da disbiose intestinal no autismo. Ao mesmo tempo, o desequilíbrio microbiano pode diminuir os níveis de produção de vitaminas no intestino.

Sendo assim, em indivíduos com TEA, deficiências de vitaminas e minerais são comuns. Particularmente, já foram relatados baixos níveis séricos de vitaminas D, B6, B12 e folato. A seletividade alimentar e neofobia alimentar, comuns neste público, podem ser agravantes para tais deficiências.

Além disso, observou-se que a vitamina C desempenha um papel vital no desenvolvimento do cérebro, maturação funcional e possui ação antioxidante. Assim, sua deficiência pode levar ao agravamento dos sintomas do autismo.

Nesse sentido, estudos sugerem a suplementação de micronutrientes como uma estratégia promissora. Em pesquisas anteriores, notou-se que a suplementação de ácido fólico resultou uma melhora na comunicação verbal, enquanto o aumento dos níveis de vitamina C gerou uma redução significativa do estresse oxidativo.

Na prática clínica, é imprescindível realizar o monitoramento laboratorial de micronutrientes nos pacientes com TEA. Em caso de deficiências, a alimentação e a suplementação, como estratégia complementar, devem corrigi-las.

Dietas sem glúten e sem caseína (SGSC)

A eliminação conjunta de glúten (proteína encontrada em grãos como trigo, centeio e cevada) e caseína (proteína encontrada no leite e produtos lácteos) vêm sendo recomendada como um tratamento nutricional para pacientes com autismo.

Em suma, sugere-se que a degradação incompleta da caseína e do glúten leva à produção de peptídeos opióides, que desencadeiam inflamação e respostas imunológicas. 

Devido ao intestino permeável no autismo (por conta da disbiose intestinal), tais peptídeos entram na corrente sanguínea e afetam processos no sistema nervoso central. Assim, eles podem acentuar comportamentos estereotipados, atividade excessiva e atrasos na fala.

Em um estudo de coorte randomizado, uma dieta sem glúten, sem caseína e sem soja por 12 meses, com suplementos adicionais, foi eficaz na melhoria do estado nutricional e do quociente de inteligência não verbal na maioria dos indivíduos com TEA.

Contudo, há uma ressalva: tal dieta expõe o paciente a uma restrição alimentar importante, que pode causar prejuízos nutricionais, comprometer seu neurodesenvolvimento e afetar sua socialização.

Portanto, a SBP recomenda: só deve aderir à dietas de exclusão o paciente com diagnóstico clínico de doença celíaca, intolerância ao glúten não celíaca, alergia alimentar ou outro tipo de intolerância ou hipersensibilidade a alimentos.

Dieta cetogênica

A dieta cetogênica é rica em gordura, suficiente em proteínas e pobre em carboidratos, resultando no metabolismo de gordura como fonte primária de combustível.

Sugere-se que ela possa alterar a composição microbiana intestinal, e assim melhorar os sintomas neurológicos do TEA.

Relatos de casos demonstraram aumento no quociente de inteligência, melhora das funções cognitivas e de linguagem, melhoria nas habilidades sociais, diminuição na frequência de convulsões, melhorias perceptíveis na aprendizagem, comportamento social, fala, cooperação, hiperatividade, contato visual e foco.

Apesar dos resultados animadores, estudos que correlacionam autismo e dieta cetogênica possuem diversas limitações, incluindo maior risco de inflamação e disfunção mitocondrial, efeitos adversos da constipação, refluxo e outras comorbidades. Por isso, mais pesquisas ainda são necessárias para testar a dieta cetogênica no tratamento do autismo.

Por fim, essa dieta também conta com os mesmos riscos de restrição alimentar que a dieta SGSC. 

Dieta de carboidratos específicos (SCD)

Alguns estudos apontam que o autismo poderia estar ligado à má digestão de carboidratos complexos, levando à reprodução de micróbios patogênicos e à produção do ácido d-láctico (um subproduto da fermentação bacteriana). 

Sendo assim, a dieta de carboidratos específicos visa reduzir os sintomas desta má absorção, bem como inibir o crescimento de patógenos bacterianos e fúngicos. 

Assim, restringe-se o consumo de amidos como grãos, batatas, laticínios, açúcares e alimentos processados, substituindo-os por carboidratos simples como frutas, vegetais, mel, nozes, carnes, ovos e certas leguminosas.

Estudos indicam seu potencial de melhoria nos sintomas gastrointestinais, estado nutricional e habilidades comportamentais. Contudo, ainda faltam evidências mais concretas.

Cuidado com a restrição alimentar

Apesar dos resultados promissores, estratégias alimentares que incluem suplementação e/ou bruscas modificações na dieta não devem ser adotadas indiscriminadamente no TEA.

Ao adotar intervenções dietéticas, é importante se atentar para o risco de excluir determinados itens alimentares, visto que pacientes com autismo já exibem padrões alimentares seletivos e exigentes. Assim, todo o contexto do paciente deve ser levado em consideração.

Além disso, cabe salientar que não existem curas milagrosas para a doença, muito menos provenientes de alimentos. O que pode haver é uma diminuição nos sintomas. Por isso, tais estratégias devem ser implementadas como um complemento às terapias tradicionais, e não como uma substituição.

Uma abordagem multidisciplinar, envolvendo o trabalho conjunto com outros profissionais de saúde, é essencial para garantir a qualidade de vida dos indivíduos com TEA. 

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Referências:

Araújo LA et al. Transtorno do Espectro do Autismo. Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Departamento Científico de Pediatria do Desenvolvimento e Comportamento

Carvalho MF, Santana MZ. Educação alimentar e nutricional para crianças com transtorno do espectro autista: propostas de atividades práticas na escola, na clínica e em casa. Editora UFPE, 2022.

CEKICI, Hande; SANLIER, Nevin. Current nutritional approaches in managing autism spectrum disorder: A review. Nutritional Neuroscience, v. 22, n. 3, p. 145-155, 2019.

CHERNIKOVA, Michelle A. et al. The Brain-Gut-Microbiome System: Pathways and Implications for Autism Spectrum Disorder. Nutrients, v. 13, n. 12, p. 4497, 2021.

dos Santos, P., Pereira, R., Nérias, S., Almeida, Â., & Coutinho, D. J. G. (2021). Avaliação nutricional em crianças com autismo: revisão bibliográfica. Revista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e Educação, 7(10), 921-949.

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Mehra A, Arora G, Sahni G, Kaur M, Singh H, Singh B, Kaur S. Gut microbiota and Autism Spectrum Disorder: From pathogenesis to potential therapeutic perspectives. J Tradit Complement Med. 2022 Mar 8;13(2):135-149. doi: 10.1016/j.jtcme.2022.03.001. PMID: 36970459; PMCID: PMC10037072.

Transtorno do espectro autista. Organização Pan-Americana de Saúde.

Transtorno do Espectro Autista – TEA (autismo). Biblioteca Virtual em Saúde (Ministério da Saúde).

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