A pandemia de COVID-19 acarretou inúmeras mudanças no dia-a-dia dos indivíduos. Em relação ao estilo de vida, sabe-se que o isolamento social impactou fortemente nos hábitos alimentares da população. Com essa premissa, uma nova pesquisa brasileira buscou investigar as mudanças no comportamento alimentar que ocorreram neste período, e a relação com o estresse, a ansiedade e a depressão. Confira seus achados a seguir.
Foram mais de mil pessoas investigadas
Em primeiro lugar, a pesquisa analisada trata-se de estudo transversal, quantitativo e descritivo, com delineamento amostral não probabilístico por conveniência.
Para a coleta de dados, foi elaborado um questionário online, a partir da plataforma Google Forms. Ao todo, foram 60 questões divididas em três seções:
I – dados socioeconômicos e de estilo de vida;
II – avaliação autorreferida de alterações relacionadas ao consumo alimentar; e
III – avaliação autorreferida de ansiedade, depressão e estresse.
A aplicação deste questionário seguiu-se pelo período de agosto até dezembro de 2020. Foram elegíveis as respostas de 1.004 adultos de 18 a 85 anos, de todas as regiões brasileiras e de ambos sexos biológicos.
Para a análise das modificações do comportamento de consumo alimentar, considerou-se o consumo de grupos alimentares (elaborados a partir de adaptações do Guia Alimentar para a População Brasileira), incluindo: frutas, hortaliças, açúcares, carboidratos, laticínios, carnes e ovos, óleos e gorduras e leguminosas. Fast foods, bebidas alcoólicas, bebidas açucaradas e ingestão de água também foram incluídos.
Na avaliação de sintomas de depressão, ansiedade e estresse, foi usada a escala DASS-21.
Mudanças alimentares na pandemia
Embora a maioria dos participantes tenham declarado que o consumo alimentar permaneceu o mesmo na pandemia, um aumento significativo foi detectado em alguns grupos alimentares, tais como: carboidratos (pão, macarrão, batata e mandioca, de 37.35%), bebidas adoçadas (13,25%), bebidas alcoólicas (23,51%), açúcar adicionado (37,25%) e fast foods (20,42%).
Os autores também destacam a redução ou não consumo de laticínios por homens (23,57%) e mulheres (23,61%). Neste sentido, é necessário ficar alerta, uma vez que os produtos lácteos são excelentes fontes de vitamina D, micronutriente que parece contribuir para a proteção contra a COVID-19 em parâmetros de morbidade e mortalidade (especialmente em idosos).
Em indivíduos com maiores níveis de estresse, ansiedade e depressão, algumas modificações no padrão alimentar foram mais proeminentes: maior consumo de carboidratos na forma de bebidas adoçadas; maior consumo de bebidas alcóolicas, fast-foods e gorduras; menor consumo de frutas, hortaliças, laticínios, carnes e ovos.
Sabe-se que muitas pessoas, ao enfrentar o isolamento social, passaram por períodos de estresse crônico, estresse pós-traumático, solidão, ansiedade e depressão. Os longos períodos de quarentena, distanciamento social, incertezas sobre o futuro e exploração dos direitos trabalhistas, vividos durante as fases mais fortes da pandemia, contribuíram para extrapolar esses sentimentos.
Como consequência, estas condições emocionais podem comprometer o bom funcionamento do sistema neuroendócrino e imunológico, elevando o nível de citocinas pró-inflamatórias. O estresse, por exemplo , aumenta a liberação de cortisol, sendo assim um gatilho para o desejo por carboidratos, especificamente açúcar.
Limitações e conclusão
No artigo científico em questão, algumas limitações foram relatadas pelos autores. Em primeiro lugar, por ter sido realizado em ambiente virtual, a pesquisa teve um viés de seleção importante: a participação apenas de pessoas com acesso à internet. Além disso, a maioria dos participantes (44,0%) possuía pós-graduação completa, demonstrando maior nível de escolaridade e autoconsciência acerca de seus comportamentos alimentares.
Apesar disso, estes achados iniciais são importantes para entender as principais mudanças alimentares durante este período de crise sanitária. Como visto, o aumento no consumo de produtos como açúcares, bebidas alcóolicas e fast-foods em indivíduos mentalmente vulneráveis, serve como um alerta: os profissionais de saúde devem estar preparados para lidar com estas questões, orientando seus pacientes da melhor forma, de modo a retomarem padrões alimentares saudáveis.
Para ler o artigo científico completo, clique aqui.
Leia também:
- Pandemia e bem estar das lactantes
- Fatores que determinam o comportamento alimentar
- Combate a fome em meio a pandemia
Referências
NEGRÃO, Leonardo Dias et al. NuMoOS–COVID-19 Nutrition and Mood Online Survey: Perception about dietary aspects, stress, anxiety, and depression in the social isolation of Coronavirus Disease 2019. Clinical Nutrition ESPEN, 2022.
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