Recentemente, uma pesquisa nacional (Fisberg et al., 2024) envolvendo 1.812 participantes apontou um problema nutricional pouco falado: a inadequação de colina na dieta brasileira.
Nesse sentido, a probabilidade de adequação para este micronutriente foi extremamente baixa, principalmente entre o público mais velho. Da faixa etária dos 31 aos 65 anos, apenas 6% dos participantes consumiam o nutriente de acordo com as recomendações nutricionais.
No artigo de hoje, você irá compreender o que é a colina, quais são suas funções e recomendações nutricionais, quais as causas e consequências da sua deficiência na terceira idade, e como promover seu tratamento. Confira!
Colina: o que é e para que serve?
A colina (vitamina B8) é um micronutriente essencial, que faz parte das vitaminas hidrossolúveis do complexo B.
Este micronutriente está envolvido em uma série de funções na saúde humana, desde o início da vida até o envelhecimento, e que envolvem o funcionamento adequado de órgãos como fígado, músculos e cérebro.
Algumas das funções da colina incluem:
- Síntese de certos fosfolipídios (fosfatidilcolina e esfingomielina), componentes estruturais essenciais das membranas celulares;
- Sinalização celular, pois os fosfolipídios contendo colina são precursores das moléculas mensageiras intracelulares;
- Precursor do neurotransmissor acetilcolina, envolvido no controle muscular, ritmo circadiano, memória e muitas outras funções neuronais;
- Transporte e metabolismo de lipídios, mais especificamente na montagem, secreção e remoção das lipoproteínas de densidade muito baixa (VLDL) do fígado;
- Principal fonte de doadores de metil relevantes para modificações epigenéticas do genoma;
- Desenvolvimento fetal normal;
- Reabsorção de água no túbulo renal.
Colina para idosos: recomendações nutricionais
O ser humano sintetiza colina no fígado em pequenas quantidades. Contudo, essa síntese endógena é insuficiente para atender às necessidades de colina, que deve ser obtida por vias dietéticas.
Atualmente, as recomendações para a ingestão dietética de colina provém de dois órgãos de saúde. A National Academy of Medicine (NAM), antigo Institute of Medicine (IOM), foi a primeira entidade a estabelecer tais recomendações em 1998, baseando-se na quantidade necessária para prevenir danos hepáticos em adultos.
Segundo a NAM, a ingestão adequada (IA) de colina para adultos e idosos é de 435 mg/dia (para mulheres) ou 550 mg/dia (para homens).
Posteriormente, em 2016, a Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA) também estabeleceu a ingestão adequada de colina, com base em dados da população europeia e estudos sobre danos musculares ou hepáticos da falta desta vitamina. Desse modo, a EFSA recomenda a ingestão de colina de 400 mg/dia, independente do sexo.
Deficiência de colina: causas
A inadequação no consumo de colina, como demonstrado pela pesquisa brasileira citada anteriormente, é um fator de risco para a deficiência desta vitamina. Entre os mais velhos, a deficiência de colina pode ser advinda de uma diminuição no consumo de seus alimentos fonte.
De fato, estima-se que 20 a 30% da população idosa sofra de uma redução fisiológica não intencional na ingestão alimentar, com causas que envolvem falta de apetite, declínio do olfato e paladar, prejuízos na saúde bucal, alterações no trato gastrointestinal, e fatores psicossociais.
Além disso, entre as mulheres, foi demonstrado que a menopausa pode aumentar a necessidade de colina exógena e exacerbar a deficiência de colina resultante da sua ingestão inadequada.
Deficiência de colina: consequências
Uma das principais consequências da deficiência de colina é o desenvolvimento da doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA). Isso acontece porque, na falta desta vitamina, a produção de fosfatidilcolina é reduzida, o que resulta na diminuição da remoção das lipoproteínas VLDLs, gerando acúmulo de gordura nos hepatócitos.
Além disso, a reciclagem intra-hepatocítica de triacilglicerois aumenta, agravando ainda mais o acúmulo de gordura no fígado.
A deficiência de colina também afeta a saúde cognitiva, principalmente em idosos, uma vez que a eficiência da utilização de colina pelo cérebro diminui com o avanço da idade.
Quando há pouca colina disponível, os fosfolipídios das membranas neuronais podem sofrer “autocanibalismo”, ou seja, se degradam em um processo semelhante ao que ocorre nas demências e na depressão. Nesse sentido, a doença de Alzheimer pode estar associada à ingestão inadequada de colina.
Por fim, a desregulação das funções relacionadas à colina já foi descrita em várias condições clínicas, incluindo síndrome metabólica, obesidade, disbiose microbiana, doença celíaca, distúrbios neurológicos, doenças musculares inflamatórias, doenças cardiovasculares e renais crônicas.
Como tratar a deficiência de colina na terceira idade?
Para tratar a deficiência de colina em idosos, é fundamental considerar tanto a melhoria da dieta quanto o uso de suplementação.
Em primeiro lugar, a inclusão de alimentos ricos em colina na dieta pode ser uma abordagem eficaz para aumentar a ingestão desse nutriente essencial. São fontes alimentares ricas em colina (a cada 100 g de alimento):
- Fígado bovino: 330 a 430 mg
- Fígado de frango: 290 a 330 mg
- Ovos: 230 a 270 mg
- Salmão defumado: 220 mg
- Gérmen de trigo: 150 a 180 mg
- Soja seca: 120 mg
- Carne de porco: 60 a 110 mg
- Salmão cozido: 91 mg
- Frango assado: 79 mg
- Manteiga de amendoim: 66 mg
- Amêndoas: 52 mg
- Carne bovina: 52 a 110 mg
- Peixe magro: 50 a 200 mg
- Brócolis: 18 a 40 mg
- Alimentos de soja: 14 a 28 mg
Além da alimentação, a suplementação de colina também pode ser uma via, principalmente em idosos com baixa ingestão alimentar. Estudos pré-clínicos e clínicos demonstraram que a colina suplementar tem efeitos benéficos especialmente em termos de função endotelial e desempenho cognitivo.
Por exemplo, uma meta-análise de 14 ensaios clínicos descobriu que a suplementação de vitamina B retardou o declínio cognitivo em idosos cognitivamente saudáveis, conforme medido pela pontuação no Mini Exame do Estado Mental.
Já em um estudo transversal com 2.393 adultos mais velhos (≥60 anos), as ingestões diárias totais de colina (combinadas de dieta e suplementos) entre 187 a 399 mg/dia diminuiu o risco de baixo desempenho cognitivo na capacidade de aprendizagem, fluência verbal categórica, memória de trabalho, velocidade de processamento e atenção sustentada.
O que podemos concluir?
Apesar de seu papel importante na saúde humana, como em funções hepáticas e cerebrais, a ingestão de colina é insuficiente em uma proporção importante da população brasileira, principalmente em adultos mais velhos.
Portanto, a integração de abordagens dietéticas e de suplementação é fundamental para garantir que os idosos recebam a quantidade adequada de colina, promovendo uma melhor qualidade de vida e prevenindo problemas de saúde associados à sua deficiência.
A conscientização sobre a importância da colina e as práticas nutricionais adequadas são passos cruciais para melhorar a saúde da população idosa e garantir seu bem-estar a longo prazo.
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Referências:
Choline. Oregon State University, 2023.
Fisberg M, Duarte Batista L, Previdelli AN, Ferrari G, Fisberg RM. Exploring Diet and Nutrient Insufficiencies across Age Groups: Insights from a Population-Based Study of Brazilian Adults. Nutrients. 2024; 16(5):750. https://doi.org/10.3390/nu16050750
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