Recentemente, a Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral (BRASPEN) publicou um posicionamento acerca do uso clínico de ômega-3 por via parenteral, com amparo em recomendações de outras diversas diretrizes internacionais. A seguir, confira os principais pontos e orientações feitas pelo órgão no documento em questão.
Ômega-3 na NP: considerações anteriores
Em primeiro lugar, é preciso entender de onde parte a necessidade de compreender o uso do ômega-3 na dieta parenteral.
Atualmente, as infusões endovenosas de emulsão lipídica (ELs) disponíveis para uso clínico são compostas por distintas fontes de gordura e fornecem diferentes tipos e proporções de ácidos graxos.
De modo mais específico, a introdução de ácidos graxos ômega-3 nas ELs acontece a partir de 1995, e posteriormente em 2004 no Brasil. Os chamados “Lipídios de Terceira Geração” são compostos de óleo de soja (OS), óleo de coco (OC), óleo de oliva (OO) e óleo de peixe (OP, este último com alto teor de ômega-3).
Em seu posicionamento, a BRASPEN explica que a maior oferta de ômega-3, especialmente EPA e DHA, pode aumentar a razão celular de ácidos graxos poli insaturados n-3:n-6. Uma vez que a alta disponibilidade de ômega-6 favorece respostas inflamatórias intensas e lesivas, o consumo de ômega-3, de modo oposto, favorece respostas imunológicas mais eficientes e menos danosas.
Nesse contexto, em pacientes com enfermidades que envolvem inflamação, a suplementação de EPA e DHA como parte da terapia nutricional especializada é o foco das pesquisas revisadas pela Sociedade.
Recomendações para o uso de ômega-3 via parenteral
Tendo em vista a extensa rede de evidências científicas relacionada ao uso de ômega-3 parenteral, a BRASPEN se posicionou a favor deste uso.
Ressalta-se que ELs comerciais ricas em ômega-3 podem ser compostas apenas por óleo de peixe, ou ainda em combinação com outras gorduras. Segundos os especialistas, essa composição irá depender do perfil metabólico de cada indivíduo:
- Pacientes hipermetabólicos: ELs contendo triglicerídeos de cadeia média (TCM), óleo de oliva ou óleo de peixe.
- Pacientes em estado crítico: ELs contendo apenas óleo de peixe, de modo a promover a melhor modulação da resposta imunológica.
De modo geral, a recomendação para a dose parenteral de ômega-3 nas emulsões lipídicas é de 0,1 a 0,2 g/kg/dia.
Dentre os benefícios do uso do ômega-3 parenteral, a Sociedade cita a redução no tempo de internação hospitalar e/ou UTI e o menor uso de antibióticos. Deste modo, isso equivale a uma maior economia nos recursos financeiros hospitalares.
Ademais, orientações para condições clínicas específicas também são citadas e explicadas minuciosamente. Confira a seguir.
Câncer
Considera-se que o uso do ômega-3 em pacientes com câncer é seguro, sugerindo a suplementação de 2 a 2,2 g/dia de EPA e 1,5 g/dia de DHA, por um período superior a quatro semanas.
As vantagens desta prática incluem:
- Redução da caquexia;
- Manutenção da massa magra;
- Estímulo ao apetite e ganho de peso;
- Melhora na qualidade de vida;
- Melhores desfechos pós-cirúrgicos.
Cuidado perioperatório
Segundo a BRASPEN, é recomendada uma dieta imunomoduladora (contendo ômega-3) para o paciente cirúrgico, com objetivo de atingir uma adequada razão de ômega-6:ômega-3 antes do procedimento. Deste modo, busca-se uma resposta inflamatória adequada no período pós-trauma.
Ainda, o uso de ELs ricas em ômega-3 poderia ser particularmente interessante em alguns grupos, como pacientes cirúrgicos hiperdinâmicos ou estáveis com sepse (principalmente devido à menor incidência de hipertrigliceridemia).
Doença grave
Em pacientes criticamente enfermos, as complicações frequentes (como hiperglicemia, comprometimento hepático e trombose) podem ser atenuadas com o uso de ômega-3 parenteral. Basicamente, esse efeito ocorre em razão da ação anti-inflamatória e pró-resolução deste ácido graxo.
Como visto anteriormente, a melhor prática nestas condições seria a administração de ELs com conteúdo exclusivo de óleo de peixe.
Disfunção hepática
As ELs são parte integral da TN de pacientes com insuficiência intestinal. Para reduzir o risco de lesão hepática e outras complicações nestes indivíduos, as ELs ricas em ômega-3 devem ser preferidas às ELs compostas exclusivamente por óleo de soja (em NP de longa duração).
A sociedade também alerta que, na NP de pacientes críticos ou cirúrgicos sem FI, pode haver alteração de enzimas hepáticas e/ou fosfatase alcalina em 1,5 a 3 vezes acima do normal. Assim, sempre que possível, deve-se usar concomitantemente a nutrição enteral. Se não for possível, substituir EL com OS para EL com OP.
Pediatria
Em prematuros, a BRASPEN afirma que ELs com óleo de peixe resultam em atenuação da resposta inflamatória. Além disso, há melhora dos níveis plasmáticos e eritrocitários dos AGs de cadeia longa, com melhor oferta para o crescimento do cérebro e desenvolvimento da retina do recém nascido pré-termo.
Há contra indicação ou efeitos adversos para o ômega-3 via parenteral?
A contra indicação mais comum para o uso de EL com adição de ômega-3 é a alergia (hipersensibilidade a óleo de soja, oliva, peixe e/ou amendoim).
Em relação à efeitos adversos que não estejam relacionados à alergia, a BRASPEN afirma que não há relatos ou evidências, desde que haja respeito à dose máxima de lipídios (1,5 g/kg/dia) e óleo de peixe (0,1 e 0,2 g/kg/dia).
Por fim, a sociedade deixa claro que não há evidências robustas para indicar uso de ômega-3 parenteral quando se trata de recuperação muscular. Apesar de alguns estudos indicarem essa estratégia para prevenção e tratamento de perda muscular, ainda não há um consenso bem estabelecido.
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Referência:
CASTRO, Melina Gouveia et al. Posicionamento BRASPEN sobre o uso clínico de ômega 3 via parenteral. BRASPEN Journal. 2022.