“Para emagrecer e ter mais saúde, devemos cortar pães, arroz, massas e doces do dia a dia”. Certamente você já ouviu esse conselho, justificado pelo fato de esses alimentos serem ricos em carboidratos. Mas será que é isso mesmo?
O consumo de carboidratos começou a ser atacado quando se descobriu que ingerir gorduras não era tão ruim como pensávamos.
Daí, comer altas quantidades de cereais e massas passou a ser associado à epidemia de obesidade e doenças crônicas, como diabetes e problemas cardíacos.
Esse raciocínio contribuiu para que dietas com baixo teor de carboidratos ficassem em evidência. Assim, muitas pessoas passaram a temer os alimentos fontes dessa substância tão importante.
Um raio-x do nutriente
Os carboidratos, assim como as proteínas e as gorduras, são considerados macronutrientes, ou seja, compostos que precisamos em maior quantidade.
E eles têm uma função muito importante: fornecer energia para nossas células, garantindo o funcionamento de órgãos importantes, como cérebro, coração e músculos.
Inclusive, em outro texto já explicamos como uma alimentação deficiente em carboidratos pode ser a razão de sintomas como cansaço, dor de cabeça e falta de concentração, por exemplo.
Vários tipos diferentes de carboidratos são encontrados em cereais (arroz, milho, trigo, aveia), tubérculos (batatas), raízes (mandioca), leguminosas e frutas. Eles são digeridos e absorvidos de formas distintas pelo nosso organismo. É aí que reside o ponto principal de atenção na busca por escolhas mais saudáveis.
Perceba: de fato o consumo excessivo de alguns tipos de alimentos fontes de carboidratos pode contribuir para o aparecimento de doenças, como o diabetes. Nesse caso, falamos dos açúcares presentes em bolos, doces, balas, refrigerantes e sucos artificiais.
É que essa versão tem fácil digestão e eleva rapidamente os níveis de glicose sanguínea. Em longo prazo, esses picos podem atrapalhar o metabolismo da insulina, o hormônio que regula o aproveitamento do açúcar no organismo. Como consequência, o diabetes pode dar as caras. Portanto, tão importante quanto controlar a quantidade de alimentos fontes de carboidrato na rotina é focar na qualidade da versão que consumimos.
Foi o que demonstrou um estudo populacional com espanhóis submetidos a um programa de mudança de estilo de vida. A redução do consumo de cereais refinados, açúcares adicionados e bebidas adoçadas com açúcar em paralelo ao aumento na ingestão de frutas, vegetais, legumes, peixes e nozes foi capaz de, em seis meses, reduzir a circunferência abdominal, pressão arterial, glicemia e triglicerídemia dos indivíduos.
Na prática
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que a nossa alimentação deve conter, no mínimo, 40% de alimentos fontes de carboidrato. Assim, em uma refeição como almoço, quase metade do prato pode ser preenchido com alimentos como arroz ou macarrão.
A OMS ressalta que devemos preferir as versões integrais desses alimentos, que possuem mais fibras, vitaminas e minerais.
Por falar em fibras, vale ressaltar que elas precisam ser ingeridas diariamente. Essas substâncias estão presentes em maior quantidade em alimentos como verduras, legumes e frutas, mas também se encontram na aveia, no arroz integral, no trigo integral e seus derivados (pães, macarrão), no milho e nas leguminosas.
Pesquisadores franceses acompanharam, durante dois anos, a ingestão de fibras de 107.377 pessoas. Eles observaram que a maior presença dessa substância na rotina foi ligada a um menor o risco de doenças crônicas, como câncer, diabetes tipo 2 e males cardíacos.
Entre os benefícios associados a esse hábito estão a melhora do funcionamento intestinal e uma maior saciedade após as refeições, o que pode diminuir a vontade de continuar comendo.
O alimento não tem um nutriente só
É importante lembrar que, ao reduzir ou eliminar o consumo de alimentos fontes de carboidratos, indiretamente restringimos também a ingestão de vitaminas e minerais presentes nesses itens.
É o caso de da vitamina E, de algumas vitaminas do complexo B e de minerais como selênio, zinco, cobre, magnésio, potássio e fósforo.
Mais uma vez, reforçamos a ideia de que não existe um alimento bom ou ruim. Portanto, nenhum grupo alimentar deve ser excluído. A chave para termos uma nutrição saudável continua sendo o equilíbrio.
Reduzir o consumo de doces e de alimentos açucarados, comer batatas e raízes com moderação, além preferir cereais integrais irá proporcionar mais saúde e energia para viver a vida com prazer.
Referências bibliográficas:
John L. et al. Low-carbohydrate diets and cardiometabolic health: the importance of carbohydrate quality over quantity. Nutr Rev. 2020.
Miguel A. et al.Carbohydrate quality changes and concurrent changes in cardiovascular risk factors: a longitudinal analysis in the PREDIMED-Plus randomized trial. The American Journal of Clinical Nutrition, 2019.
Nantel G. Carbohydrates in human nutrition. FAO.
Valentin P. et al. Associations between consumption of dietary fibers and the risk of cardiovascular diseases, cancers, type 2 diabetes, and mortality in the prospective NutriNet-Santé cohort. The American Journal of Clinical Nutrition, 2020.
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Professor Associado do Departamento de Gastroenterologia da FMUSP; Mestre, Doutor e Livre-Docente pela Universidade de São Paulo, USP; Especialista em Terapia Nutricional Enteral e Parenteral pela Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral – BRASPEN e Diretor do GANEP Nutrição Humana.