A cefaleia, popularmente conhecida como “dor de cabeça”, é uma grande contribuinte para a geração de incapacidade nas populações. A disfunção vascular, a depressão alastrante cortical (DSC), a ativação da via trigeminovascular, e o estado pró-inflamatório e oxidativo são fatores fundamentais na geração da cefaleia.
Especula-se que a alimentação pode afetar a cefaleia através de uma variedade de mecanismos, em alguns casos benéficos, e, em outros, prejudiciais. Algumas intervenções dietéticas anteriores demonstraram efeitos positivos na prevenção e no tratamento das dores de cabeça.
Assim, eleva-se o interesse em compreender a relação entre a alimentação e a cefaleia, para possíveis aplicações no seu manejo. No presente artigo, trouxemos as principais correlações estabelecidas na literatura científica acerca de padrões alimentares e cefaleia: veja a seguir.
Alimentação e cefaleia: Existem alimentos “proibidos”?
Muitas vezes, determinados alimentos podem ser desencadeantes da dor de cabeça. Uma pesquisa transversal relatou que a enxaqueca, um dos principais tipos de cefaleia, foi comumente associada a gatilhos alimentares, com 97.6% dos 123 participantes apresentando suscetibilidade a pelo menos um deles.
Os principais gatilhos alimentares da cefaleia incluem:
- Queijo e laticínios
- Chocolate
- Café/cafeína
- Bebidas alcoólicas, principalmente vinho
- Frutas cítricas
- Carnes processadas
- Trigo e glúten
- Ovo
- Alimentos gordurosos e frituras
- Glutamato monossódico, Aspartame, Sucralose, Nitritos
- Histamina, Tiramina, Feniletilamina
Assim, se a cefaleia ocorrer em pelo menos 50% das vezes após o consumo do alimento dentro de um dia, ele é considerado um gatilho alimentar para aquele indivíduo. Foi relatado que uma Dieta de Eliminação (que exclui os gatilhos alimentares do paciente) é eficaz na atenuação dos sintomas e na redução da frequência da cefaleia.
Contudo, em razão do risco de deficiências alimentares proveniente da Dieta de Eliminação, é preciso que uma abordagem individualizada seja adotada.
Intervenções dietéticas na cefaleia
Algumas estratégias alimentares vêm sendo propostas na literatura como forma de prevenir ou tratar a cefaleia. Embora necessitem de mais pesquisas, os resultados são animadores. Confira a seguir.
1) Dieta Cetogênica
A dieta cetogênica é caracterizada por um alto teor de gordura, e baixo teor de carboidratos. Assim, é projetada para estimular a produção de corpo cetônicos.
Em estudos recentes, a cetose foi associada à prevenção da enxaqueca, através da compensação da disfunção serotoninérgica, inibição da excitabilidade neuronal, diminuição da síntese e liberação de CGRP e depressão alastrante cortical (DSC) e pela melhora da função mitocondrial cerebral.
Em um grupo de 18 pacientes com enxaqueca sob dieta cetogênica, 9 relataram algum alívio na frequência e duração dos ataques.
2) Dieta de Atkins Modificada
Com um menor nível de restrição de carboidratos em comparação à Dieta Cetogênica, a Dieta de Atkins Modificada pode desempenhar um importante papel na neuroproteção, melhora na função mitocondrial e metabolismo energético, e supressão da neuroinflamação.
Portanto, também se mostrou eficaz no manejo da cefaleia.
3) Dieta de baixo índice glicêmico
Na dieta de baixo índice glicêmico, a ingestão diária de carboidratos é restrita a 40 a 60 g, com um índice glicêmico (IG) inferior a 50 em relação à glicose.
Assim, limita-se o consumo de alimentos como açúcar, chocolate, doces em geral, bebidas adoçadas, pães brancos, entre outros. Os carboidratos são provenientes principalmente de legumes, vegetais, frutas e cereais ricos em fibras.
Essa dieta pode ser útil para diminuir o estado inflamatório na cefaleia. Em uma pesquisa com 175 pacientes sob a dieta de baixo IG, a diminuição na frequência das crises foram relatadas, além de menor intensidade de dor.
4) Perda de peso
Indivíduos com obesidade experimentariam dores de cabeça mais frequentes e graves em comparação com indivíduos com peso normal. Além disso, tanto a obesidade abdominal quanto a geral são fatores de risco para o desenvolvimento de cefaleias.
Desse modo, alcançar uma perda de peso significativa pode ajudar na prevenção e no tratamento, a partir da regulação da inflamação e da função hipotalâmica.
5) Equilíbrio entre ômega-6 e ômega-3
O equilíbrio entre a ingestão de ácidos graxos ômega-6 e ômega-3 é sugerido para reduzir as respostas inflamatórias, melhorar a função plaquetária e regular o tônus vascular. Portanto, uma estratégia dietética que reduza o ômega-6 e aumente a ingestão de ácidos graxos ômega-3 (EPA e DHA) pode ser benéfica.
Neste contexto, diversos estudos mostram redução notável na frequência, intensidade e necessidade de medicação para dor de cabeça após intervenções com ômega-3.
6) Outras intervenções
Outras estratégias menos relatadas, mas também descritas anteriormente para auxiliar o manejo da cefaleia, incluíram:
- Dieta DASH;
- Ingestão de sódio apropriada;
- Padrão alimentar saudável no geral (com alto consumo de frutas, legumes e verduras);
- Suplementação de ácido fólico;
- Demais nutracêuticos (magnésio, riboflavina, coenzima Q10, matricária, carrapicho).
Conclusão
Como visto, a alimentação exerce um importante papel na cefaleia, seja desencadeando-a, seja atuando em sua prevenção e tratamento.
Deste modo, é imprescindível que se conheça os gatilhos alimentares do paciente com cefaleia, de modo a elaborar um plano alimentar condizente e que o beneficie, sempre com um olhar individualizado.
Para aplicação clínica de intervenções dietéticas descritas até aqui, estudos mais robustos ainda são necessários. Por isso, a abordagem primária deve incluir uma alimentação saudável, bem como outros componentes de estilo de vida: hidratação adequada, boas noites de sono, exercícios de relaxamento e respiração, manutenção da vida social, diminuição do estresse, e tratamento do etilismo e tabagismo.
Referências:
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