Como a infecção por helmintos pode ajudar no tratamento das doenças inflamatórias intestinais?

Postado em 18 de novembro de 2016 | Autor: Alweyd Tesser

Alguns estudos têm demonstrado que a infecção com helmintos foi capaz de melhorar os sintomas de doenças inflamatórias intestinais, e pesquisadores sugerem que esse efeito decorre das distintas relações entre helmintos e a microbiota, assim como o impacto delas na saúde humana.

 

Helmintos são grupos de parasitas que normalmente, mas nem sempre, residem no intestino do hospedeiro. Alguns exemplos são: Ascaris lumbricoides, Trichuris trichiura, Ancylostoma duodenale e Taenia solium.

Acredita-se que a resposta imune evoluiu com a presença histórica de helmintos e de outros parasitas em humanos, como uma maneira de garantir que o dano causado pelo parasita seja mínimo. Assim, os sistemas digestivo e imune operam otimamente na presença de uma infecção por helmintos. Nas sociedades desenvolvidas, a falta de exposição a helmintos e outros patógenos poderia fazer com que o controle imunológico da infestação se perca, causando alergias e patologias autoimunes, fenômeno conhecido como teoria da higiene.

Partindo dessa lógica, um paciente que sofria de colite ulcerativa desde 2003 e depois de tentar diversos tratamentos anti-inflamatórios sem resultado, realizava infusões de ciclosporina e tinha indicação de colectomia. Desesperado, investigou por conta própria e em 2004 tomou a decisão (apesar da opinião contrária do gastroenterologista que o atendia) de se infectar com 1500 ovos de Trichuris trichiura. Três meses depois da infecção, os sintomas começaram a melhorar e em 2005 ele não apresentava sintomas e já não tomava mais medicamentos.

Impulsionado pela curiosidade, em 2006 o paciente se aproximou de um médico, para que o ajudasse a determinar as mudanças que se passavam em seu intestino e que evitavam a manifestação da doença. Assim, o Dr. Loke concordou com o monitoramento da colite ulcerativa nos quatro anos seguintes.

Depois de três anos sem apresentar sintomas de colite, em 2008 o paciente apresentou uma recaída grave da doença que se correlacionou com uma baixa carga de ovos em suas fezes, o que indicava que ele já não hospedava tantos parasitas como quando estava em remissão. Ao ingerir mais ovos de T. trichiura, desta vez ao redor de 2000, os sintomas melhoraram novamente nos meses seguintes e uma colonoscopia confirmou a presença desse nematelminto no cólon ascendente, e não havia sinais de úlceras. Assim, a colonização com esses parasitas se associou a uma melhora histopatológica, incluindo uma recuperação da integridade epitelial.

De forma semelhante, o Dr. Loke e seus colaboradores determinaram que os sintomas de colite ativa se correlacionavam com a presença de células TH17, enquanto a infecção por T. trichiura e a remissão da doença se caracterizavam pela presença de células TH2 na mucosa intestinal, o que levou a equipe a propor que a colonização pelo parasita diminuía os sintomas de colite devido a uma hiperplasia de células caliciformes do intestino e à produção de muco pelas citocinas das células TH2.

Contudo, depois desse estudo não ficava clara a contribuição direta do helminto na melhoria dos sintomas de doença inflamatória intestinal. Levando em conta que as bactérias intestinais estão constantemente interagindo com o sistema imune, pesquisadores determinaram que a redução de células TH2 em pacientes com colite ulcerativa estava associada a alterações da microbiota, já que algumas espécies proliferavam enquanto outras diminuíam no ambiente inflamatório.

De forma interessante, em um estudo feito em macacos, que em cativeiro comumente desenvolvem enterocolite crônica idiopática, demonstrou-se que a infecção desses animais com T. trichiura melhorava os sintomas da doença e evitava a perda de peso dos macacos. Da mesma forma, se confirmou a indução de uma resposta tipo 2 e também foi determinada a diminuição das bactérias aderidas à parede intestinal, possivelmente com a restauração da produção de muco. Além disso, a colonização com o helminto restaurou a diversidade das bactérias e a disbiose que ocorria no intestino antes do tratamento.

Outro estudo descobriu que camundongos com uma mutação que aumenta o risco de doença de Crohn, apresentavam uma disbiose na microbiota intestinal, favorecendo a proliferação de Bacteroides vulgatus. Essa bactéria, por sua vez, era causadora de defeitos funcionais e estruturais nas células intestinais. Dessa forma, um novo estudo comprovou que a infecção de camundongos com a mesma mutação com Trichuris muris gerou uma resistência a B. vulgatus dependente de imunidade tipo 2, o que promoveu uma mudança na microbiota para uma forma protetora.

Estudos conduzidos por pesquisadores da Malásia observaram que, diferentemente dos indivíduos não infectados, aqueles que eram infectados por helmintos apresentavam uma maior diversidade bacteriana, e menores níveis de Bacteroides que os indivíduos controle. Ao submeter os indivíduos infectados por helmintos a um programa de antiparasitários, observou-se redução da diversidade bacteriana nos mesmos, com aumento dos níveis de Bacteroides e diminuição dos níveis de Clostridiales.

São necessários estudos clínicos randomizados e controlados para a determinação dos mecanismos de ação específicos e o desenvolvimento de terapias em pacientes com doenças intestinais.

Bibliografia

Allen JE, Maizels RM. Diversity and dialogue in immunity to helminths. Nat. Rev. Immunol.
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Broadhurst
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