Probióticos e saúde digestiva: entenda essa relação

Postado em 26 de agosto de 2025

Entenda como os probióticos podem contribuir para uma digestão saudável e qual é o seu papel em diferentes condições intestinais.

A saúde digestiva vai muito além da digestão e absorção de nutrientes — ela reflete o equilíbrio entre o trato gastrointestinal e a complexa comunidade de microrganismos que o habita: a microbiota intestinal. Hoje, já se reconhece que esse ecossistema exerce funções essenciais para o bem-estar geral, no entanto, fatores como estresse, alimentação inadequada e uso de medicamentos podem comprometer esse equilíbrio, levando à disbiose. Nesse contexto, os probióticos surgem como aliados promissores na manutenção e restauração da saúde digestiva. Neste artigo, vamos aprofundar a relação entre probióticos e saúde digestiva: o que caracteriza um intestino saudável, qual o papel da microbiota nesse cenário e como os probióticos podem fazer a diferença. Confira!

probióticos e saúde digestiva

Fonte: Canva

O que é uma boa saúde digestiva e quais são seus pilares?

Uma boa saúde digestiva significa ter um aparelho gastrointestinal funcionando bem: absorvendo nutrientes adequadamente, com um trânsito intestinal regular, uma boa resposta imune e microbiota intestinal em equilíbrio.

Pessoas com saúde digestiva ideal normalmente não apresentam sintomas frequentes, como azia, distenção, gases, constipação ou diarreia.

Os pilares básicos para isso incluem:

  • Dieta balanceada (rica em fibras, frutas, vegetais e grãos integrais)
  • Hidratação adequada
  • Exercícios físicos regulares

Como a microbiota intestinal se relaciona com a saúde digestiva?

A microbiota intestinal é fundamental para manter a barreira intestinal forte, para competir com patógenos (bactérias e fungos indesejáveis), para ajudar na digestão, para modular nosso sistema imune, e para produzir substâncias benéficas.

Por exemplo, a microbiota possui enzimas que quebram componentes dos alimentos que nosso corpo não consegue digerir sozinho (como certas fibras e polifenóis) e sintetiza vitaminas importantes (como vitaminas do complexo B e K).

Além disso, produz ácidos graxos de cadeia curta, que nutrem as células intestinais e regulam o metabolismo local.

Quando a microbiota está desequilibrada, o que chamamos de “disbiose”, todos esses processos podem ser afetados. Então, restaurar esse equilíbrio se torna crucial, e a suplementação com probióticos é uma das estratégias mais estudadas e eficazes para isso.

Como os probióticos ajudam na Síndrome do Intestino Irritável (SII)?

A Síndrome do Intestino Irritável (SII) envolve sintomas como dor abdominal, inchaço e alterações na frequência de evacuações.

Diversos estudos mostram que cepas específicas podem aliviar os sintomas globais da SII, especialmente as do gênero Bifidobacterium ou combinações de múltiplas cepas. Em algumas pesquisas , cerca de 40% dos pacientes relataram melhora significativa dos sintomas, incluindo redução da dor abdominal e do inchaço.

Também foram observadas melhoras no hábito intestinal, especialmente em casos de SII com predomínio de diarreia (SII-D), nos quais cepas de Lactobacillus têm se destacado.

A eficácia dos probióticos parece depender da dose e do tempo de uso: resultados mais consistentes ocorrem com doses mínimas de 1 bilhão de UFC por dia e duração de pelo menos 8 semanas.

Além disso, pacientes com sinais de disbiose intestinal (baixa diversidade microbiana) tendem a se beneficiar mais dessa estratégia, o que reforça a importância de uma abordagem individualizada.

Como os probióticos podem ajudar na diarreia causada por antibióticos?

Os antibióticos são fundamentais no tratamento de infecções, mas não atuam de forma seletiva: além de eliminar bactérias nocivas, também afetam negativamente as bactérias benéficas do intestino. Esse desequilíbrio pode causar a chamada diarreia associada ao uso de antibióticos (DAA), que acomete até 30% dos pacientes.

Os probióticos surgem como uma estratégia eficaz para reduzir a incidência desse efeito colateral. Estudos e meta-análises mostram que, quando iniciados idealmente nos primeiros dois dias do uso do antibiótico, os probióticos podem reduzir o risco de DAA em mais de 50%.

Os mecanismos de ação são múltiplos: além de repor mais rapidamente a microbiota benéfica, os probióticos produzem substâncias que inibem o crescimento de patógenos oportunistas, como o Clostridioides difficile, e ajudam a fortalecer a barreira intestinal, que tende a ficar mais vulnerável durante o tratamento.

O uso da combinação probiótica Lactobacillus acidophilus NCFM®, Lactobacillus paracasei Lpc-37™, Bifidobacterium lactis Bi-07™ e Bifidobacterium lactis Bl-04®, por exemplo, demonstrou eficácia significativa na prevenção da diarreia associada ao uso de antibióticos (DAA). Estudos clínicos indicaram que a suplementação com essa formulação, na dose de 1,7×10¹⁰ UFC/dia, reduziu a incidência de DAA de 24,6% para 12,5%, além de diminuir sua duração em média 2,8 dias. Esses resultados reforçam o potencial dos probióticos como estratégia complementar para preservar a integridade da microbiota intestinal durante tratamentos com antibiótico.

Cepas como Lactobacillus rhamnosus GG e Saccharomyces boulardii são as mais estudadas e recomendadas para esse fim. De modo geral, o uso é seguro para adultos saudáveis, mas deve ser avaliado com cautela em pacientes gravemente imunocomprometidos ou com cateteres venosos centrais de longa permanência.

Quais benefícios as pessoas relatam ao usar probióticos?

Muitos usuários de probióticos relatam sensações de conforto digestivo e melhora no hábito intestinal. Em pessoas com SII, por exemplo, é comum a diminuição de inchaço abdominal e dor após o uso de certos probióticos.

Também já foi observado que probióticos específicos podem regularizar o funcionamento do intestino, tornando as evacuações mais frequentes ou consistentes em quem sofre de constipação leve ou diarreia intermitente.

Outros benefícios comuns relatados incluem melhora na sensação de bem-estar digestivo geral e, em alguns casos, alívio de sensações de desconforto após as refeições.

O tempo para perceber os efeitos dos probióticos pode variar. No caso da diarreia associada a antibióticos, quando o probiótico é iniciado junto com o antibiótico, a melhora costuma ser notada entre 2 a 5 dias.

Já para benefícios como a melhora da regularidade intestinal ou o alívio dos sintomas da Síndrome do Intestino Irritável (SII), pode levar de 2 a 4 semanas ou mais para que uma melhora consistente seja percebida.

Vale lembrar que esses efeitos variam de pessoa para pessoa e dependem da cepa do probiótico consumido.

O que dizem as diretrizes de saúde sobre o uso de probióticos?

As principais sociedades médicas recomendam uso cuidadoso dos probióticos, dependendo do caso:

AGA (Associação Americana de Gastroenterologia): em geral, não há evidências suficientes para recomendar probióticos na maioria das doenças digestivas comuns. Entretanto, a diretriz apoia o uso de certas formulações probióticas em três cenários:

  • Para o tratamento terapêutico da infecção por Clostridioides difficile (C. difficile) em adultos e crianças que tomam antibióticos;

BSG (Associação Britânica de Gastroenterologia): sugere que pacientes com SII podem experimentar probióticos por até 12 semanas para verificar uma melhora nos sintomas globais e dor abdominal na SII, mas não é possível recomendar uma espécie ou cepa específica.

ESPGHAN (Sociedade Europeia de Gastroenterologia Pediátrica, Hepatologia e Nutrição): recomenda o uso de probióticos específicos em certas situações pediátricas. Por exemplo, indica doses de L. rhamnosus GG ou S. boulardii durante o tratamento com antibióticos para prevenir diarreia.

Por fim, a ECCO (Organização Europeia para Doença de Crohn e Colite) sugere que probióticos podem ser considerados em crianças com colite ulcerativa leve e intolerantes ao 5-ASA, ou como uso terapêutico em crianças com atividade residual leve, apesar da terapia padrão.

Em resumo, as diretrizes reconhecem que os probióticos podem ser benéficos em situações bem definidas, mas ainda não há recomendações amplas ou generalizadas.

O principal motivo é a grande heterogeneidade dos estudos: diferentes cepas são testadas, em dosagens variadas, em populações distintas, e com qualidades metodológicas diversas. Isso dificulta agrupar os resultados e emitir orientações que sirvam para todos os cenários.

Por isso, é fundamental conhecer a cepa utilizada e as evidências específicas para ela antes de indicar o uso.

O que podemos concluir?

Como visto, probióticos não são uma solução mágica, mas podem ser aliados importantes para a saúde digestiva. Sempre vale considerar orientação profissional para escolher a cepa adequada, o momento certo e avaliar os resultados de forma individualizada.

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