Ômega-3 em Neonatologia: Temos evidências e podemos mesmo considerar importante?

Postado em 28 de agosto de 2013

É crescente o interesse pelo uso de ácidos graxos ômega-3 (AG n-3) em neonatologia, principalmente na prevenção de complicações associadas ao uso de nutrição parenteral e no tratamento de doenças alergênicas (1).

Uma complicação frequente que ocorre em crianças é a colestase, caracterizada pela redução do fluxo biliar associada ao uso prolongado de nutrição parenteral denominada PNAC (do inglês, Parenteral Nutrition-Associated Cholestasis), principalmente em prematuros com baixo peso ao nascer, com doença inflamatória intestinal e estado pós-trauma (1).

Estudo retrospectivo publicado em 2011 demonstrou o efeito da suplementação parenteral de emulsão lipídica (EL) enriquecida com AG n-3 no primeiro dia de vida de 337 bebês com baixo peso e retinopatia grave. O aumento sérico do AG n-3 e sua elevação na composição da membrana de eritrócitos, principalmente de docosahexaenóico (DHA), foi associado a uma redução significativa de PNAC, assim como do comprometimento do fluxo biliar e da produção de bile (2).

A principal complicação da PNAC em neonatos é a hiperbilirrubinemia, causada pelo excesso de bilirrubina secretada na corrente sanguínea. Estudo randomizado, duplo-cego controlado, comparou o efeito de EL rica em AG n-3 com a EL padrão por quatorze dias em prematuros com baixo peso. A EL com AG n-3 foi bem tolerada e diminuiu os níveis da enzima glutamil transferase, biomarcador para diagnóstico de alterações hepáticas (1). Posteriormente, o estudo de Goulet em 2010 demonstrou o efeito de AG n-3 em neonatos prematuros sob vigência de nutrição parenteral domiciliar por vinte e nove dias e verificou uma correlação do aumento plasmático de AG n-3 com a resolução significativa da hiperbilirrubinemia (3).

Em contrapartida, estudo publicado em 2012 por Skouroliakou e colaboradores observou o efeito de AG n-3 parenteral por pelo menos sete dias em 282 neonatos com baixo peso sobre a frequência de colestase e displasia broncopulmonar. A suplementação foi associada com melhora do perfil lipídico e com a diminuição da displasia broncopulmonar, porém a redução de PNAC não foi significativa quando foi comparada ao controle (4). Estes dados reforçam a necessidade de mais estudos para avaliar o real efeito de AG n-3 em PNAC.

Além disso, a suplementação de AG n-3 em nenonatos tem sido associada com modulação favorável da resposta imunológica e redução da ocorrência de doenças alergênicas. Estudo randomizado e duplo-cego realizado por D’Vaz em 2012 com 420 neonatos com alto risco de desenvolver asma foram suplementados com AG n-3 parenteral nos seis primeiros meses de vida. Os resultados demonstraram redução significativa de linfócitos Th2, participante da resposta imunológica em reação às doenças alérgicas, como asma, rinite e eczema. Neste estudo, a redução de Th2 foi correlacionada com a diminuição das interleucinas (IL) pró-inflamatórias IL-5 e 13 (5).

Outro estudo administrou a suplementação parenteral de EL com AG n-3 por seis meses em neonatos prematuros com alto risco de desenvolvimento de asma. Os resultados demonstraram melhora do quadro asmático com redução de chiado recorrente e diminuição da ocorrência de eczema, dermatite de pele associada a frequência de asma e rinite alérgica (6).

A importância da suplementação de AG n-3 em pediatria deve ser considerada em determinadas condições clínicas. O aumento destes AG na membrana de eritrócitos e no plasma tem sido associado à prevenção e reversão da colestase e na melhora de marcadores de função hepática, principalmente em neonatos em vigência de nutrição parenteral prolongada e no tratamento de doenças alergênicas. Novas pesquisas apontam ainda o potencial benefício na diminuição de marcadores pró-inflamatórios e aumento da defesa antioxidante. Entretanto, mais estudos bem delineados são necessários para consolidar esta recomendação e determinar doses, tipo e período de suplementação para a garantia de segurança e eficácia da terapia nutricional.

Priscila Garla
Nutricionista especialista em Terapia Intensiva Multidisciplinar pela FAMEMA e Mestranda em Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da USP

Referências:

1. Tomsits E, Pataki M, Tolgyesi A, Fekete G, Rischak K, Szollar L. Safety and efficacy of a lipid emulsion containing a mixture of soybean oil, medium-chain triglycerides, olive oil, and fish oil: a randomised, double-blind clinical trial in premature infants requiring parenteral nutrition. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2010; 51:514-521.

2. Pawlik D, Lauterbach R, Hurkała J. The efficacy of fish-oil based fat emulsion administered from the first day of life in very low birth weight newborns.Med Wieku Rozwoj. 2011; 15(3):306-11.

3. Goulet O, Antebi H, Wolf C, et al. A new intravenous fat emulsion containing soybean oil, medium-chain triglycerides, olive oil, and fish oil: a single-center, double-blind randomized study on efficacy and safety in pediatric patients receiving home parenteral nutrition. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2010;34:485-495.

4. Skouroliakou M, Konstantinou D, Agakidis C, Delikou N, Koutri K, Antoniadi M,Karagiozoglou-Lampoudi T. Cholestasis, Bronchopulmonary Dysplasia, and Lipid Profile in Preterm Infants Receiving MCT/ω-3-PUFA-Containing or Soybean-Based Lipid Emulsions. Nutr Clin Pract. 2012; 27(6):817-24.

5. D’Vaz N, Meldrum SJ, Dunstan JA, Lee-Pullen TF, Metcalfe J, Holt BJ, Serralha M, Tulic MK, Mori TA, Prescott SL. Fish oil supplementation in early infancy modulates developing infant immune responses. Clin Exp Allergy. 2012 ;42(8):1206-16.

6. D’Vaz N, Meldrum SJ, Dunstan JA, Martino D, McCarthy S, Metcalfe J, Tulic MK, Mori TA, Prescott SL. Postnatal fish oil supplementation in high-risk infants to prevent allergy: randomized controlled trial. Pediatrics. 2012; 130(4):674-82.

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