A obesidade e a sarcopenia são condições que alteram a quantidade e a distribuição de…
Entenda por que essa condição vai além da mera presença de obesidade e sarcopenia, isoladamente.
A obesidade sarcopênica foi definida pela primeira vez em 1996, como uma síndrome caracterizada pela presença simultânea de excesso de tecido adiposo e redução da massa muscular.
No entanto, com avanços de estudos sobre a temática, a definição da obesidade sarcopênica evoluiu, assim como a compreensão da sua fisiopatologia, critérios diagnósticos e formas de manejo.
A seguir, você irá entender o que é obesidade sarcopênica, com base nas mais recentes pesquisas científicas e diretrizes clínicas.
O que é obesidade sarcopênica?
A obesidade sarcopênica é uma condição clínica em que a obesidade e a sarcopenia ocorrem simultaneamente, definidas por:
- Alta porcentagem de gordura corporal (obesidade)
- Baixa massa muscular esquelética + baixa função muscular (sarcopenia)
A obesidade sarcopênica exemplifica a intersecção de duas crises de saúde atuais: o envelhecimento da população, e a epidemia de obesidade. De fato, o envelhecimento é marcado como uma fase de intensa mudança de composição corporal. Além da redução de massa muscular, pode haver uma infiltração de gordura no músculo, reduzindo ainda mais sua quantidade e desempenho físico.
Dados da população estadunidense demonstram prevalência de obesidade sarcopênica em 28.3% da população acima dos 60 anos. Certos grupos, como idosos hospitalizados ou institucionalizados, podem estar em maior risco de ter essa condição.
Por que não considerar a obesidade sarcopênica como duas condições distintas?
Embora, por definição, a obesidade sarcopênica seja a presença simultânea destas duas condições, os especialistas defendem sua identificação como uma enfermidade única. Isso se deve à existência de:
→ Uma interação bidirecional e patogênica entre o acúmulo de massa de gordura corporal e a perda de massa e função muscular esquelética;
→ Interações clínicas negativas entre obesidade e sarcopenia, levando a um risco sinergicamente maior de doença metabólica e comprometimento funcional em comparação com aqueles causados pelo risco cumulativo de cada condição separada.
Obesidade sarcopênica: fisiopatologia
A fisiopatologia da obesidade sarcopênica envolve interações complexas entre múltiplos fatores, sendo estes:
- Fatores genéticos
- Fatores dietéticos
- Fatores de estilo de vida (atividade física, fatores ambientais, sociais e estresse mental)
- Mudanças na composição corporal relacionadas à idade
- Desequilíbrios hormonais
- Declínio da função neuromuscular
- Aumento da inflamação e estresse oxidativo
- Atividade reduzida de células satélite musculares
- Metabolismo energético alterado
- Acoplamento metabólico-vascular prejudicado
- Condições agudas ou crônicas
No contexto de mudanças de peso, duas situações podem acontecer para que se desenvolva a obesidade sarcopênica: um ganho de peso geral, sem uma taxa de acréscimo muscular adequado; ou uma perda de peso considerável, mas não o suficiente para se sair a obesidade, e que induz à vários graus de perda muscular.
Resumidamente, mudanças metabólicas incrementais ao longo do tempo promovem a deposição de gordura com uma cascata de eventos pró-inflamatórios. Em conjunto, a interação com o tecido muscular biologicamente ativo leva a um ciclo de feedback negativo que promove ganho progressivo de massa gorda e perda de massa magra e força muscular.
Triagem e diagnóstico da obesidade sarcopênica
Assim como definir obesidade, sarcopenia e obesidade sarcopênica, estabelecer a melhor forma para critérios de triagem e diagnóstico ainda é um motivo de debate na ciência.
Entretanto, em anos recentes, estabeleceu-se o painel internacional de especialistas “Sarcopenic Obesity Global Leadership Initiative” (SOGLI), formado por membros da European Society for Clinical Nutrition and Metabolism (ESPEN) e da European Association for the Study of Obesity (EASO). Essa parceria culminou na padronização da avaliação e no diagnóstico da obesidade sarcopênica a partir de um consenso em 2022.
A figura abaixo representa as principais orientações para a triagem, diagnóstico e estadiamento da obesidade sarcopênica.
Leia também: Diretriz ESPEN e EASO para diagnóstico de obesidade sarcopênica
Vale ressaltar que a obesidade sarcopênica é classificada com base na ausência (estágio 1) ou presença de complicações (estágio 2). Tais complicações incluem:
- Deficiências funcionais (dificuldade ou necessidade de assistência com atividades da vida diária)
- Quedas
- Baixa velocidade de marcha
- Doenças metabólicas, cardiovasculares e respiratórias
Qual o tratamento da obesidade sarcopênica?
Embora a mudança de composição corporal com a idade seja inevitável, a obesidade sarcopênica é uma condição modificável, podendo ser tratada após uma terapia efetiva.
Os principais objetivos são combinar exercícios e intervenções nutricionais, de forma a criar um balanço energético negativo para reduzir o tecido adiposo, mas preservando (ou aumentando) a massa e a função muscular.
O American College of Sports Medicine recomenda que um programa de treinamento de força seja realizado em um mínimo de dois dias não consecutivos por semana, com uma série de 10–15 repetições em indivíduos mais velhos e frágeis.
Entretanto, exercícios aeróbios também são bem-vindos para o tratamento da condição. A combinação das duas modalidades é mais eficaz do que qualquer uma das formas de exercício isoladamente.
No âmbito da alimentação, as recomendações se concentram especialmente em na redução moderada de energia (200 a 700 kcal/dia), consumo proteico satisfatório (1 a 1.5 g/kg/dia), fracionamento proteico entre as refeições (25 a 30 g por refeição), e fornecimento de aminoácidos essenciais. Nesse sentido, a suplementação com leucina (2,0–2,5 g por dia) associa-se ao aumento da síntese de proteína muscular em adultos mais velhos.
Ademais, alguns nutrientes e ingredientes foram propostos para melhorar a saúde muscular devido às suas capacidades anabólicas, anti-inflamatórias, anticatabólicas e/ou antioxidantes. Estes incluem ácidos graxos ômega-3, β-hidroxi β-metilbutirato, carotenoides, selênio, vitaminas D, E e C e isoflavonas. No entanto, as evidências atuais por vezes inconclusivas e conflitantes.
Além dos exercícios físicos e nutrição, outros tratamentos como cirurgia bariátrica e o uso de medicamentos também estão disponíveis.
Conclusão
Em suma, a obesidade sarcopênica é uma condição complexa que combina excesso de gordura corporal com perda de massa e função muscular, prevalente especialmente entre idosos.
Por outro lado, o tratamento eficaz envolve exercícios físicos, como treinamento de força e atividades aeróbicas, aliados a intervenções nutricionais que promovem a redução de gordura e a preservação da massa muscular.
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Referências:
Batsis JA, Villareal DT. Sarcopenic obesity in older adults: aetiology, epidemiology and treatment strategies. Nat Rev Endocrinol. 2018 Sep;14(9):513-537. doi: 10.1038/s41574-018-0062-9. PMID: 30065268; PMCID: PMC6241236.
Donini LM, Busetto L, Bischoff SC, Cederholm T, Ballesteros-Pomar MD, Batsis JA, Bauer JM, Boirie Y, Cruz-Jentoft AJ, Dicker D, Frara S, Frühbeck G, Genton L, Gepner Y, Giustina A, Gonzalez MC, Han HS, Heymsfield SB, Higashiguchi T, Laviano A, Lenzi A, Nyulasi I, Parrinello E, Poggiogalle E, Prado CM, Salvador J, Rolland Y, Santini F, Serlie MJ, Shi H, Sieber CC, Siervo M, Vettor R, Villareal DT, Volkert D, Yu J, Zamboni M, Barazzoni R. Definition and Diagnostic Criteria for Sarcopenic Obesity: ESPEN and EASO Consensus Statement. Obes Facts. 2022;15(3):321-335. doi: 10.1159/000521241. Epub 2022 Feb 23. PMID: 35196654; PMCID: PMC9210010.
Prado, C.M., Batsis, J.A., Donini, L.M. et al. Sarcopenic obesity in older adults: a clinical overview. Nat Rev Endocrinol 20, 261–277 (2024). https://doi.org/10.1038/s41574-023-00943-z
A Redação Nutritotal é formada por nutricionistas, médicos e estudantes de nutrição que têm a preocupação de produzir conteúdos atuais, baseados em evidência científicas, sempre com o objetivo de facilitar a prática clínica de profissionais da área da saúde.
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