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Descubra os principais cuidados nutricionais para prevenir crises de gota e melhorar a qualidade de vida dos pacientes.
Em 2640 a.C., a gota foi identificada pela primeira vez no Egito Antigo. Já no século V a.C., Hipócrates de Cós descreveu a gota como a “doença em que não se pode andar” devido à dor intensa nas articulações. Mais tarde, Areteu de Capadócia acreditava que uma toxina fluía lentamente “gota a gota” para as articulações, o que deu origem ao seu nome.
Nos dias atuais, o conhecimento sobre a doença e o tratamento de pacientes com gota evoluiu de forma considerável. Além da medicação, as recomendações de estilo de vida, incluindo orientações nutricionais, são uma parte crucial do manejo da gota.

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Nos tópicos seguintes, você irá entender o que é a gota, e como orientar a alimentação de indivíduos com essa condição. Confira!
O que é a doença “gota”?
A gota é uma doença inflamatória que ocorre em resposta ao acúmulo de cristais de ácido úrico em tecidos como articulações, cartilagens, ossos e tendões, devido a níveis elevados de ácido úrico no sangue (hiperuricemia).
A apresentação clínica inicial da gota é marcada por crises súbitas de dor intensa, acompanhadas de inchaço e eritema na articulação afetada. A articulação do pé (ou tornozelo) é geralmente a mais afetada.
Essas crises são autolimitadas, ou seja, duram de 2 a 7 dias, e ocorrem de forma intermitente, com intervalos assintomáticos entre os episódios.
A gota é a forma mais comum de artrite inflamatória, com uma prevalência de 2 a 3% Nesse sentido, ela é mais incidente nos homens, e muito rara nas mulheres antes da menopausa. Em adultos com gota, cerca de 20% têm doença renal crônica (DRC) em estágio 3 ou mais.
Gota: fatores de risco
Os fatores de risco da gota podem ser classificados como não modificáveis ou modificáveis.
Os fatores de risco não modificáveis são:
- Sexo masculino
- Pós-menopausa (mas reverte com terapia hormonal)
- Idade avançada
- Etnia (ex.: população das ilhas do Pacifíco)
- Múltiplas variações genéticas
Já os fatores de risco modificáveis são:
- Obesidade
- Dieta inadequada
- Hipertensão arterial
- Doenças cardiovasculares
- Doença renal crônica
- Utilização de medicamentos diuréticos
- Estado do receptor de transplante de órgão
Como visto, a dieta inadequada é um fator de risco modificável. Todavia, a alimentação participa não apenas da prevenção, mas também pode desempenhar um papel importante no tratamento da gota.
Veja a seguir quais são os cuidados nutricionais que devem ser adotados por pacientes com gota.
7 cuidados nutricionais para pacientes com gota
1. Limitar ou evitar alimentos ricos em purinas
Purinas são compostos orgânicos que fazem parte da estrutura do DNA e RNA. A degradação das purinas gera ácido úrico, que, como citado anteriormente, formam cristais que acarretam a gota.
Por isso, limitar alimentos ricos em purinas é uma das principais recomendações nutricionais para pacientes com gotas. Tais alimentos incluem:
- Carnes vermelhas
- Aves
- Vísceras
- Frutos do mar (crustáceos, mexilhões)
- Determinados peixes (anchovas, cavala, sardinha)
- Levedura
Como visto, boa parte das proteínas animais são ricas em purinas. Sendo assim, recomenda-se moderação nestes alimentos, e as proteínas vegetais podem ser priorizadas.
2. Limitar frutose
O consumo excessivo de açúcares, especialmente a frutose, está relacionado ao aumento dos níveis de ácido úrico. Estudos associam a ingestão elevada de refrigerantes, sucos de frutas e outros alimentos ricos em frutose (tal como alimentos ultraprocessados) a taxas mais altas de hiperuricemia.
Em contrapartida, frutas frescas podem ser consumidas, pois não elevam o risco de gota. No entanto, é importante evitar sucos de frutas ricos em frutose, como os de laranja e maçã. Bebidas light e diet, que não contêm frutose, são consideradas seguras nesse contexto.
3. Limitar bebidas alcóolicas
O consumo de álcool pode aumentar a produção de ácido úrico e reduzir sua excreção pelos rins, elevando o risco de crises de gota. Nesse sentido, recomenda-se evitar principalmente as cervejas e os destilados (vodka, whisky, rum, tequila e gin), ao passo que o vinho tem o menor potencial de risco.
4. Garantir níveis adequados de vitaminas e minerais
A manutenção de uma ingestão adequada de vitaminas e minerais é essencial para promover efeitos antioxidantes e anti-inflamatórios no tratamento de pacientes com gota. Desequilíbrios em qualquer um desses nutrientes podem agravar a inflamação.
Vitaminas como A, E, D e C desempenham papeis importantes na redução dos níveis de ácido úrico. A vitamina C, por exemplo, pode inibir a reabsorção de ácido úrico nos rins, favorecendo sua excreção. Já a vitamina E ajuda a estabilizar as membranas celulares e a inibir a hemólise induzida por cristais.
Além das vitaminas, os minerais também são cruciais. O potássio possui efeitos diuréticos, auxiliando na função renal, enquanto o excesso de ferro pode elevar os níveis de ácido úrico. Por fim, o cálcio também pode facilitar a eliminação do ácido úrico.
5. Aumentar consumo de fibras
A ingestão de fibras alimentares melhora a composição da microbiota intestinal, o que é especialmente importante para pacientes com gota. Isso porque o processo de fermentação dessas fibras libera ácidos graxos de cadeia curta (AGCC) como o acetato e o butirato, que têm efeitos anti-inflamatórios.
O acetato é o AGCC mais abundante, e resolve rapidamente a inflamação induzida por cristais de ácido úrico, promovendo a apoptose dos neutrófilos e a excreção de IL-10. Enquanto isso, o butirato melhora a acumulação de lipídios e reduz a produção de ácido úrico ao inibir a ativação de NF-κB.
Assim, o consumo de grãos integrais, vegetais e frutas ricos em fibras é benéfico para regular a homeostase gastrointestinal, controlar a inflamação e ajudar na gestão da gota.
De acordo com a Sociedade Austríaca de Reumatologia e Reabilitação, todos os vegetais (incluindo os ricos em purinas) podem ser consumidos, uma vez que as purinas de origem vegetal são consideradas seguras para o consumo.
6. Inserir alimentos-chave na alimentação
Alguns alimentos são especialmente recomendados nos cuidados do paciente com gota. Primeiramente, o consumo regular de leite e produtos lácteos (com baixo teor de gordura) pode reduzir o ácido úrico, devido ao efeito de suas proteínas (caseína e lactoalbumina). O consumo regular de leite desnatado e iogurte pode levar a uma redução de 10% nos níveis de ácido úrico.
Assim como o leite, o café também ajuda a diminuir os níveis de ácido úrico. Embora os mecanismos subjacentes não estejam claros, algumas pesquisas sugerem que a cafeína pode inibir a xantina oxidase, uma enzima envolvida na produção de ácido úrico. Além disso, o café pode aumentar o fluxo sanguíneo renal e melhorar a excreção urinária de urato.
Finalmente, as cerejas também são capazes de reduzir os níveis de ácido úrico, promovendo a sua excreção na urina, principalmente as cerejas azedas, com grandes quantidades de antocianinas.
7. Levar um padrão alimentar saudável
Adotar um padrão alimentar saudável, como a dieta DASH ou a dieta mediterrânea, pode ajudar os pacientes com gota a controlar seus níveis de ácido úrico, reduzir as crises e atrasar a progressão da doença.
Essas dietas enfatizam a ingestão de alimentos anti-inflamatórios, ricos em nutrientes e com baixo teor de purinas, promovendo assim uma saúde geral melhor.
Por exemplo, a Sociedade Austríaca de Reumatologia e Reabilitação informa que a redução no ácido úrico parece ocorrer já após 1 mês de adoção da dieta DASH, durando pelo menos 3 meses.
“Prevenir antes de remediar”
Antes de iniciar o manejo nutricional da gota, é fundamental identificar pacientes em risco de desenvolvê-la e orientar sobre escolhas alimentares conscientes que possam prevenir a sua incidência.
Para apoiar a educação alimentar e nutricional desses pacientes, clique e acesse: Infográfico – Alimentação para Prevenir Gota.
Conclusão
Em conclusão, o manejo nutricional desempenha um papel essencial na prevenção de crises e na melhoria da qualidade de vida dos pacientes com gota. Tais estratégias envolvem controlar alimentos ricos em purinas, levar um padrão alimentar saudável, limitar bebidas alcóolicas, e garantir a ingestão adequada de determinados nutrientes.
É igualmente importante lembrar que o controle de peso e a prática regular de atividade física, juntamente com o tratamento medicamentoso adequado, são fundamentais para a gestão a longo prazo da doença.
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Referências:
Associação Portuguesa de Nutrição. O Papel da Alimentação no Tratamento da Pessoa com Gota. E-book n.º 58. Porto: Associação Portuguesa de Nutrição; 2021.
Prest M. Nutrition Interventions for the Management of Gout. J Ren Nutr. 2023 Mar;33(2):e1-e3. doi: 10.1053/j.jrn.2023.01.002. Epub 2023 Jan 14. PMID: 36649831.
Sautner J, Eichbauer-Sturm G, Gruber J, Lunzer R, Puchner R. Empfehlungen der Österreichischen Gesellschaft für Rheumatologie und Rehabilitation zu Ernährung und Lebensstil bei Gicht und Hyperurikämie – Update 2022 [2022 Update of the Austrian Society for Rheumatology and Rehabilitation nutrition and lifestyle recommendations for patients with gout and hyperuricemia]. Z Rheumatol. 2023 Feb;82(1):71-81. German. doi: 10.1007/s00393-022-01286-2. Epub 2022 Nov 24. PMID: 36424414; PMCID: PMC9895016.
Zhang Y, Chen S, Yuan M, Xu Y, Xu H. Gout and Diet: A Comprehensive Review of Mechanisms and Management. Nutrients. 2022 Aug 26;14(17):3525. doi: 10.3390/nu14173525. PMID: 36079783; PMCID: PMC9459802.

A Redação Nutritotal é formada por nutricionistas, médicos e estudantes de nutrição que têm a preocupação de produzir conteúdos atuais, baseados em evidência científicas, sempre com o objetivo de facilitar a prática clínica de profissionais da área da saúde.
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