Doença renal: recomendações nutricionais

Postado em 15 de março de 2023

Entenda tudo sobre o tratamento da doença renal aguda e crônica através da alimentação.

Rins saudáveis são fundamentais para o pleno funcionamento do organismo humano. Por outro lado, na presença de doença renal, a nutrição é essencial no tratamento, pois ajuda a manter ou recuperar o estado nutricional e impedir a progressão da doença.

Mas quais são as recomendações nutricionais em cada tipo de doença renal? Continue lendo para descobrir.

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Recomendações nutricionais para doença renal aguda

A doença renal aguda e a injúria renal aguda (IRA) são caracterizadas pela perda da função dos rins em um período de até três meses. Na IRA, esta perda é rápida e repentina, e há acúmulo de metabólitos, toxinas e medicamentos no sangue.

Uma das principais marcas da injúria renal aguda é o catabolismo excessivo, principalmente no doente crítico. Portanto, o objetivo é suprir suas necessidades nutricionais para recuperar o estado nutricional e minimizar o desequilíbrio metabólico.

Abaixo, confira as recomendações de cuidados nutricionais para pacientes com presença de doença renal aguda.

Aporte energético

Na doença renal aguda, quando a calorimetria indireta está indisponível, a recomendação de energia é de 20 a 30 kcal/kg/dia do peso seco ou ideal  (em caso de obesidade ou muito baixo peso). Para pacientes gravemente enfermos, esse valor sobe para 25 a 30 kcal/kg/dia.

A nutrição hipocalórica (<70% do gasto energético) é recomendada na fase inicial da enfermidade aguda, com aumento progressivo após o 3º dia, nos pacientes em recuperação.

Proteínas

A recomendação de proteínas para pacientes com doença renal aguda varia de acordo com a presença de catabolismo e necessidade de terapia de reposição renal (TRR):

  • Não hipercatabólicos e sem TRR: 0.8 a 1 g/kd/dia.
  • Pacientes hipercatabólicos e sem TRR:3 a 1.5 g/kg/dia
  • TRR intermitente: 1.5 g/kg/dia
  • TRR contínua: 1.7 a 2.5 g/kg/dia

Suplementação de micronutrientes

A suplementação de micronutrientes para paciente em terapia renal substitutiva pode ser necessária.

Isso dependerá de diversos fatores, sendo eles: grau de catabolismo, fase da doença, volume urinário, presença de perdas por fístulas, uso de drenos e sondas, feridas, queimaduras, tempo de jejum, desnutrição prévia, e tipo/frequência/duração da TRR.

Nestes pacientes, as pesquisas relatam concentrações séricas baixas de vitamina D3, vitamina C, selênio, zinco e ferro. Porém, faltam estudos que definam necessidades nutricionais específicas para este grupo e/ou mostrem desfechos após a suplementação.

A exceção é a vitamina C, cuja recomendação é de 60-100 mg/dia. Os demais micronutrientes são recomendados de acordo com as RDAs.

Já para os eletrólitos, a doença aguda resulta em alterações importantes na homeostase de sódio, potássio, cálcio, magnésio, cloreto e bicarbonato. O manejo destes eletrólitos deve ser individualizado, de acordo com os níveis séricos.

Doença renal crônica: orientações nutricionais

A doença renal crônica (DRC) acontece quando a  perda da função renal se prolonga por mais de três meses, com múltiplas anormalidades nutricionais e metabólicas.

Diversos fatores afetam o estado nutricional destes pacientes, como a falta de apetite, inflamação, esvaziamento gástrico retardado, acidose metabólica e resposta hormonal anormal.

A seguir, confira as atuais recomendações nutricionais para pacientes com DRC.

Ingestão energética

Muitas vezes, as alterações metabólicas da DRC causam perda de apetite, resultando em severas perdas nutricionais.

Para manter o estado nutricional normal, o aporte calórico deve ser de 25 a 35 kcal/kg/dia em pacientes metabolicamente estáveis, com base na idade, sexo, atividade física,  composição corporal, status de peso, estágio da doença, presença de inflamação e comorbidades associadas.

Proteínas

O consumo de proteínas na DRC deve ser muito bem orientado. Uma carga menor de proteína reduz a hiperfiltração renal e diminui a produção de toxinas urêmicas. No entanto, muito pouca proteína pode desencadear a desnutrição.

Sendo assim, as recomendações para o consumo proteico na doença renal crônica varia em cada contexto. Veja no quadro a seguir:

Fase 1 a 2 da DRC

●      0.8 a 1 g/kg/dia.

●      Menor teor proteico para preservar a função renal.

Fase 3 a 5 da DRC, sem diabetes

●      0.55 a 0.6 g/kg/dia.

●      Menor teor proteico para reduzir sintomas clínicos, retardar o início da diálise, e diminuir o risco de insuficiência renal ou morte.

●      Só é sustentável em um estado metabólico estável e neutro, sob supervisão clínica rigorosa.

●      Não é recomendada durante a hospitalização, infecção, tratamento com imunossupressores, e durante/após perda de peso corporal a curto prazo.

Fase 3 a 5 da DRC, com diabetes

●      0.6 a 0.8 g/kg/dia.

●      Na diabetes, a maior ingestão de proteínas pode ser necessária para alcançar o controle glicêmico.

●      A taxa de 0.8 g/kg/dia também contempla pacientes com condições de risco como desnutrição e idade avançada.

Pacientes em diálise

●      1.1 a 1.3 g/kg/dia.

●      Pacientes em diálise precisam ingerir mais proteínas devido ao maior grau de catabolismo proteico e perdas de aminoácidos e peptídeos.

●      Fornecer refeições saudáveis antes, durante e após uma sessão de diálise pode atenuar o catabolismo proteico.

Gorduras

A dislipidemia é frequente em pacientes com doença renal crônica. As anormalidades no perfil lipídico ficam mais detectáveis à medida que a função renal diminui. Como consequência, pessoas com DRC correm maior risco de doenças cardíacas.

Sendo assim, as gorduras saturadas e trans devem ser limitadas, enquanto o consumo de gorduras insaturadas é incentivado. Portanto, alimentos como carne vermelha, manteiga, frituras e gordura vegetal, serão substituídos por azeite, nozes, abacate, e salmão.

Carboidratos

Quando a ingestão de proteínas é limitada, a ingestão de carboidratos precisará aumentar para atender às necessidades energéticas.

Os carboidratos menos processados são os mais indicados, incluindo arroz, pão ou macarrão integral, aveia e cevada. Estes contém mais fibras alimentares, importantes para reduzir a absorção intestinal do potássio e reduzir o colesterol.

Vegetais amiláceos também devem ser incluídos, como as batatas, batatas-doce e inhame. Apesar de conterem potássio, este pode ser reduzido a partir do corte, demolho e fervura.

Os açúcares simples encontrados em alimentos industrializados aumentam as doenças cardíacas e o excesso de peso, então devem ser evitados. Estes devem ser substituídos por açúcares naturais, presentes em frutas, vegetais, leite e iogurte.

Fósforo

Os rins danificados não são capazes de remover o fósforo do sangue de maneira adequada. Este nutriente pode se acumular no sangue e trazer consequências, como o enfraquecimento dos ossos.

Deste modo, a ingestão dietética deve ser ajustada para manter os níveis séricos de fósforo dentro da normalidade. Em caso de hiperfosfatemia persistente e progressiva, a restrição deve ser indicada.

O fósforo é encontrado em uma grande variedade de alimentos. Nos grãos integrais, legumes, nozes e leguminosas ele é inofensivo, pois é menos absorvido, ao estar complexado aos fitatos. Por outro lado, nos alimentos de origem animal, essa absorção é mais facilitada.

Entretanto, os alimentos que mais carecem atenção são os ultraprocessados, contendo fósforo na forma de aditivos químicos (ácido fosfórico, difosfato de sódio, fosfato tricálcico…). Estes são 100% absorvidos, e estão muito presentes em alimentos como carnes processadas, queijos, macarrão instantâneo, biscoitos, entre outros.

Potássio

A DRC pode dificultar a remoção de potássio do sangue pelos rins, aumentando seus níveis séricos. Acidose metabólica, constipação e diabetes também contribuem para o aumento do potássio sérico. Sendo assim, a ingestão deste mineral deve ser ajustada para manter seus níveis normais.

Para diminuir o potássio da dieta, algumas estratégias são:

  • Preferir frutas e vegetais baixos neste nutriente (maçã, uva, melão, manga, limão, pêra, pêssego, pimentão, brócolis, cenoura, couve-flor…);
  • Cozinhar hortaliças em água abundante, descartando a água do cozimento;
  • Drenar frutas e legumes enlatados, jogando o líquido fora;
  • Evitar alimentos industrializados contendo aditivos de potássio (sorbato de potássio, citrato de potássio e difosfato de potássio);
  • Usar ervas e especiarias ao invés de utilizar o sal “light”.

Sódio

O alto consumo de sódio pode aumentar a retenção de fluídos no sangue, aumentando a pressão sobre os rins. Portanto, a ingestão máxima de sódio deve ser de 2,3 g/dia.

Para diminuir sódio, recomenda-se:

  • Preferir alimentos frescos;
  • Ao consumir alimentos enlatados, optar por aqueles sem adição de sódio;
  • Usar menos sal e mais ervas, especiarias e outros temperos alternativos;
  • Limitar a quantidade de alimentos processados;
  • Estar atento aos aditivos químicos à base de sódio (cloreto de sódio, glutamato monossódico, nitrato de sódio, fosfato de sódio…).

Vitaminas

Na DRC, as deficiências vitamínicas são decorrentes da ingestão alimentar reduzida, das restrições dietéticas, das comorbidades e das perdas da diálise.

Neste sentido, estudos sugerem maior risco de deficiências de B1 (tiamina), B2 (riboflavina) e B3 (niacina), vitamina C, vitamina K e vitamina D. No entanto, as pesquisas são escassas, e não existem recomendações específicas para este grupo.

Uma estratégia razoável é suplementar apenas indivíduos que apresentam ingestão alimentar prejudicada e/ou perda de nutrientes por períodos prolongados de tempo.

Líquidos

Pacientes com DRC avançada podem precisar limitar a ingestão de líquidos, uma vez que os rins danificados não conseguem remover o líquido extra. Como consequência, pode haver inchaço e aumento da pressão arterial.

Afinal, o que deve prevalecer?

São diversas as recomendações nutricionais para os pacientes de doença renal. Desde macronutrientes até eletrólitos, tantas “regras” e restrições podem frustrar o paciente e confundir o profissional de saúde.

As recomendações aqui apresentadas são gerais, e devem servir como base. Porém, as novas diretrizes indicam que uma abordagem individualizada, focada em padrões alimentares, seja a primeira via de escolha.

Logo, a principal recomendação nutricional para a doença renal é uma dieta saudável como um todo, rica em alimentos de origem vegetal, pobre em carnes vermelhas e alimentos processados.

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Referências:

Diet & Nutrition for Adults with Advanced Chronic Kidney Disease. National Institute of Diabetes and Digestive and Kidney Diseases. 2022.

MACLAUGHLIN, Helen L.; FRIEDMAN, Allon N.; IKIZLER, T. Alp. Nutrition in kidney disease: core curriculum 2022. American Journal of Kidney Diseases, 2021.

PEREIRA, Raíssa Antunes et al. Diet in Chronic Kidney Disease: an integrated approach to nutritional therapy. Revista da Associação Médica Brasileira, v. 66, p. s59-s67, 2020.

ZAMBELLI, Clarissa Martins Saraiva Figueira et al. Diretriz BRASPEN de Terapia Nutricional no paciente com doença renal. BRASPEN J 2021; 36 (2oSupl 2): 2-22. 2021.

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