A nova diretriz da ABCD e UKKA aborda a importância da gestão lipídica em pessoas com doença renal diabética, destacando recomendações para o uso de terapias hipolipemiantes conforme o estágio da doença.
A interação entre diabetes e doença renal crônica (DRC) aumenta significativamente o risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares (DCV). Nesse sentido, os lipídios são um fator de risco modificável crucial, e uma boa gestão lipídica pode oferecer resultados melhorados para pessoas com doença renal diabética (DRD).
Por isso, as novas diretrizes da Joint Association of British Clinical Diabetologists (ABCD) e da UK Kidney Association (UKKA) abordam um aspecto crucial do manejo da doença renal diabética (DRD): a gestão dos lipídios a partir de agentes hipolipemiantes. A seguir, confira os pontos chaves do material.
Medição de lipídios e frequência de monitoramento
Em primeiro lugar, os especialistas recomendam a medição de perfil lipídico completo (incluindo colesterol total, colesterol não HDL, HDL, LDL e triglicerídeos) sem jejum para pacientes com doença renal diabética. A triagem deve ser anual, ou com maior frequência se isso influenciar o gerenciamento.
A exceção é para quando os níveis de triglicerídeos forem superiores a 4,5 mmol/L. Nestes casos, a medição do perfil lipídico deve ser feita em jejum.
Ademais, sugere-se a revisão do perfil lipídico no início ou na mudança da modalidade de terapia de substituição renal (diálise ou transplante renal).
Por fim, após o transplante renal, sugere-se que o status lipídico seja avaliado após o período pós-operatório imediato ter passado (normalmente 3 meses após o transplante).
Estágios da DRD
Grande parte das recomendações da diretriz são estabelecidas com base nos estágios da doença renal diabética (DRD), caracterizados pelas categorias da taxa de filtração glomerular estimada (TFGe) e albuminúria, segundo a tabela abaixo.
Categoria TFG | TFGe (ml/min/1,73m2) |
G1 | ≥ 90 |
G2 | 60 a 89 |
G3a | 45 a 59 |
G3b | 30 a 44 |
G4 | 15 a 29 |
G5 | < 15 |
Categoria albuminúria | Relação albumina/creatinina (mg/mmol) |
A1 | < 3 |
A2 | 3 a 30 |
A3 | > 30 |
Gerenciamento de lipídios com terapia hipolipemiante
Diabetes tipo 1
No diabetes tipo 1 e DRD estágio G1 a 2, a terapia hipolipemiante deve ser iniciada nas seguintes categorias:
- Pessoas com idade > 30 anos com albuminúria persistente, categoria A2 a 3
- Pessoas com idade entre 18 e 30 anos com albuminúria persistente, categoria A2 a 3 e ≥ 1 fator de risco adicional para DCV
No diabetes tipo 1 e DRD estágio G3 a 5, independentemente do estado albuminúrico, deve ser iniciada a terapia de redução de lipídios.
Em pessoas com diabetes tipo 1 em diálise, DRD estágio G5, não recomenda-se o início da terapia de redução de lipídios. No entanto, em certos casos, como naqueles em que o transplante é um resultado provável e onde a diálise é temporária, o início pode ser benéfico e pode ser considerado.
Diabetes tipos 2
Estudos demonstram que a combinação de diabetes tipo 2 com albuminúria ou DRC aumenta significativamente o risco cardiovascular. Os dados de grandes estudos indicam que o uso de estatinas pode reduzir de forma eficaz eventos cardiovasculares em pessoas com diabetes tipo 2.
No entanto, os benefícios das estatinas diminuem em pacientes com função renal comprometida, e não há evidências suficientes para recomendar o uso de estatinas em pacientes em diálise.
Assim, as recomendações para o tratamento com estatinas são:
- Iniciar a terapia em pessoas com diabetes tipo 2 com albuminúria persistente, especialmente aquelas com mais de 30 anos, e em jovens de 18 a 30 anos com albuminúria persistente e pelo menos um fator de risco adicional para DCV.
- Considerar a terapia com estatinas para pessoas com diabetes tipo 2 e doença renal crônica em estágios mais avançados, independentemente do status de albuminúria.
- Em pacientes com diabetes tipo 2 em diálise, não se recomenda iniciar a terapia com estatinas, mas pode ser considerada em casos específicos, como quando um transplante renal é uma possibilidade.
Doença renal em estágio terminal e diálise
Embora as estatinas tenham mostrado reduzir o risco de um primeiro evento vascular maior na população geral, sua eficácia é menor em pacientes com doença renal em estágio terminal, especialmente em diálise.
Contudo, a redução na eficácia pode ser devido a uma menor proporção de pessoas com doença coronariana aterosclerótica ou dificuldades na interpretação de dados clínicos.
Atualmente, não há evidências claras de benefício ou malefício no uso de terapias redutoras de lipídios em pacientes em diálise. Muitos médicos continuam a utilizar essas terapias, mas é raro iniciar o tratamento nesse grupo específico de pacientes.
Metas de tratamento
As seguintes metas de tratamento foram sugeridas pelos especialistas:
- TC ≤ 4,0 mmol/L
- Colesterol não HDL ≤ 2,5 mmol/L
- Colesterol LDL ≤ 1,8 mmol/L
Demais recomendações
Além das orientações descritas até aqui, os autores também fazem recomendações acerca:
- Da escolha do agente hipolipemiante de acordo com o estágio da DRD
- Do monitoramento e segurança dos agentes hipolipemiantes
- Sobre quando interromper a terapia
Clique aqui para acessar a diretriz completa.
Se você gostou deste conteúdo, leia também:
- Cuidados primários em Diabetes – Diretrizes ADA
- Diretrizes práticas para acompanhamento da doença renal crônica
- Doença renal: recomendações nutricionais
Referência:
Zac-Varghese, S., Mark, P., Bain, S. et al. Clinical practice guideline for the management of lipids in adults with diabetic kidney disease: abbreviated summary of the Joint Association of British Clinical Diabetologists and UK Kidney Association (ABCD-UKKA) Guideline 2024. BMC Nephrol 25, 216 (2024). https://doi.org/10.1186/s12882-024-03664-1
Leia também
A Redação Nutritotal é formada por nutricionistas, médicos e estudantes de nutrição que têm a preocupação de produzir conteúdos atuais, baseados em evidência científicas, sempre com o objetivo de facilitar a prática clínica de profissionais da área da saúde.