Devido às propriedades antioxidantes de vários micronutrientes, a deficiência destes pode piorar o estresse oxidativo…
Micronutrientes são essenciais para a saúde, mas sua deficiência pode causar sérios problemas. Entenda como identificá-las e corrigir desequilíbrios nutricionais.
Micronutrientes são definidos como nutrientes essenciais para a saúde e a sobrevivência, mas necessários em quantidades muito pequenas através da nutrição.
Existem aproximadamente 20 micronutrientes essenciais, incluindo as vitaminas e os minerais. A deficiência de um ou mais deles têm efeitos distintos, que podem acarretar em sintomas clínicos graves. Atualmente, estima-se que essa deficiência afete mais de 2 bilhões de pessoas de todas as idades, especialmente gestantes e crianças menores de 5 anos.

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No artigo de hoje, iremos entender como avaliar deficiências de micronutrientes, e quais são as possíveis intervenções para corrigi-las.
Deficiência de micronutrientes: o que isso significa?
Segundo a ESPEN (European Society for Clinical Nutrition and Metabolism), define-se como deficiência de um determinado micronutriente:
- A evidência de sua perda objetiva em fluidos corporais, ou ingestão abaixo da recomendação padrão;
- E/OU a presença de sinais ou sintomas clínicos, compatível com a sua deficiência;
- OU a concentrações no sangue/plasma abaixo da faixa de referência, juntamente com efeitos metabólicos de inadequação.
Vale ressaltar que, muitas vezes, os micronutrientes podem estar em um estado de insuficiência, sem necessariamente estarem deficientes. Ainda assim, nestes casos, é importante que intervenções nutricionais sejam conduzidas, a fim de evitar a deficiência e guiar para um status de adequação.
Mundialmente, vitamina A, folato, iodo, ferro e zinco são as deficiências de micronutrientes mais comuns e contribuem para complicações perinatais, crescimento deficiente, comprometimento cognitivo e aumento da morbidade e mortalidade.
No Brasil, um recente estudo nacional com 1.812 adultos entre 19 a 65 anos, os pesquisadores descobriram uma alta probabilidade de insuficiência para vitamina D, vitamina E, vitamina A, colina, cálcio e magnésio.
Como avaliar a deficiência de micronutrientes?
A avaliação da deficiência de micronutrientes geralmente se baseia em uma análise conjunta da ingestão de alimentos e outras fontes, sinais e sintomas, e em indicadores bioquímicos.
Consumo alimentar
A análise do consumo alimentar é um dos primeiros passos na avaliação da deficiência de micronutrientes. A partir de recordatórios de 24 horas, diário alimentar e questionários de frequência alimentar, pode-se identificar a ingestão insuficiente de determinadas vitaminas e minerais.
Idealmente, devem ser coletados dados de pelo menos dois dias distintos, para reduzir erros decorrentes da variação diária na ingestão, que pode ser significativa para micronutrientes consumidos em grandes quantidades, mas de forma esporádica (por exemplo, vitamina A).
Informações sobre padrões alimentares podem ser muito úteis, pois alguns nutrientes preocupantes se concentram em determinados grupos de alimentos. Por exemplo, para indivíduos vegetarianos ou veganos, é necessário atentar-se aos nutrientes geralmente oferecidos por alimentos de origem animal, como vitamina B12 e ferro.
Já para portadores de doença celíaca, que seguem uma dieta sem glúten, algumas deficiências nutricionais também são comuns, como aqueles referentes às vitaminas do complexo B.
A ferramenta online Automated Self-Administered 24-hour Dietary Assessment Tool (ASA24) é gratuita e permite a inserção de dados de consumo alimentar e uso de suplementos, coletados pelos nutricionistas. Os resultados incluem dados sobre 13 vitaminas, ferro, selênio e zinco.
Sinais e sintomas
A identificação clínica da deficiência de micronutrientes pode passar por uma avaliação criteriosa dos sinais e sintomas observados no exame físico. A semiologia nutricional é a área que investiga manifestações clínicas relacionadas ao estado nutricional, incluindo alterações decorrentes de deficiências específicas.
Por meio da observação de tecidos externos — como cabelos, olhos, pele, unhas, cavidade oral e mucosas — é possível identificar pistas valiosas sobre desequilíbrios nutricionais.
Mas afinal, o que observar? Quais sinais indicam possíveis deficiências de vitaminas e minerais?
Acesse esse conteúdo e descubra: Semiologia Nutricional: Manifestações Clínicas.
Marcadores bioquímicos
A análise laboratorial é uma ferramenta fundamental na avaliação do status de micronutrientes, especialmente quando os dados clínicos e alimentares não são conclusivos. Os marcadores bioquímicos permitem detectar alterações subclínicas, monitorar a resposta à intervenção nutricional e confirmar deficiências suspeitas.
Entretanto, sua interpretação exige cautela: concentrações plasmáticas podem ser influenciadas por processos inflamatórios, hidratação, medicamentos ou alterações metabólicas. Por isso, sempre que possível, os resultados devem ser avaliados em conjunto com parâmetros clínicos, dietéticos e funcionais.
Além disso, os valores de corte que indicam deficiência ou depleção às vezes são debatidos pela comunidade científica.
Na tabela abaixo, confira os biomarcadores indicados para alguns micronutrientes, assim como valores de corte.
Nutriente | Biomarcador | Valor de corte para inadequação ou outro status | Comentários |
Vitamina A | Retinol sérico | <0,7 μmol/litro | Níveis relativamente insensíveis a mudanças no estado. Deve ser ajustado para inflamação. |
Vitamina D | 25(OH)D sérico | <30 nmol/litro | Os pontos de corte alternativos são <25 nmol/litro para deficiência grave e 25–50 nmol/litro para insuficiência |
Vitamina E | α-tocoferol sérico | <12 μmol/litro | O ponto de corte alternativo é <30 μmol/litro com base nos níveis associados à menor mortalidade em ATBC |
Tiamina (vitamina B1) | Coeficiente de atividade de ETK | Status considerado marginal se a adição de TDP aumentar o nível de ETK em 15–25%, deficiente se o aumento for >25% | Sem ensaio plasmático; o nível de tiamina urinária reflete a ingestão recente; 100 μg/dia é considerado ingestão insuficiente; |
Riboflavina (vitamina B2) | EGRAC | 1,2–1,4 considerado baixo; >1,4 considerado deficiente | Sem dosagem plasmática; o uso do nível de riboflavina em hemácias <170 nmol/litro detecta 92% dos casos de deficiência com EGRAC ≥1,4†; |
Niacina (vitamina B3) | N1-metilnicotiname urinário mais N1-metil-2-piridona-5-carboxamida | <5,8 μmol/dia | 5,8–17,5 μmol/dia é considerado baixo |
Piridoxina (vitamina B6) | Fosfato de piridoxal plasmático | <20 ou <30 nmol/litro | O limite de corte do NAM de <20 nmol/litro é usado para definir os requisitos, mas <30 nmol/litro é mais comumente usado |
Folato (vitamina B9) | Folato de hemácias | <400 nmol/litro | Nível sérico de folato <6,8 nmol/litro também indica deficiência, mas é afetado pela ingestão recente; nível sérico de homocisteína <12–16 μmol/litro indica deficiência, mas é afetado pelo estado de B12; |
Vitamina B12 | Cobalamina sérica ou plasmática | <221 pmol/litro | <150 pmol/litro indica deficiência, <221 pmol/litro indica estado marginal; holotranscobalamina sérica (“B12 ativa”) mais sensível, ligeiramente mais específica e reflete absorção recente; nível sérico de MMA >0,27 μmol/litro pode confirmar deficiência, mas os níveis também são elevados por insuficiência renal. |
Ferro | Ferritina sérica | <30 μg/litro | <10 μg/litro indica risco de anemia ferropriva; nível de ferritina reduzido antes do nível de hemoglobina. Muito aumentado pela inflamação. |
Zinco | Zinco plasmático | <11 μmol/litro | <10,4 μmol/litro indica deficiência em mulheres, <11,0 μmol/litro indica deficiência em homens; o valor é menor se houver inflamação presente |
Iodo | Iodo urinário | <100 μg/litro <150 μg/litro durante a gravidez | O iodo urinário é usado como um marcador de ingestão em nível populacional ; o nível de tireotropina é elevado quando a ingestão é inferior a aproximadamente 100 μg/dia |
Fonte: Allen, 2025.
Como visto, o status de alguns micronutrientes podem ser influenciados pela inflamação. Segundo a ESPEN, a proteína C-reativa (PCR) (indicador do estado inflamatório) deve ser determinada simultaneamente à análise de qualquer micronutriente, visto que a maioria das concentrações plasmáticas ou séricas diminui mesmo com PCR >10 mg/L.
Deficiência de micronutrientes: como definir intervenções?
Em alguns casos, estratégias de suplementação são essenciais para a correção de deficiências de micronutrientes, pois a alimentação não é suficiente. É o caso da vitamina B12, vitamina D e ferro, por exemplo.
Já para outros micronutrientes, em casos leves a moderados, uma alimentação estrategicamente planejada pode ser suficiente para restabelecer os níveis adequados – principalmente quando há boa adesão dietética e ausência de distúrbios de absorção.
Micronutrientes como vitamina A, folato, zinco e iodo têm correções documentadas por meio exclusivo de dieta, desde que esta inclua fontes alimentares variadas e ricas nesses nutrientes — como fígado, vegetais verde-escuros, leguminosas, cereais integrais, carnes magras e frutos do mar.
A escolha da intervenção ideal deve considerar a gravidade da deficiência, o perfil do paciente, possíveis causas subjacentes (como síndromes de má absorção ou uso de medicamentos), além de fatores sociais e culturais que possam interferir na adesão alimentar.
Em muitos casos, a integração entre suplementação e mudanças na alimentação será a abordagem mais eficiente — utilizando suplementos para correção rápida dos níveis, enquanto se trabalha, a médio e longo prazo, com estratégias alimentares sustentáveis que previnam recidivas.
A atuação do nutricionista é essencial nesse processo, garantindo que cada intervenção seja individualizada, segura e baseada em evidências — priorizando sempre que possível a reeducação alimentar e o fortalecimento da autonomia nutricional do paciente.
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- Desafios Nutricionais da População Adulta Brasileira: um olhar para a ingestão de Micronutrientes
- Micronutrientes podem regular a função da tireoide?
- Diretrizes de micronutrientes da ESPEN
Referências
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Fisberg M, Duarte Batista L, Previdelli AN, Ferrari G, Fisberg RM. Exploring Diet and Nutrient Insufficiencies across Age Groups: Insights from a Population-Based Study of Brazilian Adults. Nutrients. 2024; 16(5):750. https://doi.org/10.3390/nu16050750.
Slywitch, Eric. Guia de Nutrição Vegana para Adultos da União Vegetariana Internacional (IVU). Departamento de Medicina e Nutrição. 1ª edição, IVU, 2022.
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Nutricionista formada pela Faculdade de Saúde Pública da USP. Experiências anteriores em Educação Alimentar e Nutricional e monitorias acadêmicas. Participante voluntária da Extensão Médica Acadêmica e da Liga Acadêmica de Nutrição Vegetariana. Auxiliar técnica em projetos de nutrição no Nutritotal PRO e Ganep Educação.