Suplementação de BCAA: evidências e orientações para bons resultados

Postado em 25 de março de 2024

Para praticantes de atividade física e outros públicos, a suplementação de BCAA traz uma série de benefícios.

No universo da nutrição esportiva e saúde, o BCAA tem sido objeto de debate e interesse crescentes. Neste artigo, iremos desvendar as principais questões sobre este suplemento, explorando seus benefícios, sua importância no esporte, e as diretrizes para uma suplementação de BCAA segura e eficaz. Confira a seguir!

suplementação de BCAA

Fonte: Canva.com

O que é o BCAA e para que serve?

Os aminoácidos de cadeia ramificada (BCAA) são aminoácidos essenciais, que não são produzidos pelo corpo e devem provir da dieta (9). São componentes deste grupo a valina, a leucina e a isoleucina (2, 7, 10).

Diferente dos outros aminoácidos, os BCAAs não são metabolizados pelo fígado, mas sim pelos músculos esqueléticos, onde estimulam as vias anabólicas (7, 9). Ao total, eles constituem um terço da composição proteica muscular (1, 2).

De modo geral, os BCAAs possuem três funções principais:

  1. Promoção da síntese proteica muscular, seja como substratos ou moléculas sinalizadoras;
  2. Inibição da proteólise;
  3. Produção de energia durante o jejum (5, 7).

Além disso, estes aminoácidos desempenham diversas outras funções metabólicas e de sinalização, particularmente através da via de sinalização do alvo da rapamicina em mamíferos (mTOR) (5). São também precursores de neurotransmissores e influenciam a função mitocondrial e as respostas imunitárias (7).

O papel do BCAA no esporte

A suplementação de BCAA é comum no meio esportivo. De fato, diversos estudos, incluindo pesquisas recentes, comprovam os benefícios desta estratégia para os atletas, sejam eles profissionais ou recreativos. Confira-os a seguir.

Recuperação muscular

Exercícios de alta intensidade e longa duração são caracterizados por danos musculares e proteólise (2). O dano muscular impede o crescimento dos músculos, e deve ser atenuado para que resultados benéficos do exercício sejam notados (3).

Nesse sentido, a suplementação de BCAA pode ser benéfica, tendo em vista seu papel na mitigação do dano muscular, e no favorecimento da recuperação muscular (2), seja no exercício de resistência ou endurance (9).

Tais benefícios ocorrem através de vários mecanismos. O principal deles, porém, é a promoção da síntese muscular pela ativação da via do mTOR. Esta função repara os danos induzidos pelo exercício nas fibras musculares, promovendo sua recuperação (2).

Na prática, esse efeito contribui para a melhora no desempenho esportivo, além de preservar a força, potência e resistência muscular (2, 9). Além disso, há uma redução dos principais sintomas do dano muscular, dor e fadiga, como veremos a seguir.

Redução da fadiga

A fadiga é o principal fator limitante do desempenho físico durante exercícios prolongados. Entretanto, inúmeras pesquisas indicam que a suplementação de BCAA é benéfica para a redução da fadiga, particularmente a fadiga central (1).

Os níveis de BCAAs plasmáticos competem com o triptofano para serem absorvidos no cérebro. Assim, quanto mais BCAA estiver disponível no organismo, menos triptofano é absorvido, e menos serotonina é produzida (2). A serotonina, por sua vez, é a responsável pela fadiga central durante o exercício (5).

Em um estudo randomizado, duplo-cego e controlado por placebo, corredores de longa distância ingeriram 20 g de BCAA 1 hora antes de exercício em esteira. Os autores concluíram que essa estratégia aumentou o tempo até à exaustão, provavelmente devido à redução da serotonina, e, portanto, da fadiga (1).

Ademais, outro mecanismo do BCAA envolvido na redução da fadiga é a promoção da oxidação de ácidos graxos e produção de ATP, reduzindo a degradação das proteínas musculares (2). Em outras palavras, o BCAA é utilizado como fonte de energia ao invés da proteína muscular, reduzindo o catabolismo.

Diminuição da dor muscular

Além da recuperação muscular e redução da fadiga, a suplementação de BCAA reduz a dor após a prática de exercícios (9).

Sugere-se que a dor muscular possa ser gerada pela resposta inflamatória às lesões musculares, causando aumento da sensibilidade aos receptores do músculo. Por outro lado, a suplementação de BCAA controla a expressão de citocinas pró-inflamatórias e aumenta a produção de glutamina, um substrato para células imunológicas (2).

Além disso, a dor muscular também está ligada ao dano muscular induzido pelo estresse oxidativo. Os BCAAs possuem uma atividade antioxidante, atenuando a dor após o exercício (2).

Em uma investigação com 12 participantes, a dor muscular de início tardio (DMIT) foi significativamente menor em participantes que suplementaram BCAA do que naqueles que tomaram um placebo (14).

Benefícios para a massa muscular

Para a formação e crescimento dos músculos, é essencial que haja um balanço proteico positivo, ou seja, que a síntese de proteínas musculares exceda a sua degradação (13).

Como visto, os BCAAs estão diretamente envolvidos na promoção da síntese proteica e na inibição da proteólise. Este efeito, isoladamente, não é suficiente para que haja um crescimento muscular acentuado (9).

Entretanto, em combinação ao treinamento e a ingestão proteica adequada, a suplementação de BCAA pode ser uma estratégia integrativa para aqueles que buscam a hipertrofia, pois sua falta ou baixa disponibilidade afeta negativamente a síntese de proteínas (13).

Em um estudo duplo-cego e randomizado com 36 praticantes de exercícios de resistência, a suplementação com 14g de BCAA por 8 semanas aumentou a massa magra e diminuiu o percentual de gordura corporal. Estes efeitos positivos foram maiores quando comparados à ingestão de whey protein ou de uma bebida esportiva (16).

Além de contribuir para o ganho muscular, o BCAA também pode preservar a massa magra em indivíduos sob dietas de baixa caloria. Esse efeito é importante principalmente para praticantes de musculação, que visam a perda de peso sem perder massa muscular (9).

Suplementação segura e eficaz

Para que todos os benefícios descritos até aqui sejam alcançados e maximizados, é necessário que um regime de suplementação bem orientado seja posto em prática. Veja a seguir os componentes ideais para uma suplementação de BCAA segura e eficaz.

Proporção de BCAAs: 2:1:1 de leucina, isoleucina e valina, respectivamente. Essa proporção têm a leucina em maior quantidade, que demonstra os melhores efeitos para a saúde  muscular em relação à outras configurações (2).

Quantidade de aminoácidos: 1 a 5 g de leucina, e 0.5 a 2.5 g de isoleucina e valina (2).

Quantidade diária: 2 a 10 g/dia (2).

Nº de doses diárias: 1 a 6, sendo de 2 a 3 o ideal (2).

Quando tomar: imediatamente antes e após o exercício, mas principalmente antes, contribuindo para a disponibilidade desses aminoácidos durante o treino (2, 6, 10).

Combinação: pode ser administrado sozinho, junto a outros aminoácidos, ou combinado com carboidratos e arginina para potencializar seus efeitos (2). A arginina é um aminoácido interessante principalmente no pré-treino, por seus efeitos de melhora do desempenho físico, redução da fadiga, dentre outros.

Quem pode usar: praticantes de exercício físico, atletas, pessoas submetidas a dietas de baixas calorias, vegetarianos e veganos, idosos, pacientes com cirrose hepática, pacientes hospitalizados.

Erroneamente, se propagou a ideia que a suplementação de BCAA não funciona, o que não é verdade. Muitas vezes, essa falsa crença decorre da utilização inadequada desse suplemento. Entretanto, com as orientações descritas acima é possível sentir efeitos positivos da suplementação, aliada à dieta e ao treinamento.

BCAA além do esporte

Além dos benefícios na atividade física, a suplementação de BCAA também apresenta outras apresentações clínicas vantajosas, como nas doenças hepáticas ou renais (4).

Na cirrose hepática, por exemplo, a proporção de BCAAs para aminoácidos aromáticos está diminuída. Isso acontece devido a vários fatores, como a redução da ingestão proteica e o hipercatabolismo (11). Tal cenário eleva a ocorrência de encefalopatia hepática e sarcopenia.

Contudo, a suplementação de BCAA pode restaurar seus níveis e melhorar o curso destas complicações (5, 8, 11, 17). Além disso, contribui para a melhora do estado nutricional, da fraqueza, e da fadiga (4, 11).

Em uma pesquisa com 54 pacientes com cirrose, a suplementação de BCAA por 16 semanas melhorou a fragilidade, aumentou o índice muscular esquelético e a qualidade de vida (15).

No ambiente hospitalar, os BCAAs podem ser de grande auxílio. Fórmulas com tais aminoácidos são fornecidas para pacientes de insuficiência renal crônica, a fim de manter o equilíbrio proteico e minimizar a toxicidade urêmica (4).

Para o combate da desnutrição, a administração de BCAAs podem melhorar o estado nutricional, a fadiga física e mental, e a função do sistema imunológico (11).  Em pacientes sarcopênicos, há melhora da massa e força muscular, além de aumentar a sobrevida (8).

Ademais, a oferta pós-operatória deste grupo de aminoácidos previne o catabolismo muscular. Em estudo, a oferta precoce de BCAA após gastrectomia melhorou a perda de massa magra em pacientes oncológicos, com um aumento de 2,2 kg no primeiro mês após a cirurgia (12).

Por fim, o BCAA também pode ser prescrito para pacientes vegetarianos, veganos ou com outras restrições alimentares que limitem o consumo destes aminoácidos essenciais, evitando os efeitos negativos da sua falta.

Há também evidências sobre os efeitos do BCAA na redução de sintomas de ansiedade e depressão, observados em estudo realizado com mais de 3 mil homens com idade de 36,2 ± 7,8 anos. No entanto, mais estudos são necessários para comprovar tal relação (18).

Conclusão

Em resumo, a suplementação de BCAA é uma estratégia valiosa para um melhor desempenho esportivo e saúde em geral. Seus benefícios são vastos, abrangendo desde a recuperação muscular até a melhora do estado nutricional em pacientes hospitalizados.

Por fim, a chave para a eficácia do BCAA reside em uma suplementação bem orientada, respeitando proporções adequadas e doses ideais. Com as informações apresentadas aqui, confiamos que nutricionistas e profissionais de saúde estarão aptos a empregar essa estratégia, visando resultados otimizados e customizados de acordo com as necessidades únicas de seus pacientes.

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Referências:

  1. AbuMoh’d MF, Matalqah L, Al-Abdulla Z. Effects of Oral Branched-Chain Amino Acids (BCAAs) Intake on Muscular and Central Fatigue During an Incremental Exercise. J Hum Kinet. 2020 Mar 31;72:69-78. doi: 10.2478/hukin-2019-0099. PMID: 32269649; PMCID: PMC7126259.
  2. Arroyo-Cerezo A, Cerrillo I, Ortega Á, Fernández-Pachón MS. Intake of branched chain amino acids favors post-exercise muscle recovery and may improve muscle function: optimal dosage regimens and consumption conditions. J Sports Med Phys Fitness. 2021 Nov;61(11):1478-1489. doi: 10.23736/S0022-4707.21.11843-2. Epub 2021 Feb 15. PMID: 33586928.
  3. Bernardes J. Lesão no treino físico não leva a aumento de massa muscular. Jornal da USP. 2018 Nov 1.
  4. Dimou A, Tsimihodimos V, Bairaktari E. The Critical Role of the Branched Chain Amino Acids (BCAAs) Catabolism-Regulating Enzymes, Branched-Chain Aminotransferase (BCAT) and Branched-Chain α-Keto Acid Dehydrogenase (BCKD), in Human Pathophysiology. Int J Mol Sci. 2022 Apr 5;23(7):4022. doi: 10.3390/ijms23074022. PMID: 35409380; PMCID: PMC8999875.
  5. Holeček M. Branched-chain amino acids in health and disease: metabolism, alterations in blood plasma, and as supplements. Nutr Metab (Lond). 2018 May 3;15:33. doi: 10.1186/s12986-018-0271-1. PMID: 29755574; PMCID: PMC5934885.
  6. Jackman SR, Witard OC, Philp A, Wallis GA, Baar K & Tipton KD. (2017). Branched-chain amino acid ingestion stimulates muscle myofibrillar protein synthesis following resistance exercise in humans. Frontiers in physiology, 8, 390.
  7. Le Couteur DG, Solon-Biet SM, Cogger VC, Ribeiro R, de Cabo R, Raubenheimer D, Cooney GJ, Simpson SJ. Branched chain amino acids, aging and age-related health. Ageing Res Rev. 2020 Dec;64:101198. doi: 10.1016/j.arr.2020.101198. Epub 2020 Oct 24. PMID: 33132154.
  8. Marrone G, Serra A, Miele L, Biolato M, Liguori A, Grieco A, Gasbarrini A. Branched chain amino acids in hepatic encephalopathy and sarcopenia in liver cirrhosis: Evidence and uncertainties. World J Gastroenterol. 2023 May 21;29(19):2905-2915. doi: 10.3748/wjg.v29.i19.2905. PMID: 37274800; PMCID: PMC10237095.
  9. Morse T & Willoughby DS. (2019). Efficacy of BCAA supplementation for exercise performance and recovery: a narrative review. J Nutr Health Food Eng, 9(3), 128-133.
  10. Ra SG, Miyazaki T, Kojima R, Komine S, Ishikura K, Kawanaka K, Honda A, Matsuzaki Y, Ohmori H. Effect of BCAA supplement timing on exercise-induced muscle soreness and damage: a pilot placebo-controlled double-blind study. J Sports Med Phys Fitness. 2018 Nov;58(11):1582-1591. doi: 10.23736/S0022-4707.17.07638-1. Epub 2017 Sep 22. PMID: 28944645.
  11. Ruiz-Margáin A, Méndez-Guerrero O, Román-Calleja BM, González-Rodríguez S, Fernández-Del-Rivero G, Rodríguez-Córdova PA, Torre A, Macías-Rodríguez RU. Dietary management and supplementation with branched-chain amino acids in cirrhosis of the liver. Rev Gastroenterol Mex (Engl Ed). 2018 Oct-Dec;83(4):424-433. English, Spanish. doi: 10.1016/j.rgmx.2018.05.006. Epub 2018 Oct 3. PMID: 30292583.
  12. Sakuraya M, Yamashita K, Honda M, Niihara M, Chuman M, Washio M, Hosoda K, Naitoh T, Kumamoto Y, Hiki N. Early administration of postoperative BCAA-enriched PPN may improve lean body mass loss in gastric cancer patients undergoing gastrectomy. Langenbecks Arch Surg. 2023 Aug 25;408(1):336. doi: 10.1007/s00423-023-03045-6. PMID: 37624566; PMCID: PMC10457225.
  13. Santos CS, Nascimento FEL. Isolated branched-chain amino acid intake and muscle protein synthesis in humans: a biochemical review. Einstein (São Paulo). 2019 Sep 5;17(3):eRB4898. doi: 10.31744/einstein_journal/2019RB4898. PMID: 31508659; PMCID: PMC6718193.
  14. Shimomura Y, Inaguma A, Watanabe S, Yamamoto Y, Muramatsu Y, Bajotto G, Sato J, Shimomura N, Kobayashi H, Mawatari K. Branched-chain amino acid supplementation before squat exercise and delayed-onset muscle soreness. Int J Sport Nutr Exerc Metab. 2010 Jun;20(3):236-44. doi: 10.1123/ijsnem.20.3.236. PMID: 20601741.
  15. Siramolpiwat S, Limthanetkul N, Pornthisarn B, Vilaichone RK, Chonprasertsuk S, Bhanthumkomol P, Nunanan P, Issariyakulkarn N. Branched-chain amino acids supplementation improves liver frailty index in frail compensated cirrhotic patients: a randomized controlled trial. BMC Gastroenterol. 2023 May 15;23(1):154. doi: 10.1186/s12876-023-02789-1. PMID: 37189033; PMCID: PMC10184359.
  16. Stoppani J, Scheett T, Pena J, Rudolph C & Charlebois D. (2009). Consuming a supplement containing branched-chain amino acids during a resistance-training program increases lean mass, muscle strength and fat loss. Journal of the International Society of Sports Nutrition, 6, 1.
  17. Xiang Q, Xiong J, Zhao ZJ, Zhou T, Wu J, Chen X. Walking exercise through smartphone application plus branched-chain amino acid supplementation benefits skeletal muscle mass and strength in liver cirrhosis: A prospective control trial. Z Gastroenterol. 2023 May 23. English. doi: 10.1055/a-2075-0130. Epub ahead of print. PMID: 37220789.
  18. Koochakpoor G, Salari-Moghaddam A, Keshteli AH, Afshar H, Esmaillzadeh A, Adibi P. Dietary intake of branched-chain amino acids in relation to depression, anxiety and psychological distress. Nutr J. 2021 Jan 29;20(1):11.

 

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