Saiba qual o tipo mais grave e como a nutrição pode contribuir com os cuidados da doença
A talassemia é um tipo de hemoglobinopatias de causa genética, assim como a anemia falciforme. Ela também é conhecida como anemia do Mediterrâneo, pois foi nessa região que os primeiros casos foram identificados.
Segundo dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2014 e 2015, a talassemia menor e a suspeita de talassemia maior estão entre as principais hemoglobinopatias que atingem a população adulta brasileira, principalmente pessoas negras e pardas.
A doença não tem causa relacionada à dieta, carência de vitaminas ou minerais, mas é importante que o nutricionista conheça a condição para ajustar alguns nutrientes como explicaremos a seguir:
Como ocorre a talassemia?
Diferente das demais anemias, a talassemia é uma condição hereditária em que há um defeito genético na produção das globinas, proteínas que formam as hemoglobinas das hemácias.
Bom, é importante saber que cada hemácia possui milhões de moléculas de hemoglobina, sendo que cada hemoglobina normal é formada por dois tipos de globinas, alfa e beta, que são unidas por um átomo de ferro.
Os cromossomos têm as informações para produzir cada parte do corpo, no cromossomo 11 há a informação genética para produzir a globina beta e no cromossomo 16 para a globina alfa. Por se tratar de uma mutação genética, a talassemia é classificada de acordo com a cadeia polipeptídica afetada, sendo as mais frequentes as talassemias do tipo alfa e do tipo beta.
De modo geral, a talassemia causa produção inadequada de hemoglobina, o que pode levar a anemias. E como um dos tratamentos sugeridos inclui transfusão de hemácias, pode haver excesso de ferro no organismo, o que afeta outros órgãos como coração, fígado e glândulas endócrinas.
Tipos de talassemia
Talassemia alfa
É causada pela mutação no cromossomo 16 e pode se manifestar de quatro formas: portador silencioso, traço alfa talassemia, doença da hemoglobina H e hidropsia fetal.
1 gene defeituoso
Neste tipo de alteração, o indivíduo possui apenas um gene defeituoso, herdado de um dos pais
- Portador silencioso: apresenta hemograma normal, não é doente, não tem sintomas e não precisa de tratamento.
- Traço alfa talassemia: apresenta hemograma com algumas alterações leves, pode ter um pouco de palidez na pele e quando adulto sentir um pouco de cansaço.
2 genes defeituosos
Quando a pessoa herda dos pais os dois genes alterados
- Doença da hemoglobina H: nessa situação a hemoglobina tem uma função semelhante à da hemoglobina normal, mas é mais instável e seu tempo de vida é menor, por isso, as hemácias terão menor duração no organismo, resultando em anemia e necessidade de tratamento.
- Hidropsia Fetal: a mutação nos dois cromossomos 16 leva à completa incapacidade do organismo em produzir as cadeias alfa, tornando impossível a produção normal de hemoglobina. A doença é rara e leva à óbito ainda no período fetal.
Talassemia beta
Se desenvolve a partir de um defeito genético no cromossomo 11 e pode se manifestar de três formas: talassemia maior, talassemia intermediária ou talassemia menor.
- Talassemia menor ou traço talassêmico: os portadores apresentam apenas uma herança genética da talassemia, herdada do pai ou da mãe. Não são considerados doentes porque não apresentam manifestações clínicas da talassemia, apresentam anemia leve, podem ter um pouco de palidez na pele e alguns adultos podem sentir um pouco de cansaço, mas não há necessidade de tratamento.
É importante saber quando se tem este tipo de talassemia, porque o gene pode ser transmitido para os filhos.
- Talassemia maior: é o tipo mais grave da doença, pois as pessoas doentes apresentam uma anemia grave que, sem tratamento correto, pode levar a diversas complicações de saúde e até a morte. A produção de hemoglobina é falha, originando hemácias (glóbulos vermelhos) mais frágeis e de menor duração, com capacidade reduzida de levar oxigênio por todo o organismo.
Os sintomas são palidez e sonolência, fadiga e fraqueza, icterícia, o baço e o fígado sofrem aumento de tamanho e o portador da doença é dependente de transfusões de sangue frequentes desde os primeiros meses de vida.
- Talassemia intermediária: o portador pode apresentar uma anemia mais discreta ou mais grave. O tratamento com transfusões de sangue e quelantes de ferro será necessário para os casos mais graves, mas o acompanhamento médico é fundamental, mesmo que as transfusões não sejam indicadas, porque aqueles que nunca transfundem também acumulam ferro com o passar dos anos, devido ao aumento da absorção de ferro pelo intestino.
Diagnóstico
O diagnóstico precoce, feito pelo médico, é a melhor forma de evitar as complicações da talassemia. Inicialmente é feito um hemograma e em seguida, apresentando suspeita de talassemia, solicita-se a eletroforese de hemoglobina que permite separar as hemoglobinas normais
e as anormais, facilitando a descoberta da doença.
Depois, é feito o PCR (Reação em Cadeia da Polimerase) que pode identificar exatamente qual é a alteração genética da talassemia, avaliando com precisão o que causa a má formação da hemoglobina.
Tratamento
O tratamento da talassemia maior consiste em transfusões de sangue com concentração superior de hemácias. As transfusões devem ser feitas em média a cada 20 dias para controlar a anemia grave.
Essa frequência leva ao acúmulo de ferro, mas sem o tratamento com as transfusões, a pessoa não atinge nem a idade adulta. Fazendo a transfusão adequada e realizando tratamento medicamentoso para retirar o excesso de ferro com medicamentos quelantes, a pessoa pode levar uma vida normal.
Para a talassemia intermediárias as transfusões são indicadas apenas quando há queda nos níveis de hemoglobina e aumento do baço, crescimento anormal para a idade, início de sinais de deformidade óssea (crânio e face), falha no desenvolvimento sexual e durante a gestação. E, assim como a talassemia maior, exige o uso de quelantes para controlar o excesso de ferro.
Uma das soluções para o tratamento da talassemia está no transplante de células-tronco. Havendo 100% de compatibilidade, o que é raro mas possível entre irmãos, é possível ter a cura da doença.
Qual o papel da nutrição?
A dieta de uma pessoa com talassemia não tem restrições específicas, mas assim como nos pacientes saudáveis recomenda-se a prática de uma alimentação saudável que inclua frutas, legumes, verduras e controle alimentos ultraprocessados.
Há, no entanto, duas situações que exigem atenção: o excesso de ferro, nos casos em que há necessidade de transfusão, e alterações ósseas, já que a medula óssea tenta aumentar a sua produção de células do sangue, ficando maior do que o seu tamanho normal e comprometendo a forma dos ossos. Nesses cassos, é importante se atentar ao ferro e ao cálcio na dieta.
Vale ressaltar também que os quelantes de ferro podem apresentar efeitos colaterais com o uso crônico. São relatados casos de osteoporose, aumento da creatina (que afeta os rins), entre outras condições.
Por isso, recomenda-se:
- Inserir mais fontes de cálcio na dieta para assegurar a saúde óssea e controlar a absorção de ferro.
Fontes alimentares: leite e derivados, tofu, amêndoas, castanhas e vegetais verdes, como espinafre, couve e brócolis.
- Acompanhar status de vitamina D, pois ele ajuda na fixação do cálcio nos ossos.
Fontes alimentares: peixes, ovos, leite e derivados
Além dos alimentos, orientar a exposição solar antes das 10 horas e depois das 16 horas.
- Evitar alimentos ricos em ferro, para não aumentar ainda mais a quantidade desse nutriente no organismo.
Reduzir a quantidade: carnes vermelhas (principalmente fígado), feijão, frutos do mar e gema de ovo.
Orientar o paciente a, quando consumir esses alimentos, adicionar bebidas como chá preto ou leite à refeição, além de queijos e outras fontes de cálcio que interferem na absorção do ferro.
- Orientar hidratação adequada para manutenção da função renal em pacientes que usam quelantes de ferro.
Os quelantes de ferro também podem afetar o apetite do paciente, levando à ingestão inadequada de alimentos e nutrientes, por isso, é importante observar se as quantidades ingeridas estão de acordo com as recomendações para a nutrição de acordo com a idade e peso adequado.
Conheça outras condições de saúde para aprofundar seus conhecimentos e oferecer a melhor conduta dietética para o seu paciente:
- Doença de Parkinson: quais são os principais cuidados nutricionais?
- Doença Inflamatória Intestinal – Diretrizes ESPEN sobre o cuidado nutricional
- Artrite reumatoide: alimentação pode reduzir inflamação
Referências
ABRASTA. Manual ABRASTA – Talassemia: tudo o que você precisa saber.
Farrukh T. Shah, Farzana Sayani, Sara Trompeter, Emma Drasar, Antonio Piga, Challenges of blood transfusions in β-thalassemia, Blood Reviews, Volume 37, 2019, 100588, ISSN 268-960X, https://doi.org/10.1016/j.blre.2019.100588.
Ministério da Saúde. Talassemias. Política Nacional de Sangue e Hemoderivados.
Musallam, K.M., Vitrano, A., Meloni, A., Pollina, S.A., Karimi, M., El-Beshlawy, A., Hajipour, M., Di Marco, V., Ansari, S.H., Filosa, A., Ricchi, P., Ceci, A., Daar, S., Vlachaki, E., Singer, S.T., Naserullah, Z.A., Pepe, A., Scondotto, S., Dardanoni, G., Bonifazi, F., Sankaran, V.G., Vichinsky, E., Taher, A.T., Maggio, A. and (2022), Risk of mortality from anemia and iron overload in nontransfusion-dependent β-thalassemia. Am J Hematol, 97: E78-E80. https://doi.org/10.1002/ajh.26428
Rosenfeld, Luiz Gastão et al. Prevalência de hemoglobinopatias na população adulta brasileira: Pesquisa Nacional de Saúde 2014-2015. Revista Brasileira de Epidemiologia. v. 22, n. Suppl 02, E 190007. SUPL.2.
UFRJ. Anemias
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