Individualização é a chave! Em forma de perguntas e respostas, especialistas respondem dúvidas comuns sobre terapia nutricional personalizada em UTI.
Em pacientes graves, internados em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), a terapia nutricional personalizada é de extrema importância. Entretanto, muitas dúvidas ainda afligem os profissionais deste ramo.
Como forma de agregar para o conhecimento sobre terapia nutricional personalizada em UTI, um grupo de especialistas elaborou um manuscrito com as 10 questões mais frequentes sobre o assunto. Assim, sugestões práticas baseadas em recentes diretrizes foram elencadas. Confira a seguir!
1. Quando iniciar a terapia nutricional em UTI?
Nas UTIs, o mais recomendado é adotar a nutrição enteral precoce, com início de 24 a 48 horas após a admissão.
Esta prática traz diversos benefícios para o paciente, tal como a atenuação das alterações na barreira intestinal, típicas neste público. Ademais, a NE precoce diminui as complicações, a morbidade infecciosa, e o tempo de internação.
Por outro lado, os profissionais sugerem que o atraso no avanço da NE deve ser dar nos seguintes casos:
- Sangramento gastrointestinal;
- isquemia mesentérica;
- Intolerância gastrointestinal;
- Risco de aspiração;
- Obstrução intestinal;
- Síndrome do compartimento abdominal;
- Risco de síndrome de realimentação;
- Fosfato < 0,65 mmol/L;
- Instabilidade hemodinâmica não ressuscitada em vasopressores.
2. Qual deve ser a oferta calórica para pacientes graves?
A calorimetria indireta (CI) é a via preferencial para determinar a oferta energética em UTI. Apesar de necessitar de uma equipe treinada, cooperação e estabilidade do paciente, a CI apresenta diversas vantagens: é precisa, simples, rápida, e permite identificar sub ou superalimentação.
As diretrizes nutricionais indicam a oferta de < 70% do gasto energético de repouso (GER) medido por CI (equivalente a 10 a 15 kcal/kg).
3. Qual deve ser a oferta protéica para pacientes graves?
Os especialistas recomendam a entrega de proteína em baixa dose, de < 0,8 g/kg/d, progredindo para ≥ 1,2 g/kg/d à medida que os pacientes se estabilizam.
A preferência é que esta dose seja baseada na massa magra, usando a bioimpedância como ferramenta. Outras alternativas incluem a tomografia computadorizada, a ultrassonografia muscular, ou a equação de Gallagher.
4. A nutrição parenteral pode ser uma alternativa em UTI?
Sim. Quando a nutrição enteral for inviável, o fornecimento de nutrição parenteral a curto prazo é seguro, eficaz, e gera resultados semelhantes à NE.
Ao contrário do que se pensava, a NP não está mais associada ao risco de infecção na UTI. Na realidade, ela se associa à redução das complicações infecciosas, do tempo de ventilação mecânica, dos eventos de isquemia intestinal e da mortalidade.
5. Entrega contínua ou intermitente?
Para os autores, intervalos alternados entre alimentação e jejum são preferíveis na UTI, quando comparados à entrega contínua da nutrição.
Os prováveis mecanismos protetores da alimentação intermitente incluem a recuperação celular via autofagia e cetogênese. Além disso, podem atenuar os distúrbios no ritmo circadiano, geradores de doenças.
6. Como monitorar a terapia nutricional na UTI?
Muitas pesquisas mostram uma lacuna entre a prescrição e a entrega da nutrição na UTI. Por isso, os especialistas reiteram a importância de monitorar o fornecimento da NE por meio de sistemas de informações computadorizados, que permitam a visualização da quantidade de nutrientes sendo fornecida.
7. Como monitorar a deficiência de micronutrientes?
A deficiência de micronutrientes (MNs) é bastante frequente em pacientes graves, mas raramente diagnosticada. Para mudar esse cenário, os MNs devem ser testados após 6 a 7 dias na UTI, especialmente em pacientes com depleção ativa, grandes drenos e queimaduras.
Os principais micronutrientes em risco na UTI são cobre, selênio, zinco e ferro. Após testados, vitaminas e minerais 20% abaixo do valor de referência devem ser repostos. Posteriormente, devem ser novamente rastreados entre 7 a 10 dias.
8. Como monitorar o catabolismo e a massa muscular?
A perda muscular aguda como sinal de catabolismo e a fraqueza muscular são sintomas onipresentes na UTI. Para evitar a incapacidade funcional, monitorar tais parâmetros é essencial.
Para isso, a ultrassonografia muscular pode ser adotada, tendo como principais vantagens e a capacidade de detectar necrose/fasceíte, e associação com a função física. A tomografia computadorizada e a composição corporal por bioimpedância também são ferramentas válidas.
9. Quais nutrientes anabólicos usar na UTI?
Os autores defendem que a oferta de nutrientes anabólicos na UTI, estimulantes da síntese proteica muscular, sejam mais estudados no futuro. São eles: leucina, β-hidroxi-β-metilbutirato (HMB) e creatina.
A leucina atua como um substrato para a síntese proteica, e pode melhorar a massa muscular em idosos com sarcopenia. Já a creatina aumenta a produção de ATP dentro das células musculares, essencial para a produção de proteínas. Particularmente, ela pode fornecer mais benefícios para aqueles com níveis mais baixos de creatina.
10. Como recuperar a função física pós-UTI?
De modo a recuperar a função física após a internação em UTI, a administração de uma nutrição estruturada é o ideal. Ademais, na opinião dos especialistas, programas de reabilitação com exercícios cardiopulmonares personalizados podem ser a chave.
Por fim, muitos pacientes apresentam hipotestosteronemia na UTI. Em combinação com os exercícios físicos, a terapia com testosterona ou seus análogos pode trazer benefícios, especialmente para as queimaduras graves.
Clique aqui para ler o manuscrito completo.
Referência:
Wischmeyer, P.E., Bear, D.E., Berger, M.M. et al. Personalized nutrition therapy in critical care: 10 expert recommendations. Crit Care 27, 261 (2023).
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