A vitamina D é um micronutriente muito importante para a saúde, com amplos papéis no…
Nova pesquisa com brasileiras mostra inadequações nutricionais no consumo de diversos micronutrientes.
Nos dias atuais, o Brasil é um país que enfrenta uma dupla carga de má nutrição. Enquanto os níveis de obesidade e doenças crônicas relacionadas à dieta não param de crescer, a desnutrição segue firme como um dos principais problemas nutricionais do cenário nacional.
Em particular, a deficiência de micronutrientes na dieta brasileira têm chamado atenção na literatura científica. Recentemente, um estudo com mais de 1.800 brasileiros descobriu inadequações no consumo de diversas vitaminas e minerais. Confira os detalhes a seguir.
Detalhes da pesquisa
A investigação em questão tratou-se de um estudo descritivo, transversal, que utilizou dados do o Estudo Brasileiro de Nutrição e Saúde (EBANS), uma pesquisa de base populacional com uma amostra representativa de indivíduos com idades entre 15 e 65 anos, residentes na área urbana das cinco macrorregiões do Brasil.
O objetivo principal dos pesquisadores era investigar a ingestão de nutrientes e as inadequações de micronutrientes na população adulta brasileira, com foco em diferentes subgrupos etários.
Para isso, os autores reuniram dados sobre o consumo alimentar de 1.812 adultos brasileiros (54,3% mulheres), entre 19 a 65 anos.
A ingestão alimentar foi avaliada por dois recordatórios alimentares de 24 horas, e as probabilidades de ingestão inadequada foram estimadas com base nas referências da DRI’S (Dietary Reference Intake), propostas pelo Institute of Medicine (IOM), considerando a necessidade média estimada (EAR) de cada sexo e faixa etária, majoritariamente.
O perfil socioeconômico da amostra revelou:
- Maioria dos participantes com renda média ou baixa e ensino médio; e alta frequência de pessoas com ensino fundamental, especialmente entre 51 a 65 anos;
- Alta prevalência de excesso de peso, em 48% dos jovens (19 a 30 anos) e 74,5% dos mais velhos (51 a 65 anos);
- Apenas 41,3% de participantes fisicamente ativos, principalmente em mulheres mais velhas; homens mais ativos que mulheres (46,7% vs. 36,8%);
- 5% da amostra sob uso de suplementos nutricionais, com mulheres representando quase o dobro dos homens.
Quais micronutrientes foram insuficientes na dieta brasileira?
Após extensa análise de dados, os resultados da pesquisa mostraram uma alta probabilidade de inadequação em diversos micronutrientes. Confira abaixo.
Vitamina D
Houve uma alta probabilidade de insuficiência de vitamina D na dieta dos brasileiros, ultrapassando 90% de inadequação em homens e mulheres de todas as faixas etárias.
A vitamina D é uma vitamina lipossolúvel, presente em alimentos como ovo, peixe, cogumelos, algas e alimentos modificados. Entretanto, 80% a 90% da vitamina D corpórea é adquirida pela síntese cutânea, através da exposição solar.
No organismo humano, a vitamina D exerce diversas funções, como a homeostase de cálcio e fósforo, promoção da saúde óssea, proliferação e diferenciação celular, modulação do sistema imunológico, entre outras.
Segundo os autores, a alta inadequação de vitamina D pode ser explicada pelos valores de referência voltados para a população dos Estados Unidos (600 UI/dia), que obtêm pouca ou nenhuma exposição solar. Assim, este cenário pode não ser aplicável em países com clima tropical, como o Brasil, e há a possibilidade desta inadequação estar superestimada.
Entretanto, em recente diretriz da Federação Latino-Americana de Endocrinologia (FELAEN), especialistas reconheceram que há desafios para atingir os níveis desejados de vitamina D mesmo na América Latina, podendo ser considerado um problema de saúde pública.
Portanto, a suplementação preventiva de vitamina D pode ser necessária para evitar sua deficiência, sendo a exposição solar um método complementar. Especialistas europeus recomendam a dose mínima de 800 UI/dia, podendo chegar a até 4.000 UI/dia para determinadas populações.
Vitamina E
Não muito atrás da vitamina D, a vitamina E também figurou entre os micronutrientes com maior probabilidade de inadequação, também ultrapassando 90% para ambos os sexos e todas as faixas etárias, mas principalmente entre as mulheres.
A vitamina E (ou “tocoferol”) é uma vitamina lipossolúvel que funciona como um antioxidante, protegendo a membrana celular. Além disso, também possui efeitos antiplaquetários e está envolvida na função imunológica.
Essa vitamina encontra-se em abundância nos óleos vegetais, azeite de oliva, nozes, soja, abacate, trigo e vegetais de folhas verdes. Para adultos, recomenda-se um consumo diário de 15 mg/dia, tanto para homens quanto mulheres.
Em países em desenvolvimento, como o Brasil, a ingestão inadequada de vitamina E figura entre as principais causas de deficiência da vitamina E. Sendo assim, a promoção do consumo de alimentos que contenham esse nutriente é fundamental para superar este problema.
Vitamina A
Na pesquisa, a inadequação de vitamina A esteve presente em cerca de metade das dietas analisadas, ultrapassando o nível de 53% de inadequação entre os homens e 46% entre as mulheres. Portanto, homens de todas as faixas etárias corriam maior risco de inadequação no consumo de vitamina A.
A vitamina A abrange o grupo de retinoides lipossolúveis, principalmente retinol e ésteres de retinil. Suas funções são diversas, incluindo defesa imunológica, comunicação celular, reprodução sexual, além de seu papel bem conhecido no apoio da visão.
De modo geral, a dieta humana contém suas fontes de vitamina A: a vitamina A pré-formada (retinol e ésteres de retinil), encontrados em laticínios, ovos, peixes e vísceras; e os carotenoides de provitamina A, presentes em vegetais e frutas como espinafre, cenoura, batata-doce, manga e mamão.
Para adultos, a recomendação diária de vitamina A é de 900 mcg RAE para homens, e 700 mcg RAE para mulheres. Quando tais níveis não são atingidos, a deficiência de vitamina A pode causar diversos sintomas, sendo a xeroftalmia o sinal clínico mais comum.
Assim como para a vitamina E, a deficiência de vitamina A pode ser corrigida com uma alimentação saudável, rica em seus alimentos fontes.
Colina
Outro micronutriente insuficiente nas dietas brasileiras analisadas foi a colina. Sua probabilidade de adequação foi extremamente baixa, com apenas 10% dos homens mais jovens atingindo a ingestão adequada. Em adultos mais velhos (31 a 65 anos), o cenário foi ainda mais preocupante, com cerca de 6% de adequação em ambos os sexos.
A colina constitui uma das vitaminas do complexo B necessária para diversas funções do organismo, incluindo integridade estrutural das células, modulação da expressão gênica, e produção de um neurotransmissor importante para a memória, humor, controle muscular e outras funções do sistema nervoso.
Embora o fígado produza colina endogenamente, a quantidade sintetizada não é suficiente para atingir as necessidades humanas.
Por isso, obter colina a partir da dieta é importante. Suas fontes dietéticas mais comuns são os produtos de origem animal (carne, aves, peixes, laticínios e ovos), mas ela também está presente em vegetais crucíferos, feijões, nozes, sementes e grãos integrais.
Para adultos, a ingestão adequada é de 425 mg/dia para mulheres, e 550 mg/dia para homens. Quando essas necessidades não são atingidas, a deficiência de colina pode causar danos musculares, danos hepáticos e doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA),
Sendo assim, é essencial obter colina da alimentação ou suplementação, como suplementos de complexo B ou multivitamínicos.
Outros
Além da vitamina D, vitamina E, vitamina A e colina, outros micronutrientes com ingestão inadequada, segundo a pesquisa, incluíram:
- Cálcio: probabilidade de inadequação acima de 85%, independente da faixa etária, mas aumentando com a idade. Segundo os autores, fontes dietéticas (leite, iogurte, queijo, peixe e frutos do mar) são pouco consumidas pela população brasileira.
- Magnésio: probabilidade de inadequação acima de 85%, independente da faixa etária, mas aumentando com a idade.
- Outras vitaminas do complexo B: além da colina, tiamina, riboflavina, piridoxina e vitamina B12 também apresentaram inadequações leves a moderadas, variando de 5 a 48%.
- Ferro: foi o micronutriente com menor probabilidade de inadequação. Porém, a inadequação foi maior nas mulheres, variando de 9 a 23%. Os autores sugerem que a restrição dietética de alimentos com farinha de trigo enriquecida com ferro por parte da população feminina, devido à associação com o ganho de peso, pode ser uma das causas.
O que podemos concluir?
Como visto, diversos micronutrientes parecem estar carentes da dieta da população adulta brasileira, especialmente entre mulheres e idosos.
Embora muitas inadequações nutricionais possam ser corrigidas com uma alimentação saudável e balanceada, há cenários em que a suplementação torna-se uma estratégia necessária, como a baixa aceitação alimentar entre idosos ou a prevalência de múltiplas deficiências nutricionais.
A suplementação multivitamínica, por exemplo, pode ser uma aliada crucial para garantir o aporte necessário de nutrientes e prevenir complicações relacionadas à carência desses elementos.
Ademais, estes achados reforçam a necessidade de políticas públicas que promovam a melhoria do estado nutricional da população, com foco na prevenção de inadequações desde a fase adulta, antes do surgimento de doenças na terceira idade.
Para ler o artigo científico completo, clique aqui.
Se você gostou deste conteúdo, leia também:
- Diretrizes de micronutrientes da ESPEN
- Quais são as principais deficiências de micronutrientes em idosos?
- Quais são os suplementos usados para reduzir colesterol?
Referências
Fisberg M, Duarte Batista L, Previdelli AN, Ferrari G, Fisberg RM. Exploring Diet and Nutrient Insufficiencies across Age Groups: Insights from a Population-Based Study of Brazilian Adults. Nutrients. 2024; 16(5):750. https://doi.org/10.3390/nu16050750
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A Redação Nutritotal PRO é formada por nutricionistas, médicos e estudantes de nutrição que têm a preocupação de produzir conteúdos atuais, baseados em evidência científicas, sempre com o objetivo de facilitar a prática clínica de profissionais da área da saúde.
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