O que é e como identificar a síndrome de realimentação?

Postado em 24 de agosto de 2022 | Autor: Redação Nutritotal

A depleção sérica de fósforo, potássio e magnésio estão entre as características desta síndrome.

A Síndrome de Realimentação (SR) foi descrita pela primeira vez durante a Segunda Guerra Mundial. Neste período, notou-se que indivíduos que passaram fome por 5 a 6 meses, ao serem reintroduzidos à alimentação, experimentaram uma inesperada morbidade e mortalidade.

Ao longo do tempo, muitas definições foram criadas para explicar esse fenômeno. A falta de concordância entre as definições, porém, pode dificultar o diagnóstico e interferir no tratamento. Neste artigo, você irá entender, afinal, o que é a Síndrome de Realimentação e como identificá-la, dentre outros tópicos relacionados.

Síndrome de Realimentação

Foto: Shutterstock.com

O que é a Síndrome de Realimentação (SR)?

A Síndrome de Realimentação é descrita como uma série de alterações metabólicas e eletrolíticas que ocorrem como resultado da reintrodução e/ou do aumento da oferta calórica após um período de ingestão energética diminuída ou ausente. Nesse contexto, as calorias podem ser advindas de qualquer fonte (oral, enteral, parenteral).

A definição atualizada da American Society for Parenteral and Enteral Nutrition (ASPEN) define a síndrome de modo ainda mais específico. Segundo a Sociedade, a SR é a “redução mensurável nos níveis de um ou qualquer combinação de fósforo, potássio e/ou magnésio, ou a manifestação de deficiência de tiamina, desenvolvendo-se logo (horas a dias) após o início do fornecimento de calorias a um indivíduo que foi exposto a um período substancial de desnutrição”.

Quais são os sintomas da Síndrome de Realimentação?

Sugere-se que a mudança do estado catabólico para o anabólico seja a principal causa das manifestações clínicas da Síndrome de Realimentação, embora os mecanismos fisiopatológicos ainda não sejam totalmente compreendidos.

Os sintomas geralmente aparecem dentro de 2 a 5 dias após a realimentação e podem variar de ausente/leve até uma síndrome clínica grave e com risco de vida, dependendo do grau preexistente de desnutrição e comorbidades. Desse modo, todos os órgãos do corpo podem estar envolvidos, levando a manifestações cardíacas, respiratórias, hematológicas, gastrointestinais, neurológicas e musculoesqueléticas, que se não foram antecipadas ou corrigidas, podem levar à morte.

Na tabela a seguir, estão explicitados os principais sintomas da Síndrome de Realimentação, associados ao mecanismo fisiológico envolvido.

Mecanismo fisiológicoPor que acontece?Sintomas envolvidos
HipofosfatemiaAumento do consumo de fosfato devido à produção aumentada de intermediários fosforilados para realizar glicólise.
  • Funções cardíacas e respiratórias prejudicadas (taquicardia e taquipneia)
  • Sintomas neurológicos (confusão, sonolência, letargia, coma, parestesia, convulsões)
  • Distúrbios hematológicos (hemólise, disfunção de plaquetas e leucócitos, trombocitopenia)
  • Hipóxia
  • Distúrbios musculares (fraqueza, rabdomiólise, diminuição da contratilidade cardíaca, mialgia)
HipocalemiaDeslocamento intracelular de potássio por estimulação de insulina; comprometimento da recaptação de potássio no néfron.
  • Arritmia cardíaca
  • Sintomas neurológicos (fraqueza, hiporreflexia, depressão respiratória e paralisia)
HipomagnesemiaO mecanismo não está totalmente claro, mas acredita-se que ocorra devido ao deslocamento intracelular do magnésio após a alimentação com carboidratos.
  • Aumento das perdas renais de potássio
  • Arritmias cardíacas (torsade de pointes, fibrilação atrial, arritmias ventriculares)
  • Alterações eletrocardiográficas (QT e PR prolongados, QRS alargado)
  • Desconforto abdominal (diarreia, náusea, vômito)
  • Sintomas neuromusculares (tremor, parestesia, tetania, convulsões, irritabilidade, confusão, fraqueza, ataxia)
Deficiência de tiaminaAumento do consumo de tiamina pelas enzimas do metabolismo da glicose.
  • Distúrbios neurológicos ou Beribéri seco, Encefalopatia de Wernicke e Síndrome de Korsakoff
  • Distúrbios cardiovasculares ou Beribéri úmido
  • Acidose metabólica
Retenção de sódio e líquidosRetenção renal de sódio e líquidos devido às propriedades anti-natriuréticas da insulina (após alimentação com carboidratos).
 HiperglicemiaAumento da resistência dos tecidos à glicose endógena
  • Acidose metabólica
  • Hipercapnia, insuficiência respiratória e risco de fígado gorduroso devido à lipogênese

Quem está em risco para a Síndrome de Realimentação?

Segundo especialistas da Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral (BRASPEN), o risco para Síndrome de Realimentação pode se dar de acordo com critérios como IMC, perda de peso não intencional, entre outros. A tabela abaixo mostra a classificação de risco para SR por meio destes fatores.

Risco baixoRisco altoRisco muito alto
IMC< 18.5 kg/m²<  16 kg/m²<  14 kg/m²
Perda de peso não intencional> 10% em 3 a 6 meses> 15% em 3 a 6 meses> 20%
Ingestão alimentarBaixa ou nenhuma ingestão alimentar por mais de 5 diasBaixa ou nenhuma ingestão alimentar por mais de 10 dias
OutrosHistórico de abuso de álcool e drogas presenteBaixos valores de fósforo, potássio e magnésio

Em determinadas condições, a literatura mostrou que o risco de ocorrência de Síndrome de Realimentação se eleva. Deste modo, a reabilitação nutricional deve ser muito bem conduzida para que se evite a SR. As principais doenças e condições associadas à Síndrome de Realimentação são:

Afinal, como diagnosticar a Síndrome de Realimentação?

Segundo a ASPEN, o diagnóstico da Síndrome de Realimentação é dado após a identificação de dois fatores:

1. Diminuição sérica de um ou mais dos seguintes minerais: fósforo, potássio e magnésio.

a. Síndrome de Realimentação Leve: diminuição de 10 a 20%.
b. Síndrome de Realimentação Moderada: diminuição de 20 a 30%.
c. Síndrome de Realimentação Grave: diminuição > 30%, e/ou disfunção de órgão(s) devido à diminuição destes minerais e/ou devido deficiência de tiamina.

2. Essa diminuição ocorreu dentro de 5 dias após reiniciar ou aumentar substancialmente o fornecimento de energia.

Se ambos os critérios forem reconhecidos, o paciente é diagnosticado com SR, devendo passar por um tratamento nutricional precoce para evitar complicações futuras. Esse tratamento deve ser constituído de um menor aporte calórico, com aumento gradual da terapia nutricional, sob estrita monitorização de eletrólitos e suplementação de tiamina e polivitamínico.

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Referências:

DA SILVA, Joshua SV et al. ASPEN consensus recommendations for refeeding syndrome. Nutrition in Clinical Practice, v. 35, n. 2, p. 178-195, 2020.

PONZO, Valentina et al. The Refeeding Syndrome: a neglected but potentially serious condition for inpatients. A narrative review. Internal and emergency medicine, v. 16, n. 1, p. 49-60, 2021.

SAD, Matheus Horta et al. Manejo nutricional em pacientes com risco de síndrome de realimentação. BRASPEN Journal, 2019.

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