Série micronutrientes: quais são as funções do selênio?

Postado em 7 de setembro de 2022 | Autor: Redação Nutritotal

Conheça a importância do selênio para o funcionamento do organismo humano.

O selênio (Se) é um micronutriente essencial para a saúde humana. Descrito pela primeira vez em 1818 pelo químico sueco Jons Jacob Berzelius, o mineral tomou notoriedade a partir de 1979, quando foi descoberta uma enfermidade decorrente da sua deficiência (a doença de Keshan). Neste artigo, você irá entender quais as funções do selênio, suas recomendações nutricionais, fontes alimentares, e muito mais.

Selênio: Quais são as funções

Foto: Shutterstock.com

Os “tipos” de selênio 

Em primeiro lugar, precisamos entender as formas de apresentação do selênio. Através da alimentação ou suplementação, o mineral pode ser encontrado nas suas formas orgânicas ou inorgânicas.

As formas orgânicas do selênio são aquelas provenientes da alimentação. Podem ser:

  • Selenometionina: advindas de vegetais e cereais. Apresenta uma alta taxa de absorção, pois pode ser incorporado no lugar da metionina em tecidos como músculo, eritrócitos e albumina plasmática.
  • Selenocisteína: oriunda de carnes bovina, de ave e de peixe. Essa forma está presente nas selenoproteínas, responsáveis por exercer as principais funções biológicas relacionadas a este micronutriente.
  • Seleniometilselenocisteína: forma presente em vegetais cultivados em solos enriquecidos com selênio, com participação no pool para a síntese de selenoproteínas.

Já as formas inorgânicas são aqueles provenientes de suplementos, apresentadas sob duas formas:

  • Selenito: tende a ser preferida na suplementação direta aos animais. Sua absorção não ultrapassa 60%, mas pode aumentar na presença de glutationa reduzida (GSH).
  • Selenato: é a opção usual para ser adicionada aos fertilizantes. É absorvida de forma eficiente (90%)  por um processo de difusão passiva.

O metabolismo do selênio

A absorção do selênio ocorre principalmente na parte inferior do intestino delgado por meio de diferentes rotas e mecanismos, com uma eficiência de aproximadamente 70 a 90% em condições fisiológicas normais.

Os diferentes tipos deste mineral são reduzidos a seleneto de hidrogênio (H2Se). Após sua metabolização (que acontece principalmente no fígado), os compostos orgânicos podem seguir por dois caminhos distintos:

  1. Seguem para a circulação, onde são acumulados em diferentes locais do corpo (fígado, rins, pâncreas, músculos esqueléticos, músculo cardíaco e sangue), ligado principalmente à glutationa peroxidase;
  2. Ou são removidos no próprio fígado pela transulfuração do selênio, sendo que o “novo” selênio será utilizado para a síntese de selenoproteínas.

Por fim, a excreção de selênio ocorre na forma de produtos metilados, principalmente pela urina e fezes, de acordo com a ingestão do mineral. O selênio também pode ser eliminado do organismo por meio da perda de cabelos e células da pele.

Quais as funções deste mineral?

Os papéis do selênio estão diretamente relacionados às funções das selenoproteínas e de produtos do metabolismo do mineral. Suas principais funções são:

Metabolismo de tireoide

As iodotironina desiodinases (DIO) são uma família de selenoproteínas que ajudam a converter o hormônio da tireóide (T4) em sua forma ativa (T3). Deste modo, juntamente com o iodo, a ingestão adequada de selênio é de grande importância para prevenir as disfunções desta glândula.

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Função Antioxidante

A função antioxidante do selênio se dá principalmente através das selenoproteínas Glutationa Peroxidase (GPx), encontradas em todos os tecidos onde ocorrem processos oxidativos. Basicamente, essas enzimas atuam neutralizando a ação de espécies reativas de oxigênio (EROs) utilizando uma molécula de glutationa reduzida (GSH) como co­fator. Esse processo auxilia os seguintes mecanismos:

  • Proteção do estresse oxidativo no epitélio intestinal;
  • Manutenção da homeostase da mucosa;
  • Neutralização da ação oxidativa de ácidos graxos nas membranas celulares;
  • Redução de hidroperóxidos de colesterol e ésteres de colesterol nas membranas celulares e LDL-colesterol;
  • Bloqueio da peroxidação lipídica no metabolismo dos eicosanóides;
  • Entre outros.

Sistema imunológico

Diversas evidências mostram o papel do selênio na proteção do sistema imune, tal como na modulação da resposta inflamatória. A suplementação com selenito de sódio, por exemplo, foi capaz de reduzir a expressão gênica de TNF­α e da enzima COX­2 por meio da modulação das vias da MAP quinase e do NF­κB.

A função antioxidante descrita anteriormente também atua no sistema imunológico. Algumas selenoproteínas (como GPx e TXNRD1) são responsáveis por regular a produção de EROs e do estado redox em células imunes. Deste modo, tanto a deficiência quanto a superexpressão dessas substâncias desregulam as funções dessas células, podendo provocar a morte celular ou prejudicar o mecanismo oxidativo necessário às funções fagocíticas.

Em macrófagos periféricos, a selenoproteína S (SELENOS) pode ter papel anti apoptótico e atuar na redução do estresse do retículo endoplasmático.

Por fim, o selênio também se associa à plasticidade de macrófagos durante a resposta imune ocasionada por infecções parasitárias, tuberculose e infecção pelo vírus HIV.

Função neurológica

No cérebro, selenoproteínas como SELENOP e GPx são expressas em neurônios e/ou na glia.  Nestes locais, estas substâncias também são importantes na proteção contra o estresse oxidativo, uma vez que os danos causados por EROs são observados em diversas doenças neurodegenerativas (Alzheimer, Parkinson, Esclerose Múltipla…).

Já foi demonstrado, por exemplo, que a expressão de SELENOP cerebral aumenta com a idade, indicando a necessidade de proteção contra o estresse oxidativo nos neurônios.

Fertilidade masculina

O selênio exerce um papel importante na fertilidade masculina por ser necessário para biossíntese de testosterona e para o desenvolvimento dos espermatozoides.

Ademais, o estresse oxidativo nas células testiculares pode afetar a integridade e a motilidade do espermatozoide. Para combater essa situação, grande parte do selênio encontrado nos testículos é incorporado na selenoproteína GPx4, que exerce seu papel antioxidante e impede a infertilidade masculina.

Além disso, a GPx4 também exerce um papel estrutural para os espermatozoides maduros. Desse modo, a deficiência de selênio pode prejudicar não só a motilidade do esperma, mas também resultar em alterações morfológicas.

Recomendações nutricionais

A recomendação para Ingestão Dietética Diária (RDA) de selênio varia com a idade e a fase da vida. Na tabela abaixo, você encontra estes valores.

Estágio da vidaIdadeIngestão de selênio diária (ug)
Crianças0 a 6 meses15 (AI)
6 a 12 meses20 (AI)
1 a 3 anos20
4 a 8 anos30
9 a 13 anos40
Adolescentes14 a 18 anos55
Adultos19+55
GrávidasTodas as idades60
NutrizesTodas as idades70

Fonte: DRIS, 2000

Fontes alimentares de selênio

A obtenção de selênio através da alimentação irá depender do solo em que o alimento foi cultivado. Áreas mais próximas de oceanos, por exemplo, possuem solos com concentração naturalmente maior deste mineral.

As fontes alimentares de selênio podem ser advindas de produtos de origem animal ou vegetal. Enquanto os produtos de origem animal possuem a forma de selenocisteína, os produtos de origem vegetal são ricos em selenometionina.

Algumas fontes alimentares de selênio são:

  1. Castanha-do-Pará;
  2. Peixes;
  3. Ovo;
  4. Farinha de trigo integral;
  5. Carne bovina.

Na tabela abaixo, você encontra a quantidade de selênio a cada 100 g de alimento.

Alimento Selênio (μg)
Castanha-do-Pará3382
Fígado de frango cozido57,2
Atum em conserva52,5
Sardinha em conserva46
Gema de ovo cozida34
Salmão grelhado s/ pele28,5
Cogumelo shitake24,8
Leite em pó16,2
Ovo cozido15
Farinha de trigo integral13,6
Contrafilé grelhado13,3
Queijo minas frescal9,9
Pão francês7,3
Farinha de trigo refinada6
Leite integral4,81

Fonte: Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (TBCA) 

Deficiência de selênio

A deficiência em selênio ocorre quando a ingestão diária desse mineral é menor ou igual a 11 µg/dia. Apesar de não ser comum, as principais causas da deficiência são:

Em casos graves, a deficiência de selênio pode causar enfermidades. Uma delas é a Doença de Keshan,  uma cardiomiopatia que acomete, principalmente, mulheres na idade fértil e crianças entre 2 e 10 anos. É caracterizada pelo aumento cardíaco, eletrocardiograma anormal, insuficiência cardíaca congestiva e necrose multifocal do miocárdio.

Outro problema advindo da deficiência grave é a Doença de Kaschin-Beck. Trata-se de uma osteoartrite caracterizada por atrofia, degeneração e necrose do tecido cartilaginoso, que pode resultar em deformação das articulações e nanismo. Esta doença acomete principalmente crianças entre 5 e 13 anos.

Para prevenir a deficiência, alguns estudos nacionais utilizam pontos de corte adotados para a população americana, sendo que os valores normais de selênio são:

  • Selênio plasmático: 60 a 120 µg/L;
  • Selênio eritrocitário: 90 a 190 µg/L.

Toxicidade

Assim como a deficiência, a toxicidade por selênio é rara. Contudo, ela pode ocorrer com intoxicação no ambiente de trabalho, inalação de aerossóis e consumo oral de selênio inorgânico.

Os sintomas incluem:

  • Hipotensão;
  • Estresse respiratório;
  • Disfunção gastrointestinal e neurológica;
  • Síndrome respiratória aguda;
  • Infarto do miocárdio;
  • Falência renal.

Além disso, algumas evidências recentes têm observado que o excesso de selênio no sangue está associado ao aumento do risco para diabetes tipo 2, síndrome metabólica, alterações no perfil lipídico, aumento de biomarcadores inflamatórios e aumento da mortalidade.

Por isso, existe um valor máximo de ingestão de selênio para prevenir os seus efeitos adversos, definido pelo Limite Superior Tolerável de Ingestão (UL):

Estágio da vidaIdadeDose diária máxima  de selênio (ug)
Crianças0 a 6 meses45
6 a 12 meses60
1 a 3 anos90
4 a 8 anos150
9 a 13 anos280
Adolescentes14 a 18 anos400
Adultos19+400

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Referências

CARDOSO, Marly Augusto; SCAGLIUSI, Fernanda Baeza. Nutrição e Dietética. 2ª edição, Guanabara Koogan, 2019.

COZZOLINO, Silvia M. Franciscato. Biodisponibilidade de nutrientes. 6ª edição, Editora Manole, 2020.

Selenium. Harvard T.H. Chan School of Public Health.

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